Crítica


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Sinopse

Guigo está apaixonado por Sabrina, com quem troca mensagens pelo celular. Ele é filho de pais separados. Certo dia, ele e seu amigo Túlio viajam para uma pescaria com seu pai, Roberto, e o amigo dele, Paulo. A viagem teria tudo para dar certo, se houvesse sinal de internet. A falta de comunicação deixa Guigo desnorteado e ansioso para marcar um encontro com Sabrina. Além disso, ele ainda terá de lidar com outra situação: antes que Roberto conte ao filho, Guigo descobre que Paulo é, na verdade, o namorado de seu pai.

Crítica

O signo principal de Guigo Offline é a angústia decorrente das impossibilidades. Este telefilme dirigido por René Guerra tem como protagonista Guigo (Antonio Haddad Aguerre), púbere apaixonado pela colega Sabrina (Sabrina Nonata). Aliás, os momentos de flerte entre eles, sejam os presenciais ou os construídos a partir da troca de mensagens de texto que surgem na tela, exalam frescor, tornando absolutamente crível essa aproximação marcada por um misto de interesse e embaraço. Mas, a paixonite adolescente serve apenas de subterfúgio para a erupção de questões de outra ordem, sobretudo as que dão conta das especificidades da tensão instaurada entre o garoto e seu pai, Roberto (Alexandre Cioletti), deflagrada com parcimônia numa viagem ao interior, à propriedade em que o sinal do telefone não pega, portanto inviabilizando o contato de Guigo com Sabrina, o que gera ansiedade e inquietação.

Há aqui uma preocupação evidente com as minúcias. René demonstra isso, por exemplo, na rápida tomada de fotos de uma pescaria do passado, que denota a ligação de Roberto com o próprio pai e a importância, para ele, de repetir o ritual para aproximar-se do filho. É o tipo de procedimento que, ao mesmo tempo, torna a narrativa mais enxuta e menos refém de explicações diretas, ampliando ressonâncias e evitando a dependência do didatismo. A falta de comunicação é a via pela qual percebemos a problemática entre os personagens. Paulo (Roberto Rezende), namorado de Roberto, e Tulio (Pedro Goifman), amigo de Guigo, amparam emocionalmente os respectivos chegados, ouvindo as dificuldades que um tem com o outro. O genitor preocupa-se com a reação do rebento à revelação de sua homossexualidade. Este, por sua vez, não entende porque a verdade é escondida, camuflada, pois ciente dela há tempos.

Em meio ao andamento marcado por um anseio de valorização da sensibilidade, empenhado em ressaltar as particularidades da incapacidade de expressão completa, Guigo Offline oferece instantes luminares, como Guigo e Tulio cantando Space Oddity, de David Bowie, com o inglês que lhes compete. Mesmo que o roteiro ocasionalmente leve a lugares mais comuns, com diálogos expositivos e desdobramentos um tanto apressados – vide o ato heroico de Tulio e a falta de uma dimensão mais sólida de suas consequências – o média-metragem é completamente inclinado a expor as aflições das pessoas, não se atendo somente à homossexualidade escondida como força motriz, embora dela partam os demais temas encarados, mas oferecendo um olhar carinhoso às impossibilidades postas, registrando-as como algo inerente tanto ao processo de crescimento quanto ao de assumir-se plenamente.

Guigo Offline propõe, também, um bem-vindo e singelo exercício de empatia. Guigo não é destituído de falhas, apresentando comportamento instável, fruto de não poder falar com Sabrina, em virtude do empecilho técnico, e de não sentir-se totalmente à vontade com o pai, por conta dos interditos incômodos. A despeito de sua duração diminuta, o telefilme perscruta com propriedade a singularidade dos personagens, principalmente a do pai e a do filho, sem negar a Tulio e a Paulo um espaço, ainda que restrito, de expressão às suas subjetividades. René Guerra foge de certos vícios televisivos, evitando oferecer soluções demasiadamente fáceis para problemas enraizados, embora, tampouco, proponha-se a acentuar a dramaticidade intrínseca à incomunicabilidade vista. Uma obra simples, que demonstra o ímpeto louvável de entender as demandas humanas, dando-lhes boa atenção.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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