Crítica


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Sinopse

As frias terras do norte testemunham uma guerra sangrenta. Mercenários e gigantes de gelo travam batalhas colossais na tentativa de garantir a supremacia do território.

Crítica

Uma tropa heterogênea fica encurralada pela ameaça de inimigos com altíssima capacidade bélica. A tragédia iminente, o tempo contando a desfavor, a tensão da enervante espera alimentando rixas e senões antigos, todo esse conjunto já nos deu obras-primas como Onde Começa o Inferno (1959) e tem potenciais enormes. Uma pena que o filme de Howard Hawks habite a anos-luz (mesmo) deste Espada da Vingança: Até a Última Linha, tentativa malfadada de concentrar num ambiente exíguo quase todo um universo ao qual somos convidados a cair inadvertidamente de paraquedas. A tropa confinada num casebre de dois andares está situada em alguma cronologia de um medievalismo fantástico. Arqueiros, guerreiros portando espadas e colegas combatentes adeptos do corpo-a-corpo são companheiros de curandeiras e bruxas, espreitados por gigantes e demais criaturas para além da nossa imaginação. A dimensão externa é apenas mencionada numa verborragia descontrolada e sem uma articulação que favoreça o entendimento. Quando muito, um vislumbre ao longe de uma dessas abominações construídas a toque de caixa por efeitos visuais de gosto bem duvidoso.

É fácil perder-se em Espada da Vingança: Até a Última Linha. Os personagens conversam como se o espectador estivesse confortável nesse mundo em que as questões são resolvidas por meio da força. A morte recente do Capitão, rusgas entre os retidos nas paredes carcomidas que ainda oferecem certa segurança acabam sendo arrastadas/minimizadas por uma enxurrada de nomenclaturas dispostas a esmo, animosidades entre povos parcamente contextualizadas e grandes jornadas mal formuladas narrativamente. Responsável por uma frágil estrutura meramente expositiva, o diretor Michael Babbit não consegue efetivar o suposto peso dramático do conteúdo. Top (Dante Walker) fala com pompa e circunstância sobre códigos de honra, heranças e tradições, mas não há delineação visual nem dramatúrgica que sustente a carga de tais palavras. Em vários momentos a debilidade da encenação deixa espaços à sensação de que estamos diante de uma peça feita por fãs, dada a inconsistência existente em várias esferas. Acredita-se que uma maquiagem convincente basta.

Michael Babbit recorre em instantes-chave à demonstração de magia por parte da bruxa e da curandeira, não conseguindo, no entanto, com a tática da pontualidade camuflar a precariedade da técnica. Com o passar do tempo é possível reter dos diálogos algumas informações importantes para que entendamos um par de coisas, como a dinâmica de honradez que faz comportamentos controversos colocarem pressão sobre o grupo que precisa de coesão se quiser sobreviver aos exércitos selvagens em seu encalço. Mas, de modo impressionante, o realizador boicota essas possibilidades ao enxertar cada vez mais componentes vazios nesse universo já excessivamente confuso e saturado. As pessoas se referem rapidamente a episódios do passado, como se o espectador tivesse previamente ciente ou testemunhado eles. Ninguém esclarece a conjuntura. Portanto, existe uma coexistência um tanto paradoxal entre falar demais e explicar de menos. De um lado, uma verborragia cansativa, principalmente por estar ancorada numa lenga-lenga que parece fazer sentido apenas aos criadores. Do outro, a ineficiência para lidar com as lacunas. No meio, a gente, mais perdido do que cego em tiroteio.

Espada da Vingança: Até a Última Linha aparenta ser feito sob medida por/para aficionados por Dungeons & Dragons e a saga O Senhor dos Anéis. Aliás, ele mais soa como realizado por cosplayers desses universos ficcionais realmente fascinantes habitados por trolls, gigantes, dragões e inumados. O problema não está no acabamento beirando o amador – em que pese a crescente qualidade de produtos feitos de maneira caseira –, mas na concepção. É absolutamente cabível (e, se bem articulado, inteligente) criar certo distanciamento entre a ameaça e os protagonistas, especialmente quando não há recursos suficientes para gerar batalhas épicas e sequências visualmente exuberantes. Uma vez que não há meios de apresentar criaturas críveis, coloca-las à distância como um perigo prestes a abater-se é igualmente esperto. Mas, Michael Babbit se esquece de que essa estratégia somente funciona diante de uma construção potente e astuta do âmbito centralizado e restrito. Não adianta caprichar na sujeira, no sangue seco e utilizar diálogos pífios na boca de atores bastante apagados.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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