Crítica

Em 1953, Lauren Bacall era uma das jovens atrizes mais em alta em Hollywood, principalmente pela parceria – profissional e amorosa – com Humphrey Bogart, que rendeu clássicos como Uma Aventura na Martinica (1944), À Beira do Abismo (1946) e Paixões em Fúria (1948), entre outros. Betty Grable, por outro lado, estava na ativa desde o final dos anos 1920, se consagrando como um dos nomes de maior apelo junto ao público da época. Então por quê é Marilyn Monroe a primeira a aparecer nos créditos iniciais de Como agarrar um milionário? Simples: enquanto as outras se destacavam por serem estrelas, Marilyn conquistava, a passos largos, o posto de ícone.

O papel de Monroe neste filme é praticamente igual ao do seu longa anterior, Os Homens Preferem as Loiras (1953): novamente ela é a moça bela, um tanto frágil e tola, mas ainda assim esperta o suficiente para saber o que procura. E, neste caso, o que ela e suas duas amigas estão atrás é de um bom partido, e isso significa um bolso cheio o suficiente para atender todos os seus desejos e vontades. Essa fórmula já foi vista e revista inúmeras vezes depois, inclusive nas telenovelas brasileiras – em especial, Sassaricando (1987), em que Tonia Carrero, Irene Ravache e Eva Wilma faziam às vezes na versão tupiniquim das moças em busca de um milionário apaixonado.

Se Bacall é a determinada autora do plano, aquela que aluga um belo e amplo apartamento no centro de Nova York para atrair possíveis interessados em desposá-las, Grable é a caipira do interior mais ligada no físico do que no cérebro. Já Monroe é responsável pela composição mais interessante, e tudo por um simples detalhes que, aqui, faz toda a diferença: sua personagem é cega como uma porta, mas evita usar óculos para não ficar menos atraente e afastar pretendentes – como se isso fosse possível! Suas trapalhadas devido à visão debilitada são bastante físicas, e é muito curioso perceber como a atriz se sai bem também nesse tipo de desafio.

Como agarrar um milionário soa, à princípio, como uma proposta de três mercenárias em busca do golpe perfeito, mas logo o bom coração delas vem à tona e o que temos é uma comédia romântica das mais ingênuas. O diretor Jean Negulesco (indicado ao Oscar alguns anos antes por Belinda, 1948) conduz bem sua trama, fazendo de suas protagonistas seres mais patéticos do que perigosos. Lauren Bacall é a que tem mais tempo em cena, e o oposto acontece com Marilyn Monroe, cuja história fica prejudicada pela extrema simplificação. Entre muito dinheiro na conta bancária e o amor verdadeiro, não será difícil para essas amigas tomarem a melhor decisão. Ainda mais quando estas duas opções podem andar de mãos dadas. Indicado ao Oscar de Melhor Figurino, ao Writers Guild of America de Melhor Roteiro de Comédia e ao Bafta como Melhor Filme, é leve e divertido, pecando apenas por manter na superficialidade um enredo que é até óbvio, mas que poderia render discussões mais acaloradas. Não nos anos 1950, porém como o tempo passa, todos os conceitos podem ser revistos. E este talvez seja o caso.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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