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Sinopse

Zeneida é uma das filhas de um importante político do Pará. Com mais dez irmãos, ela se destaca por seu jeito atrevido, perseverante e teimoso em suas escolhas. Ela, por ser uma menina sensitiva, vê coisas que mais ninguém vê. Quando conhece Caruana, uma figura encantada que encontra na floresta, ela se apaixona e, a partir dali, começa a viver uma aventura mata adentro, ao mesmo tempo em que começa a entrar em um grande conflito com sua família, que a julga louca.

Crítica

Baseado no livro O Mundo Místico dos Caruanas da Ilha do Marajó, sobre as experiências da pajé e escritora Zeneida Lima, Encantados utiliza uma mitologia praticamente desconhecida de boa parte dos brasileiros. O eixo do filme é a descoberta dos dons de Zeneida (Carolina Oliveira), filha de um político importante, deslocada com a mãe e os irmãos à Ilha do Marajó, ou seja, apartada da vida pública. Nesse preâmbulo, a cineasta Tizuka Yamasaki ressalta a violência do gesto de Angelino (José Mayer), pai da protagonista, de praticamente esconder a família no interior do Pará, agindo conforme convinha à conduta machista vigente. Logo que chega, a menina de olhos curiosos, a priori tão ordinária quanto qualquer outra, experimenta um rápido processo de transformação, passando a tomar contato com elementos inacessíveis à maioria, sendo, em virtude disso, tachada de desequilibrada, por ver o que ninguém vê. O aparecimento do misterioso Antonio (Thiago Martins) é a chave para um novo e fascinante mundo.

Encantados é claramente empenhado em desvelar uma dimensão completamente nova a partir das experiências extraordinárias de Zeneida. A brutalidade masculina, reforçada pelo comportamento do capataz vivido por Anderson Müller, só tem a sua constância quebrada com o surgimento de dois personagens fortemente ligados às coisas da Natureza. Antonio, um Caruana – segundo as tribos da Ilha do Marajó, entidades que habitam o fundo dos rios e igarapés –, e o Mestre Mundico (Ângelo Antônio) apresentam possibilidades de amor e harmonia à menina desorientada pela turbulência doméstica e por conta da agitação decorrente do caráter incontornável de seus dons. Tizuka tenta estabelecer equilíbrio entre as instâncias real e fantástica, promovendo uma interlocução constante, a despeito da fragilidade dessa comunicação imprescindível ao todo. O roteiro de Victor Navas condensa muitos vieses em pouco tempo, do que decorre a sensação de inconsistência predominante.

Não é conferido espaço suficiente para os componentes da trama se consolidarem dramaticamente. Assim, mesmo com o elenco se esforçando para conferir espessura aos personagens, a justaposição das ocorrências não permite a eles atingir uma expressividade suficiente para que o filme transcenda seu âmbito mais epidérmico. A mudança de Zeneida é registrada de maneira abrupta, com, por exemplo, bem menos atenção do que a dispensada ao romance entre a menina predestinada à pajelança e o Caruana Cobra, emerso das águas para demonstrar uma afeição condenada pelas leis naturais. Encantados se ressente da falta de tempo para um aprofundamento significativo no entorno, a fim de que o espectador, especialmente o não iniciado nesse imaginário singular, consiga estimar a representatividade dos acontecimentos e das figuras que os protagonizam. A própria ignorância do povo da cidade diante da sabedoria da Natureza é subaproveitado como motriz.

Valendo-se de paisagens lindas, voltando sua câmera a lugares – geográficos e mitológicos – infelizmente pouco visitados pelo nosso cinema, Tizuka Yamasaki fez um filme em cujo desenvolvimento transborda uma vontade de celebrar Zeneida e sua trajetória. Contudo, a linha que separa a excessiva romantização dessa evidente reverência é bastante tênue. O longa-metragem enfileira episódios potencialmente ricos, porém, não investindo na construção de uma interconexão sólida, pecando, em semelhante medida, na tentativa de tornar substancial a opressão proveniente do ambiente doméstico, fruto direto da ignorância dos pais quanto ao destino da filha. Aliás, a empregada interpretada por Dira Paes luta contra o preconceito de crença, demonstrando sua vocação maternal. Embora possua belas imagens, Encantados não consegue encontrar um tom predominante, principalmente por evocar apressadamente vários deles, o que diminui a força dessa história impressionante e única.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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