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Sinopse

Quatro garotos de 15 anos só pensam em uma coisa: perder a virgindade. Sem dinheiro para contratar uma prostituta, os meninos fazem tudo para conseguirem economizar uma grana, enquanto encaram os compromissos do colégio e as tensões da adolescência. Mas, nessa jornada, o que realmente vão descobrir é o valor da verdadeira amizade.

Crítica

Dirigido pelo gaúcho Zeca Brito, Em 97 Era Assim tem um forte aroma de saudosismo, principalmente para quem viveu a adolescência nos anos 90. Os protagonistas são quatro guris porto-alegrenses, parceiros de estudos, que decidem acabar com o tabu da virgindade. Já vimos esse filme várias vezes, sobretudo no cinema norte-americano, que pintou e bordou com histórias levemente eróticas e repletas de picardias, de jovens em busca da perda do “cabaço”. Aliás, a forma como a molecada se expressa é o primeiro acerto dessa produção que demonstra um cuidado especial, também, com a reconstrução fidedigna de uma década marcada por hits do É o Tchan, pelos corpos se debatendo na banheira do Gugu e a necessidade de pesquisar em enciclopédias para fazer os deveres escolares. Está tudo bem colocado aqui, assim como as gírias próprias da época e a disposição natural para enfileirar palavrões, como se as expressões idiomáticas de baixo calão fossem vírgulas. Esse conjunto coeso confere verossimilhança e garante a pronta adesão do espectador ao que é mostrado.

Os garotos se encaixam em arquétipos. Renato (Frederico Restori) está apaixonado por uma colega de classe que ele conhece desde o jardim da infância. Sua hesitação em perder a virgindade numa casa de prostituição o liga a um perfil sensível, embora ele também faça besteiras, como todo adolescente. Pilha (Pedro Diana Morais), o mais imaturo dos quatro, demora a acompanhar os amigos, exatamente porque ainda exibe comportamentos infantis. Moreira (João Pedro Corrêa Alves) tem um discurso “esquerdista”, gostando de entender a ação dos Estados Unidos como patrocinador dos golpes militares na América do Sul, mas deixando a ideologia de lado para fazer propaganda de um curso de inglês a fim de patrocinar sua importante missão. Por fim, Alemão (Júlio Estevan) é o único não virgem da galera, por conta de uma prévia experiência na zona do meretrício da capital gaúcha. Ele é o arteiro, ameaçado de expulsão, um espelho do pai que frequentemente lhe dá maus exemplos. Em 97 Era Assim, contudo, não está preocupado em fazer quaisquer juízos de valor.

A identificação com os personagens se dá pela habilidade na delineação dos tipos retratados, representativos de uma realidade escolar praticamente universal. A linguagem ágil, que destrincha as peripécias dos "piás" para juntar dinheiro, se encarrega de tornar a sessão agradável e divertida. Em 97 Era Assim é um filme abertamente com cara e jeito de Sessão da Tarde, algo a ser encarado como elogio, levando em consideração que foi na faixa vespertina na Rede Globo que boa parte dos espectadores tomou contato, por exemplo, com as obras de John Hughes. Zeca Brito, diferentemente do cineasta norte-americano, que fazia do entorno um elemento imprescindível à mensagem, não se detém numa contextualização para além da empenhada em desenhar esteticamente a era noventista. Mas, isso não impede que o painel seja relativamente vasto, partindo daquele microcosmo. O roteiro, esperto no mais das vezes, ocasionalmente permite a criação de instantes reiterativos, em que a trama parece basicamente estagnada, sem uma evolução privada de contratempos.

Porém, mesmo que tenha fragilidades, Em 97 Era Assim se volta com propriedade à puberdade, mostrando que, na essência, pouca coisa mudou. Pode-se não ter mais que lamentar a perda do número de telefone daquela pessoa maneira – hoje seria absolutamente possível encontra-la no Facebook, no Instagram, em suma, nas redes sociais –, mas as dúvidas e os anseios são essencialmente os mesmos. Zeca Brito nos oferece uma ótica majoritariamente masculina, não abrindo grandes espaços a contrapontos pelo prisma feminino. O recorte é justamente esse, o que fundamenta a abordagem. O desenvolvimento se submete completamente ao compromisso que os guris assumem de fazer o possível para perder a virgindade enquanto estudam juntos. O cineasta não esconde determinadas coisas atrás de um véu de puritanismo, mostrando seus protagonistas falando e fazendo bobagens, agindo impulsivamente, errando na tentativa de acertar. O longa tem aquela atmosfera sacana tão associada à ebulição dos hormônios, sendo uma ótima e nostálgica comédia adolescente.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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