Nas Estradas do Nepal
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Min Bahadur Bham
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Kalo Pothi
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2015
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Nepal / França / Alemanha / Suíça / Rússia
Crítica
Leitores
Sinopse
Prakash e Kiran são dois amigos nepaleses que, a despeito de serem de castas diferentes, decidem criar juntos uma galinha para lucrar com a venda de ovos. Um dia, a penosa some e eles parte numa jornada durante um frágil cessar-fogo na guerra civil que abala o país.
Crítica
Prakash e Kiran são dois meninos inseparáveis, sempre aprontando das suas, assim como qualquer outra criança como eles. Estamos, no entanto, no Nepal do início deste século, mais precisamente em 2001, em meio a um dos mais traumáticos conflitos bélicos já enfrentados no país: a Guerra Civil motivada pela Revolução Maoísta, que durou dez anos (1996-2006) e causou milhares de mortes, êxodo de outros tantos e, para piorar, convocou ao combate jovens de todas as idades, impedidos de continuar seus estudos e formações. Ou seja, vidas que foram ceifadas logo numa fase tão prematura. Em Nas Estradas do Nepal, no entanto, tudo o que tem preocupado os protagonistas é o destino da galinha que decidem criar em conjunto. Pode ser pouco, mas para eles é um mundo que está em jogo. Assim como esse filme, pequeno, porém repleto de significados.
Uma frágil trégua está prestes a acontecer. O monarca está ocupado em visitar as regiões mais afetadas, e os ânimos estão exaltados. Para os pequenos, no entanto, o que importa é a rotina do dia a dia, a ida à escola, atender as tarefas de casa e brincar com os amigos na maior parte do tempo possível. Como está cada vez mais difícil se desligar de todo o resto e se focar em apenas ser criança, muitas vezes válvulas de escape se fazem necessárias. Como a galinha Kashmira, um presente da irmã mais velha de Prakash, que vê nos ovos da ave a chance de um ganho para o menino – e, consequentemente, para toda a casa. Para ele, é o começo de uma aventura que terá desdobramentos que nem ele mesmo imagina. Para ela, é um presente de adeus. Afinal, todos precisam fazer a sua parte diante do instável cenário político em que vivem. Mesmo sem as condições ideais para tanto.
Assim que irmã se vai para se juntar a uma milícia independente, o pai decide vender a galinha, sem, no entanto, consultar o filho. Este, ao saber da notícia, parte em sua busca. Recuperá-la é sua prioridade. Seja pagando o preço que lhe foi imposto, afanando-a de outros proprietários ou simplesmente fazendo uso das artimanhas que eles, mesmo naquela tenra idade, já dispõem. Em um momento pontual, Prakash se vê no centro dos acontecimentos, em plena cidade. Há militares e religiosos, das mais diferentes facções, por todos os lados. Passantes, trabalhadores, curiosos estão em seu caminho. Para ele, mesmo em câmera lenta, tudo parece simplesmente não se mover. É um mundo em transição, colocado em ponto de espera.
As lentes do diretor e roteirista Min Bahadur Bham não possuem pressa e nem estão preocupadas em enquadrar momentos transformadores. O que possuem diante delas é suficiente para iluminar seus caminhos. Por isso, se ocupa de seguir seus dois atores mirins, que com despojamento e muita entrega vivem os percalços de seus personagens com incrível verossimilhança. O espectador se vê a tal ponto envolvido com suas desventuras, em um registro quase documental, que se torna impossível não vivenciar a realidade exposta, ainda que essa esteja distante no tempo e no espaço. No caminho dos dois, há o idoso tradicionalista, o malandro à espera de uma oportunidade, a moça em busca de novidades. Apesar do batismo nacional, não se trata de um road movie, no entanto. Antes disso, é um filme de, com e sobre pessoas. Homens, mulheres e crianças com suas preocupações. Sejam essas o futuro da nação ou a galinha que criam. Afinal, esta, mais do que um animal de estimação, também é a possibilidade de um futuro.
Representante oficial do Nepal na disputa por uma indicação como Melhor Filme Estrangeiro no Oscar 2017, Nas Estradas do Nepal teve sua estreia mundial na última edição do Festival de Veneza, de onde saiu premiado na Semana da Crítica. Como uma estrutura e sensibilidade que nos remete à títulos iranianos como Filhos do Paraíso (1997), temos aqui uma história que lida com tabus, diferenças e o poder de ter e de abrir mão, de reconhecer a importância das coisas e o verdadeiro valor de uma amizade, de um sentimento e, mesmo, da necessidade de fazer sentido em um mundo cada vez mais inconstante. Absurdamente simples, mas, e talvez por isso mesmo, discreto em sua genialidade e ambições. Assim como esses dois meninos, que não esmorecem diante cada novo percalço, tendo não mais do que a amizade de um pelo outro como ponto de apoio. Este também é o resultado de uma narrativa que pouco promete, mas termina por entregar muito mais do que o esperado, ainda que somente aos mais atentos.
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