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Sinopse
Em O Barbeiro Conspiracionista, no bairro Tuscolano, em Roma, Itália, Antonio é um barbeiro que vive com sua esposa Susanna e o filho adolescente. Observando que o poste de luz em frente à sua barbearia pisca intermitentemente à noite, ele começa a suspeitar que as interrupções são mensagens em código Morse. Tentando interpretá-las, Antonio mergulha em teorias conspiratórias, ganhando atenção primeiro da vizinhança, depois de um público mais amplo. Selecionado para a 8 ½ Festa do Cinema Italiano 2025.
Crítica
Enquanto alguns países optam por abordagens mais densas, seja pelo drama, pelo suspense e até mesmo por temáticas que possam emular o terror das grandes tragédias, a Itália tem demonstrado apreço por tecer comentários sobre a vida cotidiana e suas cada vez mais intensas transformações sociais e tecnológicas por meio de uma tessitura mais cômica, menos tensa e mais corriqueira. À primeira vista, parece não se levar tão a sério, como se estivesse a um passo do absurdo ou do exagero. Porém, um olhar mais detalhado irá revelar uma intensa preocupação a respeito das consequências destas transformações e os efeitos das mesmas no homem comum, o cidadão ordinário e, por isso mesmo, longe de ser considerado especial. Se em Tempos Super Modernos (2021) o cineasta Pif fazia um comentário sobre a ‘uberização’ da economia mundial, em O Barbeiro Conspiracionista é a vez do diretor Valerio Ferrara se debruçar sobre a formação da extrema direita no debate político. E tudo isso por meio de um discurso disfarçado de comédia de costumes que poderia acontecer com qualquer um, até mesmo com o espectador ao lado.
Antonio Calabrò (Fabrizio Rongione, de Dois Dias, Uma Noite, 2014) é o tal barbeiro do título. Sua vida consiste em atender aos cada vez mais escassos clientes do tradicional negócio que comanda numa das periferias de Roma, jogar conversa fora com os vizinhos e conhecidos no boteco do cunhado e passar o pouco tempo que sobra em frente à televisão ao lado da esposa e do filho pequeno. Essa é uma rotina desprovida de surpresas, motivações ou metas a serem cumpridas. Como se todos os dias fossem exatamente iguais uns aos outros. E se no concreto tudo permanece o mesmo, será na imaginação – o que para alguns será sinônimo de ‘fantasia’ – que as possibilidades de algo novo poderão surgir. Ele é o tipo de cara que se revolta com a criança que passa cada vez mais tempo sintonizada na tela do seu smartphone, ao mesmo tempo em que repete o mesmo comportamento em fóruns online ou em debates pelas redes sociais buscando culpados para as desgraças da existência moderna. Como se o responsável fosse sempre o outro, sem nunca olhar para si mesmo.
De tanto procurar, uma hora o tom fora da curva, enfim, aparece. E para Antonio isso se dá ao perceber o poste de luz em frente à sua barbearia, à noite, quando se prepara para voltar para casa. Para qualquer um que passe rapidamente por ali, poderia ser apenas um mau contato. Mas para ele, os indícios apontam para algo a mais por detrás daquele piscar das luzes. Pois eles não se dão de forma semelhante. Uns são mais rápidos. Outros, mais lentos. E, aos poucos, ele identifica ali o que pode ser uma mensagem em código Morse. O resultado, uma vez traduzido, é assustador. Perigoso demais para guardar para si. Assim, sua leitura se espalha. O terreno para tantos outros como ele, ansiosos por acreditar em alguma coisa – qualquer coisa – é imenso e assustadoramente fértil. Quando menos percebe, estará despertando atenção nacional. A mesma curiosidade que lhe trará notoriedade, também irá lhe gerar dores de cabeça talvez maiores do que possa ser capaz de suportar.
Baseado no curta-metragem de mesmo nome que Ferrara dirigiu dois anos antes – e premiado ao redor do mundo, em eventos como o Festival de Cannes e a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo – O Barbeiro Conspiracionista não se exime em manter a ilusão daqueles dispostos a se deixar levar pelo improvável – como o desfecho lúdico aponta – ao mesmo tempo em que deixa claro ser essa necessidade algo fabricado, mesmo que lhe falte embasamento factual naquilo que afirmam acreditar (apesar de se deparar com um funcionário da companhia elétrica disposto a consertar o poste de luz, o protagonista segue firme em sua teoria de perseguição). O debate, enfim, está posto. Falta à narrativa apenas um maior interesse em se aprofundar nos pontos propostos. Afinal, por mais que aqui estejam reunidos, uma análise detalhada sobre seus desdobramentos poderia não apenas servir aos personagens, como também aos espectadores, tanto como alerta, como fronteira entre ficção e realidade.
Filme visto durante a 12a 8 ½ Festa do Cinema Italiano, em junho de 2025


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