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Sinopse
Em Dollhouse, após a morte da filha, Yoshie encontra em um mercado de antiguidades uma boneca muito parecida com a menina. O objeto passa a ser tratado como parte da família e ajuda ela a superar o luto. Com o nascimento de Mai, uma nova filha, a boneca é esquecida. Mas será que o brinquedo aceitará essa condição? Horror.
Crítica
Não é segredo para ninguém que o cinema de horror vive momento de reinvenção constante, sempre em busca do novo susto, da nova abordagem, do novo ponto de vista. Há poucos dias, tivemos Bom Menino (2025) chegando às telas com a proposta ousada de narrar o medo sob a ótica de um cão. Mas o Japão, é preciso lembrar, há muito tempo já demonstrou domínio sobre o gênero. Desde As Quatro Faces do Medo (1964), indicado ao Oscar, até fenômenos globais como Ring: O Chamado (1998) e O Grito (2002), o horror japonês consolidou estilo que unia silêncio, assombro e mitologia com precisão quase artesanal. Dollhouse bebe diretamente dessa fonte – e o faz de forma reconhecível, sem grande oxigenação estética. Em tempos de experimentações, o responsável opta pelo tradicional: o prato é simples, mas temperado o suficiente para saciar o público que ainda aprecia um medo à moda antiga.

Na trama, Yoshie (Masami Nagasawa) e Tadahiko Suzuki (Koji Seto) são o retrato idealizado da classe média japonesa, aquele tipo de casal que poderia estar em qualquer comercial vendendo vida tranquila e ordenada. Ao lado da pequena Mei (Totoka Honda), formam família aparentemente perfeita. Porém, uma tragédia repentina com Mei – construída com elegância e sugestão já nos primeiros minutos – desmorona o equilíbrio do lar. Devastada, Yoshie encontra em uma boneca comprada numa feira de rua um refúgio psicológico, algo entre o consolo e a obsessão. O tempo passa, as feridas parecem cicatrizar, e a vida segue com o nascimento de outra filha, Mai (Aoi Ikemura). A boneca, deixada de lado, deveria ter ficado no passado. No entanto, o horror, como o luto, nunca é enterrado por completo.
Shinobu Yaguchi, mais conhecido pelas comédias, como Esconderijo Secreto (1997) e Garotas do Balanço (2004), ainda explora o território do horror com cautela. Ele adota gramática clássica: bonecas amaldiçoadas, ruídos noturnos, casas cheias de corredores e sombras, e uma ameaça que cresce sob o verniz da normalidade. Felizmente, o diretor maneja bem esses elementos, sem saturá-los, demonstrando domínio técnico e consciência de ritmo. O resultado é algo que se sustenta menos pelo susto e mais pela atmosfera, com cadência quase ritualística, como se o medo viesse não de fora, mas das frestas da própria rotina.
O grande trunfo, porém, é a entrega de Masami Nagasawa. Popular em seu país, a atriz interpreta Yoshie com delicadeza dolorosa, tornando a personagem mais do que arquétipo de mãe em luto. Seu olhar, constantemente dividido entre culpa e negação, guia o espectador por labirinto emocional onde o terror é consequência da dor, não o contrário. E Yaguchi, sabiamente, aposta na cumplicidade do público: sabemos antes da protagonista o que está errado, mas não podemos intervir – e é dessa impotência que nasce um medo mais “puro”. O terror, aqui, é assistir à deterioração de alguém que tenta, em vão, reconstruir uma vida já perdida.

A aposta não traz nada realmente inédito, sobretudo dentro do subgênero das bonecas amaldiçoadas. Seu desfecho, inclusive, ao tentar adicionar camada extra de mistério, acaba enfraquecendo a tensão que vinha sendo construída com cuidado. Ainda assim, é filme sólido em sua execução, conduzido com apuro visual e controle dramático. Falta para Dollhouse, porém, um sopro de ousadia – aquele risco capaz de transformar o bom terror em algo verdadeiramente marcante. Há competência técnica e boas ideias pontuais, mas elas nunca se convertem em impacto perene. Uma obra que entretém, mas que se dissolverá rapidamente na memória do espectador.
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Grade crítica
| Crítico | Nota |
|---|---|
| Victor Hugo Furtado | 6 |
| Alysson Oliveira | 3 |
| Chico Fireman | 6 |
| MÉDIA | 5 |

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