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Sinopse

Em Pacatuba (CE), nos anos 1980, com a massificação da TV, Francisgleydisson, apaixonado pela Sétima Arte, se vê obrigado a fechar o seu querido Cine Holliúdy. Sempre comprometido com seus projetos e decidido a salvar a situação, ele vai se meter em uma das maiores confusões de sua vida ao produzir um filme de alienígenas usando, como atores, os habitantes da cidade.

Crítica

As novas aventuras joiadas de Francisgleydisson (Edmilson Filho) na pequena, porém repleta de peculiaridades, Pacatu, no interior do Ceará, começam exatamente quando a televisão ascende à preferência nacional. O protagonista então é obrigado a desfazer-se do cinema, a vender o ponto para um pastor de araque cheio de tiques e exageros, também vivido por Edmilson Filho. Embora Cine Holliúdy 2: A Chibata Sideral seja um filme rasgadamente cômico, há espaços para essas observações pontuais, calcadas na realidade, como as igrejas evangélicas que ocupam templos da arte e o mecenato político com intenções eleitoreiras. O prefeito Olegário (Roberto Bomtempo) está em franca campanha para eleger a sua sucessora, a espalhafatosa Justina (Samantha Schmütz). É justamente a tal candidata que vê possibilidade de angariar votos se investir na transformação da cidadezinha na sucursal cearense de Hollywood. O antes projecionista apaixonado pela Sétima Arte, por necessidade, se transforma em diretor.

Cine Holliúdy 2: A Chibata Sideral é um filme bem maior, no sentido de produção, que seu antecessor, o sucesso Cine Holliúdy (2012). A abordagem ganha contornos múltiplos com a construção de diversas camadas cômicas, partindo das evidentes, vide as tiradas do roteiro que ganham a sonoridade singular do cearensês. Aliás, diferentemente do longa-metragem anterior, em que a legendagem é literal, dando conta de facilitar a sessão para os não iniciados nos termos falados no Ceará, aqui ela serve de tradutora, elucidando as expressões. A questão extraterrestre surge, inicialmente, como ocorrência factual, pois os especialistas de plantão chegam à conclusão de que as abduções têm como alvos os cabras mais feios do pedaço. Aconselhados pelo cego interpretado pelo cantor Falcão – e há inúmeras piadas sobre o que ele está ou não “vendo” –, essa turma vai tomar o assunto dos OVNI como motor da criatividade, começando a produção de uma ficção científica que antagoniza Lampião e os alienígenas de feiura orgânica.

O cineasta Halder Gomes consegue, mais uma vez, criar algo abrangente no sentido cômico, de verve ligeira, absolutamente valorizada pelo talento e o timming dos atores para o texto de impacto imediato, mas que guarda observações jocosas em outras esferas. Há, por exemplo, o personagem que pontua as conjunturas com comentários críticos, brincando com a ideia de um espectador pedante diante da suposta ignorância alheia. A resistência de Francisgleydisson adquire novos contornos, pois ele agora experimenta o âmbito da direção, lançando mão de expedientes como a pintura dos figurantes de verde e as indumentárias com tampas de panela e afins. É uma declaração de amor a esse cinema artesanal, feito com base na paixão e na admiração. Há, também, a observação da transmissão desse afeto, com Francisgleydisson Jr. (Ariclenes Barroso) demonstrando empolgação para seguir os passos incertos, porém sonhadores e gregários, do pai. De certa forma, isso representa a dificuldade de viver de cinema.

Francisgleydisson é o típico herói que luta contra as adversidades para sobressair num entorno que lhe é desfavorável. Tem um quê de Pedro Malasartes, é alimentado “espiritualmente” por Didi Mocó, no que talvez esteja sua capacidade de comunicar-se amplamente. Dos populares que aderem prontamente a seus planos mirabolantes, passando pela esposa Maria das Graças (Miriam Freeland), que o apoia, não sem oferecer o contraponto do pé no chão, chegando às autoridades malandramente ludibriadas, todos conseguem interlocução com esse homem do povo, simples como o desejo de viver da sua paixão. Cine Holliúdy 2: A Chibata Sideral é divertido e lúdico, com pitadas engenhosas de referências cinematográficas, como os asseclas que mais parecem saídos de filmes de horror, ufólogo (Francisco Gaspar) e pintor (Chico Diaz) semelhantes aos visionários considerados lunáticos do sci-fi, Zé Coveiro (Milhem Cortaz), homenagem direta a Zé do Caixão. Todos são ingredientes desse filme delicioso que não perde a identidade por ambicionar ir além.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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