Crítica

O diretor austríaco Patric Chiha encontrou o assunto do seu filme Irmãos da Noite meio por acaso. Em Viena, foi levado a um bar/prostíbulo em que conheceu jovens adultos búlgaros, que vendiam seu corpo na noite atrás do sonho da riqueza “fácil”. Chiha se encantou pela história daqueles rapazes e resolveu filmá-los em seu ambiente de trabalho. Em vez de um documentário puramente, decidiu conceber junto de seus retratados algo híbrido, no qual eles pudessem inventar e se reinventar. Assim surge este filme que, mesmo com seus problemas, consegue mostrar uma realidade distante da audiência em geral.

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Belissimamente fotografado, Irmãos da Noite acompanha o dia a dia de garotos de programa em Viena. O laço formado por eles é bastante forte – justificando o título do longa – e a maior vontade daqueles rapazes é aproveitar a vida com o dinheiro que fazem com suas noitadas. Muitos deles são casados em seu país de origem e acabam enviando algum dinheiro para casa. O público alvo do bar em questão são homens mais velhos, que pagam de 30 a 1000 euros por uma noitada – depende da sorte e do talento do garoto em questão. O filme não se detém muito nos programas, mas no relacionamento entre aqueles “irmãos”. Seus sonhos, anseios e, porque não dizer, devaneios são capturados pela câmera de Chiha, que nunca julga nenhuma das atitudes de seus retratados.

Isso acaba sendo um dos problemas de Irmãos da Noite, inclusive. O diretor parece encantando com aquele universo e acaba dourando a pílula, romantizando demais algumas situações. Tudo parece muito divertido, nunca perigoso. Naquele universo parecem inexistir drogas pesadas, cafetões e clientes violentos – algo que se imagina comum no ramo. Essa inocência parece destoar do cenário. Outro ponto que incomoda é a verborragia. O filme não dá muitos respiros e é minado de diálogos do início ao fim. Nos poucos minutos que o falatório cessa, a música surge de forma invasiva.

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De qualquer forma, a gama de personalidades capturadas por Chiha é riquíssima e prende a atenção do espectador. São muitas histórias curiosas a respeito do trabalho daqueles garotos, algo que nos coloca muito próximos daquela “realidade”. As conversas a respeito de sua sexualidade, os conflitos internos, as brigas de ego e os incontáveis clientes. Isso e muito mais aparece no longa. Curiosamente, quem não dá as caras no filme é a mulher. Elas só aparecem em fotos no celular e em uma imagem desenhada em um quadro. Aquele universo é apenas masculino. Fosse mais calcado no documental e menos nas cenas ensaiadas, Irmãos da Noite seria um título mais vigoroso. Os protagonistas parecem interessantes o suficiente para justificar um filme sobre suas vidas, com os trechos encenados soando como corpo estranho em uma produção visualmente muito bem acabada.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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