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Sinopse

Um trio de brilhantes mulheres negras trabalha na NASA. Elas são parte vital de uma das maiores operações espaciais da História. Além dos desafios do cosmos, elas tiveram de enfrentar o racismo e a intolerância.

Crítica

Estrelas Além do Tempo, de Theodore Melfi, é uma espécie de encontro entre Os Eleitos (1983) e Histórias Cruzadas (2011). Do primeiro, obra máxima de Philip Kaufman, o filme toma emprestado o tema da corrida espacial entre Estados Unidos e União Soviética nos anos 60, centrando atenção nos esforços da NASA para ultrapassar os soviéticos após eles serem bem-sucedidos no lançamento do primeiro satélite artificial da Terra, o Sputnik 1 (em 1957), e do primeiro homem para fora do planeta (o cosmonauta Yuri Gagarin, em 1961). Já o diálogo com o segundo, sucesso surpresa e um tanto controverso dirigido por Tate Taylor, se dá na filiação a um cinema que, ao falar de um assunto politicamente denso como o racismo, o faz numa perspectiva edificante, inspiradora e, no fim das contas, conciliadora.

É interessante observar como Estrelas Além do Tempo parece uma versão resumida e for dummies do filme de Kaufman quando foca na corrida espacial. Melfi e a co-roteirista Allison Schroeder chegam a copiar até certo ponto a estrutura de Os Eleitos ao, por exemplo, interromper esporadicamente o acompanhamento dos trabalhos na NASA para exibir cinejornais que apresentam os repetidos sucessos soviéticos. No entanto, toda a complexidade narrativa e visual de Kaufman, que fazia desses pequenos intervalos momentos de imensa ironia dentro de um filme sério sobre pessoas sérias, se perde aqui, dando lugar à mera reprodução de um discurso maniqueísta típico da época retratada. Ainda assim, Estrelas Além do Tempo consegue ser um filme eficiente sobre o tema, principalmente conforme a narrativa avança e os feitos de suas protagonistas, sobretudo da personagem de Taraji P. Henson, ganham peso nas decisões da NASA.

E, no fim das contas, o interesse de Melfi é mesmo destacar as três mulheres negras (as outras duas são interpretadas por Octavia Spencer e Janelle Monáe) apagadas pela história, mas que tiveram importância para o sucesso do programa espacial norte-americano. Aqui o filme mergulha nessa verve Histórias Cruzadas, apostando na denúncia fofinha, com lição de moral, que permite, ao final, a elevação de suas protagonistas negras e o reconhecimento de seus talentos pelos brancos outrora racistas. Se a intenção é ótima, o resultado é absolutamente previsível – e irritante nessa previsibilidade. É esperado, por exemplo, que cada uma das três personagens principais tenha um momento redentor na narrativa, em que farão um discurso poderoso de combate, e consequente convencimento, àqueles que lhes emperram o caminho. E esses momentos estão lá, especialmente para Henson (numa cena que visa solucionar a segregação nos banheiros da NASA) e Monáe (que convence um juiz a “passar para a história” ao tomar determinada decisão).

Mas, justiça seja feita, tirando essas cenas grandiloquentes esperadas, Estrelas Além do Tempo até consegue, dentro de sua absoluta falta de sofisticação, manter um tom relativamente discreto. E, na comparação com Histórias Cruzadas, ao menos não há aqui a figura do branco redentor, responsável por salvar os negros da opressão. O personagem de Kevin Costner talvez seja o que mais se aproxima disso, mas, ainda assim, todas suas ações são movidas não por alguma consciência humanista sobre os horrores do racismo, mas por uma inabalável ética do trabalho e pela busca incessante por resultados que advém daí. Soa menos anacrônico e paternalista, portanto. Costner, aliás, é o dono da melhor atuação do filme, se mostrando plenamente confortável na pele do típico americano branco médio que ele adora interpretar desde sempre.

Tendo em seu horizonte uma obra-prima e um filme de qualidade bastante contestável, Estrelas Além do Tempo alcança o que se espera minimamente dele: fica no meio termo entre o peso histórico e a qualidade impressionante de Os Eleitos e a mediocridade quase total de Histórias Cruzadas. O saldo final é positivo.

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é um historiador que fez do cinema seu maior prazer, estudando temas ligados à Sétima Arte na graduação, no mestrado e no doutorado. Brinca de escrever sobre filmes na internet desde 2003, mantendo seu atual blog, o Crônicas Cinéfilas, desde 2008. Reza, todos os dias, para seus dois deuses: Billy Wilder e Alfred Hitchcock.
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