Crítica
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Sinopse
Uma jovem empreende uma viagem com suas amigas ao México apenas para apagar um e-mail que pode estragar sua relação com um novo namorado.
Crítica
Wesley (Nasim Pedrad) é uma daquelas pessoas não encaixadas confortavelmente em algumas posições sociais. Ela não consegue terminar a entrevista de emprego sem meter os pés pelas mãos, vive às voltas com contas a pagar e acredita numa conspiração universal, ou algo que a valha, boicotando seus anseios de prosperidade. Mas, não são precisos além de poucos minutos de Desperados para compreendermos que o problema é realmente seu comportamento, a forma como ela tenta adequar-se apesar de tudo ao invés de entender peculiaridades como traços que a tornam única. Está desenhada a necessidade de mudança, a jornada que, independentemente das circunstâncias, seguramente vai terminar em final feliz com as peças devidamente encaixadas como num passe de mágica. A leviana resolução dos conflitos aponta a isso; a igualmente rasa observação das cartas postas à mesa acaba corroborando a sensação de “já vi esse filme, talvez não tão vulgar em certas medidas, mas indubitavelmente com a mesma pegada tola de comédia motivacional”.
Não há qualquer resquício da tipificada Wesley que começa o filme, espalhafatosamente sendo inconveniente com a sua entrevistadora – freira com quem fala de masturbação –, naquela mulher razoável e equilibrada do encerramento que desempenha sua função de maneira sensata. Mesmo essa discrepância enorme, sem gradações, faz parte da vontade de mensurar o tamanho da lição aprendida durante uma temporada de trapalhadas e coisas praticamente inacreditáveis. Depois de colocar em prática o plano de esconder a própria personalidade diante de um pretendente que lhe parece ideal, ela extravasa a raiva por aparentemente ter sido negligenciada num e-mail desaforado. Porém, o aspirante a namorado tinha sumido por estar em coma no México. O que ela decide fazer? Arrastar as duas melhores amigas ao país vizinho a fim de apagar a mensagem antes que as ofensas cheguem ao destinatário convalescente. É preciso boas doses de suspensão de descrença para comprar a viabilidade desse plano caríssimo levado a cabo por alguém que está totalmente falida.
Desperado se transporta ao México sublinhando o pitoresco, ora praias paradisíacas, ora muquifos atravessados por sons horripilantes. É como se à cineasta LP interessasse apenas o país vizinho a partir dos estereótipos. Wesley e as amigas encontram sempre as mesmas pessoas – um par de empregados, mãe e filho numa sucessão de erros envolvendo conteúdo sexual –, além de Sean (Lamorne Morris), cuja presença coincidente por ali solicita ao espectador aumentar a espessura da vista grossa. Enquanto a protagonista transpõe limites para encontrar o quarto do namorado e completar sua missão, os demais são restritos à sua natureza arquetípica, limitados a ser meros instrumentos nesse caminho do aprendizado principal. Há o homem cuja sensibilidade passou despercebida num primeiro momento, claramente o sujeito a ser gradativamente valorizado; a amiga atormentada pela impossibilidade de ter filhos; e a outra companheira de viagem, atolada em dúvidas após ser traída pelo marido. As parceiras servem tão e somente para mostrar que atender aos padrões não garante felicidade. Mas, tais constatações válidas não importam, pois são banalizadas.
Desenvolvendo-se entre o inofensivo e o entediante, Desperado, com o perdão do trocadilho, faz um movimento desesperado de esticar ao limite a corda do bom gosto – que já estava para lá de distendida por tantas situações embaraçosas envolvendo a suposta pedofilia – ao mostrar a protagonista sendo violentada por um golfinho. Você não leu errado. Wesley conversa em alto mar e, do nada, um cetáceo pula entre suas pernas e começa a fazer movimentos pélvicos (com o detalhe do “sorriso” estampado). Não bastasse isso, o animal, após gozar (algo mencionado), volta para literalmente passar seu pênis no rosto da mulher. É o tipo de expediente pseudo-engraçado que certamente possui apelo junto aos que não se incomodam com a estupidez. Pudica frente a determinadas coisas, como a nudez e o sexo libertador, a diretora LP não demonstra reservas diante desse tipo de conteúdo grosseiro, chafurdando no terreno pantanoso da comédia chula, ali onde até os personagens originalmente desprovidos de conteúdo e relevância perdem o resto das suas dignidade e graça.
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