Crítica


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Sinopse

Um jovem empresário, que está noivo, se envolve em um estranho triângulo amoroso. Sem perceber, começa a se apaixonar por um engraxate adolescente.

Crítica

Uma das principais características das pornochanchadas é o questionamento dos costumes aliado ao erotismo. São tradições sociais e culturais envoltas numa metáfora sexual. Cio: Uma Verdadeira História de Amor, que por pouco nem seria enquadrado nesse gênero do cinema nacional, trata da paixão entre o jovem engraxate Darci e o burguês Paulo (Francisco di Franco). Enquanto o garoto vem de uma vida difícil no interior, o homem feito desfruta de um cotidiano satisfatório na capital, com um bom trabalho, carro importado e o noivado com uma rica mulher. Esse contraste entre ambos é um dos motes da produção dirigida por Fauzi Mansur.

Como amor à primeira vista, Paulo se encanta após tirar uma foto de Darci em um caminhão de migrantes. O encontro traçado pelo destino se intensifica quando ele revê o jovem no centro da capital, engraxando sapatos. Ao presenciar o garoto vivendo na miséria, Paulo logo decide, como num impulso, adotar Darci. Acontece que, a partir deste momento, o desenvolvimento da trama ganha um tom fraco. Sua linguagem muitas vezes prima pelo didatismo exagerado que se arrasta quase ao simplório. A narração dos pensamentos de Paulo afrouxa o peso psicológico da direção de atores. Seus dilemas, a problemática de estar se apaixonando por um garoto e ainda ser considerado homossexual, repetidos à exaustão, junto da trilha, tornam um pouco cansativa a obra. Muitas das vozes em off nem seriam necessárias já que a atuação do machão viril Francisco di Franco é muito satisfatória, psicologicamente  bem realizada.

Uma das cenas mais emblemáticas do filme é certamente quando a noiva de Paulo, Ângela (Márcia Maria), começa a desconfiar da relação entre ele e Darci. O casal discute e ela se recusa a acreditar na homossexualidade do parceiro. Tanto que nem consegue falar a palavra homossexual, já pausando em homo e largando um “coisa assim”. Ali é demonstrada a dificuldade da alta sociedade burguesa e até mesmo da sociedade como um todo de aceitar a diversidade sexual dos indivíduos de forma plena.

Enquanto Paulo vive o dilema de assumir para si mesmo a relação que gostaria com Darci, o jovem, por sua vez, parece guardar um segredo que se arrasta e cuja revelação é protelada ao máximo. O espectador já desconfia pelos traços andrógenos do garoto que, na verdade, ele é uma jovem travestida. Talvez seja uma reviravolta que, na época, causasse impacto e certo alívio. Afinal, para o público, Paulo e Darci se salvam de uma relação fadada à marginalidade e ao erro que era considerada a homossexualidade. Hoje, o filme mais parece um retrocesso no aspecto de retratar personagens queer, mas para a época certamente foi identificado como um grande passo.

Mansur peca exatamente no momento da revelação de Darci, que para Paulo é muito mais uma redenção do que uma constatação positiva a respeito da diversidade das sexualidades. Mesmo com dificuldades para edificar sua temática completamente, Cio: Uma Verdadeira História de Amor não possui um saldo assim tão negativo. Sua montagem e fotografia são muito bem realizadas em diversas partes do filme, e a premissa é pertinente por expor críticas relacionadas à péssima distribuição de renda, às dificuldades de quem vive no campo, às concessões dos casamentos de famílias burguesas e à constante busca pelas aparências. Todos esses apontamentos são envolvidos nessa história de amor que talvez nem conseguisse ser filmada nos dias atuais.

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é graduado em Cinema e Animação pela Universidade Federal de Pelotas (RS) e mestrando em Estudos de Arte pela Universidade do Porto, em Portugal.
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