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Sinopse

Em meio a Segunda Guerra Mundial, muitos que fugiam dos nazistas utilizavam a rota que passava por Casablanca, no Marrocos. Rick Blaine, residente norte-americano que administra uma das principais casas noturnas da cidade, auxilia refugiados clandestinamente. No entanto, ele não esperava ter de ajudar um grande amor do passado.

Crítica

Um dos maiores clássicos da história do cinema nasceu quase que por acaso. Realizado às pressas, sem um roteiro definido que seguia sendo reescrito durante as filmagens e com dois astros que não se bicavam, Casablanca se tornou com o passar do tempo uma das obras definitivas dos anos de ouro de Hollywood. Feito inteiramente nos galpões da Warner em Los Angeles, a trama envolvia espiões internacionais e amantes condenados à infelicidade, agentes secretos e milícias inimigas espalhadas pela Europa e na África, conspirando uns contra os outros em plena Segunda Guerra Mundial – é sempre bom lembrar que este filme foi feito em 1942, ou seja, no auge do conflito. E ainda assim, mesmo com tudo apontando contra si, o retorno foi o mais surpreendente e gratificante possível. Os três Oscars conquistados – entre eles o de Melhor Filme – são apenas um indício disso.

Michael Curtiz, cineasta húngaro de longa carreira e responsável por títulos aventurescos como O Capitão Blood (1935) e As Aventuras de Robin Hood (1938), era um profissional de respeito na meca do cinema quando foi convocado pelo chefão do estúdio Jack L. Warner para tocar esse projeto às pressas. O objetivo era conseguir algo no mínimo razoável e que estivesse pronto antes do final do ano para que, assim, pudesse representá-los durante a temporada de premiações. Os atores escolhidos também não foram os mais óbvios – depois de passar por nomes como Ronald Reagan e Geraldine Fitzgerald, os selecionados foram Humphrey Bogart – recém saído do impactante O Falcão Maltês: Relíquia Macabra, lançado no ano anterior (1941) – e Ingrid Bergman, uma jovem atriz sueca recém chegada na América e que estava conquistando seus primeiros papéis como protagonista. No entanto, por mais estranho que tenha soado à princípio (para completar, ela era mais alta do que ele, que teve que usar sapatos com plataforma durante as cenas dos dois juntos), a química que se estabeleceu entre eles foi tão impactante que é de se estranhar não terem repetido essa parceria nos anos seguintes.

Rick (Bogart) é um americano que há muito abandonou seu lar e conhecidos para se estabelecer em Casablanca, no Marrocos. Estamos no início dos anos 1940, e o mundo está dividido entre os Aliados e as forças do Eixo. Ele, no entanto, não toma partido. A Europa está fechada pelo domínio nazista, e uma das únicas maneiras de se escapar com segurança para a América e atravessando o Mediterrâneo e indo até... Casablanca! De lá, um voo seguro conduz os sortudos até Lisboa, ainda livre do cerco, e depois direto para os Estados Unidos. Mas isso, claro, somente para aqueles que possuem o passe necessário para a viagem. Acontece que um assassinato recente deixou dois desses importantes documentos aparentemente perdidos – o desaparecimentos deles é um mistério apenas em parte, pois se os demais personagens desconhecem seu paradeiro, o espectador sabe desde o início que quem os possui é justamente Rick.

Mas ele não irá abrir mão deles facilmente. E sua decisão fica mais acirrada quando, de forma inesperada, uma antiga paixão adentra no bar em que é proprietário acompanhada do marido, o homem mais procurado do momento pelos agentes de Hitler. Rick, assim, de um lado tem a vida dos dois, mas do outro precisa saber porque foi abandonado por Ilsa (Bergman), seu único e verdadeiro amor, que o deixou no auge da paixão anos atrás, quando estavam juntos em Paris. Outros tipos inesquecíveis, como o Capitão Louis Renault (Claude Rains, impagável) e o pianista Sam (Dooley Wilson, responsável por tocar a marcante ‘As Time Goes By’), também cruzam pelo mesmo lugar, todos com seus próprios interesses.

A despeito dos contratempos que enfrentou em sua produção, Casablanca é o filme perfeito em todos os sentidos. Temos um amor proibido, uma mulher misteriosa de passado nebuloso e futuro incerto, um herói taciturno e cheio de motivos para atitudes surpreendentes, um mocinho (Paul Henreid, que interpreta o marido, Victor Laszlo) que representa tudo que há de certo e, mesmo assim, conta com a torcida contrária ao seu final feliz, uma galeria de vilões desprezíveis (o major Strasser, de Conrad Veidt, o corrupto Signor Ferrari, de Sydney Greenstreet, e o enigmático Ugarte, de Peter Lorre, são apenas os exemplos mais notáveis) e um enredo ao qual ninguém ousa ficar indiferente. Soma-se a isso o visual da terra distante e exótica e a imprevisibilidade de cada reviravolta e tem-se como resultado um dos melhores filmes de todos os tempos.

Premiado no Oscar ainda como Melhor Direção e Roteiro, Casablanca concorreu a um total de oito categorias – perdeu em cinco, portanto – o que mostra que sua consagração não foi imediata, e, sim, algo construído com o passar dos anos. Obra cercada de mitos e lendas – como o fato da frase ‘play it again, Sam’ nunca ser pronunciada durante toda a história – foi decisiva para eternizar tanto Humphrey Bogart quanto Ingrid Bergman como ícones do cinema mundial. Os dois tiveram outros sucessos depois, mas nenhum que se equipare a este verdadeiro fenômeno. Filme que merece ser visto e revisto inúmeras vezes, guarda segredos e descobertas a cada nova visita, confirmando-se, como poucos outros, realmente imortal. E para quem duvida, bom... we’ll always have Paris!

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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