Crítica

May é uma jovem como muitas outras. Bela, independente, saiu da casa da família para ir atrás de seus sonhos profissionais e, neste caminho, acabou encontrando o homem dos seus sonhos. Ou ao menos isso é o que ela acredita. Muitas das suas decisões podem ser pessoais, livres de qualquer tipo de influência ou trauma. Mas o contrário também pode ser possível, e a herança familiar pode pesar mais do que imagina. Tanto que, quando retorna à casa da mãe para reencontrar os parentes e preparar o casamento iminente, muitas dúvidas começarão a surgir – e nos mais amplos e diversos aspectos de sua vida. É mais ou menos por aí que se desenvolve a trama de O Casamento de May, um filme que se vende como exótico e original, mas em resumo é apenas mais do mesmo.

Pra começar, o filme se passa em Amã, capital da Jordânia. Os cenários, pouco vistos no cinema ocidental, remete o espectador imediatamente a horizontes perdidos e desconhecidos, prontos para serem desbravados. A fotografia, no entanto, prefere se manter em ambientes controlados, dentro de casas e outros lugares fechados, trabalhando em estúdio – a questão geográfica, em última instância, acaba sendo somente um detalhe. Depois nós temos a diretora, roteirista e protagonista Cherien Dabis, uma jovem e atraente mulher de tez morena e olhos amendoados. Passaria muito bem como natural do Oriente Médio, ainda que tenha nascido em Nebraska, EUA. Assim como quase todo o elenco principal também é norte-americano – seu pai, por exemplo, é interpretado por Bill Pullman, mais conhecido como o presidente dos Estados Unidos em Independence Day (1996).

Mas estas seriam apenas curiosidades caso o argumento da trama fosse realmente interessante – o que, infelizmente, não acontece. O Casamento de May nada mais é do que uma comédia romântica das mais convencionais, seguindo todos os passos de uma cartilha já gasta e desacreditada. May (Dabis), ao retornar para o lar de sua infância, o encontra desfeito: a mãe (a competente Hiam Abbas, subaproveitada e a única realmente nativa da região, apesar de já ter filmado até com Spielberg) foi abandonada pelo pai (Pullman), que a trocou por uma mulher muito mais jovem. Soma-se a isso o fato do noivo ser muçulmano, o que gera mais controvérsia – a mãe, por exemplo, se recusa a ir na cerimônia abençoá-los. May, portanto, tem todos os elementos para questionar sua futura decisão de se unir a um homem que, até então, lhe parecia perfeito: os dois moram em Nova York, dividem suas vidas, interesses e profissões. A indecisão é improvisada no último instante, como se fosse somente um recurso para que, enfim, essa história de alguma forma existisse.

Religião, companheirismo, novos amores, homossexualidade, indecisão profissional, temores da meia idade: tudo vira tema de debate nesta salada proporcionada pela novata Cherien Dabis, uma artista que há tempos vem tentando se inserir no mainstream hollywoodiano e, diante do seu insucesso, decidiu parar de esperar e fez por si mesma este filme que nada mais é do que um veículo para um eventual estrelato pessoal. Lançado no Festival de Sundance – o que, como muitos sabem, é a porta de entrada preferencial dos cineastas independentes norte-americanos – O Casamento de May pode iludir facilmente uma audiência desatenta e em busca apenas de entretenimento passageiro. Mas não se engane: os nomes podem não ser tão conhecidos e os ambientes pouco explorados, mas não há nada realmente inovador por aqui.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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