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Sinopse

Correndo contra o tempo, desesperada para encontrar a filha desaparecida, uma mãe acaba expondo uma série de assassinatos não resolvidos.  

Crítica

Existe uma tensão constante em Lost Girls: Os Crimes de Long Island, filme baseado em eventos e pessoas reais. A história é contada com um cuidado visual para ressaltar o quão lúgubres são as implicações da procura por entes queridos desparecidos. Há uma flagrante vontade de transferir à imagem essa sensação de pesar que se abate, aqui, sobre um grupo de mulheres lutando por justiça quando suas irmãs e filhas são brutalmente assassinadas ou desaparecem sem explicações. A iluminação insuficiente é uma forma de materializar a obscuridade que perpassa os trâmites e as personalidades de algumas peças envolvidas num compasso de espera supostamente lancinante. Todavia, os pontos ressaltados pela cineasta Liz Garbus se alinham ao lugar-comum, vide o relevo banal à inépcia policial, a tentativa de criar jogos de intensidade com fatos não revelados a respeito de figuras lidas inicialmente como essenciais ao caso, ou seja, há vários desperdícios nesse decurso.

Tais perdas ficam evidentes pela maneira como Lost Girls: Os Crimes de Long Island dispõe as singularidades. A protagonista é Mari (Amy Ryan, de interpretação intensa), a típica mãe-coragem que faz das tripas coração para entender o que aconteceu com a filha. A intenção de criar uma curva complexa à personagem esbarra no simplismo com o qual esse trajeto é desenhado. A inicial fragilidade diante da ausência da primogênita é substanciada por elementos passíveis de tornar mais intrincada uma relação aparentemente convencional. Entretanto, a realizadora não se detém, por exemplo, adiante, nas filigranas da dificuldade materna para lidar com a bipolaridade, tampouco torna realmente imprescindível o desvelamento das novas camadas à plena ressignificação do todo. As informações surgem para criar abalos bastante pontuais, não sendo reverberadas como poderiam nas relações estabelecidas, como a da genitora com a questionadora e falante filha do meio.   

Lost Girls: Os Crimes de Long Island, a despeito do bem-vindo desejo de não verbalizar tudo, deixando evidências nas entrelinhas, exibe uma série de lugares-comuns vistos com poucas variações em filmes parecidos. Temos a mãe lutando contra um sistema ora falho, ora deliberadamente omisso; policiais que tratam com desdém as evidências dos crimes avolumados; a pequena sociedade hipócrita, fechada à verdade como forma de se proteger de qualquer abalo sísmico. Mas, Liz Garbus apenas dispõe essas peças, como se seguisse praticamente à risca uma cartilha. A se lamentar, também, que a discussão sobre o moralismo por trás das intempéries enfrentadas pelos familiares das jovens assassinadas – estas todas prostitutas, constantemente tipificadas e preconcebidas como drogadas e degeneradas – não tenha densidade, sendo, como a maior parte dos componentes, apenas inseridas na trama, mas não problematizadas ou iluminadas.

O foco principal não é a busca pelo assassino, mas a forma como Mari, do alto de sua subjetividade atravessada por tantas peculiaridades somente sinalizadas, enfrenta o torvelinho formado por culpa, angústia, desespero e desorientação. Lost Girls: Os Crimes de Long Island não se prontifica a oferecer respostas taxativas, sequer passando perto de investigar a natureza do comportamento policial, se essencialmente ausente por pura incompetência ou conivência torpe com a sociedade local avessa ao revolver de suas intimidades nem sempre lícitas ou virtuosas. Indícios são apresentados, mas nunca cravados como provas irrefutáveis disso ou daquilo. Esse itinerário, que deixa espaço ao espectador agir ativamente como parte do processo de construção da narrativa, poderia muito bem equivaler ao tratamento das minúcias surgidas no decorrer da investigação. Infelizmente não é o que acontece, o que deixa o filme num meio termo entre inventividade e comodismo.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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