Crítica


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Sinopse

Uma história de amor improvável ambientada no Rio de Janeiro do começo do século 20. Artur é um ladrão que ataca hóspedes de um hotel à noite e Eva é uma mulher que largou seus sonhos para ser infeliz no casamento.

Crítica

A diretora publicitária Mini Kerti, um dos nomes fortes da Conspiração Filmes, dá um passo ousado em sua segunda experiência como cineasta. Após realizar o competente, porém pouco expressivo, documentário musical Contratempo (2010), feito em parceria com a atriz Malu Mader, ela volta agora às telas com um projeto bem mais ambicioso: Muitos Homens Num Só, uma história de época ambientada no Rio de Janeiro do final do século XIX. E o resultado, bonito de se ver e fácil de se acompanhar, parece apontar para um caminho que o cinema brasileiro merece, de fato, se arriscar.

Ao contrário das cinebiografias históricas comandadas nas décadas passadas por nomes como Sérgio Rezende – a referência mais imediata é Mauá: O Imperador e o Rei (1999) – que se apresentavam de forma opulenta e bastante engessada, o trabalho de Mini Kerti, por outro lado, é mais íntimo e pessoal. A trama se ocupa da reconstituição dos passos do gaúcho Arthur Antunes Maciel, também conhecido como Dr. Antônio (entre tantos outros pseudônimos) e que foram resgatados pela primeira vez no livro Memórias de um Rato de Hotel, de João do Rio. Expulso de casa ao se revelar um larápio de mão cheia, é levado ao Rio de Janeiro por um malandro mais experiente e lá começa uma carreira de pequenos golpes, porém tão bem executados e com tamanha destreza que ele acaba se tornando uma figura pública.

O modus operandi do Dr. Antônio era se registrar em um hotel – cada vez usando um nome diferente – e, com o jeito simpático e olhar conquistador, ir se envolvendo aos poucos com os demais hóspedes, até descobrir seus segredos e tesouros. Assim, na calada da noite – ou na primeira oportunidade apresentável – ele invadia os quartos alheios e levava consigo o que mais lhe interessava. Depois, era só ir para um outro estabelecimento e trocar o cartão de visitas, assumindo uma nova personalidade. O importante, para que isso funcionasse tão bem, é estarmos situados em um período em que não haviam instrumentos de identificação social. Impressões digitais eram uma realidade inédita, e a fotografia estava recém dando seus primeiros passos. E sem retratos falados – pois o larápio, sem ser pego, nunca se assumia como suspeito – seu reconhecimento era quase impossível.

Esse primeiro momento, quando o cenário está sendo construído e a direção de arte e os figurinos impressionam, Muitos Homens Num Só conquista de imediato a atenção do espectador. A situação começa a ficar um pouco diferente quando tem início o episódio que mudaria sua vida para sempre. Num destes esquemas, ele acaba se envolvendo com uma jovem recém casada, e a atração que surge entre os dois irá lhe motivar a rever suas certezas. Ao mesmo tempo, a pressão de um antigo companheiro para que realize um roubo bem mais expressivo também coloca em risco sua segurança. Por fim, há o policial encarregado da sua investigação, um jovem determinado a adotar as técnicas mais modernas e revolucionárias para reconhecer o responsável por tamanha comoção. E num acaso do destino tudo irá se encaminhar para uma resolução triste, porém satisfatória. Neste ponto, algumas soluções empregadas esbarram no clichê, assim como as relações que surgem entre os personagens se dão de forma apressada e superficial. Nada, no entanto, que prejudique um entendimento mais amplo.

Liderado com garra por Vladimir Brichta, neste que talvez seja seu papel mais completo no cinema, o elenco de Muitos Homens Num Só chama atenção também pela participação de Alice Braga, como o interesse romântico do protagonista, voltando a se envolver em um projeto de maior estrutura no Brasil, após tantas experiências internacionais. Os dois foram premiados no Cine PE – Festival do Audiovisual, assim como o longa, que foi o mais festejado da edição de 2014 (ganhou dez troféus ao todo, inclusive o de Melhor Filme). Talvez esse reconhecimento tenha sido um pouco exagerado – seria preciso conhecer todos os concorrentes para uma avaliação mais precisa – mas méritos inegáveis a obra de Mini Kerti possui. E é muito bom quando percebemos que algo que começa como um risco finaliza de forma gratificante.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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