Crítica

Após ter sido indicado ao Oscar e de ter ganho diversos prêmios (como ter sido escolhido Melhor Ator segundo os Críticos de Nova Iorque e de São Francisco) pelo polêmico O Segredo de Brokeback Moutain (2005), o australiano Heath Ledger seguiu um caminho inverso, não aceitando grandes produções. Em vez disso, marcou presença neste pequeno filme independente ao lado da quase desconhecida Abbie Cornish (vista antes em Um Bom Ano, 2006). A decisão, se não a mais óbvia, também não foi igualmente sábia. Não que Candy não funcione no sentido de explorar ainda mais suas capacidades dramáticas; sim, e ele revela nuances frágeis e intensas. Mas por outro lado não acrescentou muito ao currículo do rapaz, que já esteve melhor em outros projetos menores, como A Última Ceia (2001) ou Os Reis de Dogtown (2005).

Dirigido pelo pouco conhecido Neil Armfield e baseado no romance de Luke Davis, esta é a história de um casal que vive à margem da sociedade: tudo o que querem é se drogar e esquecer de qualquer responsabilidade da vida adulta. Ela, vinda de um lar infeliz, parece estar neste caminho apenas para machucar o pais, alheios ao sofrimento da garota. Ele, por outro lado, não tem seu passado desvendado, e pouco ficamos sabendo das causas que o levaram até aquele ponto. O que fica claro é que ambos estão perdidamente apaixonados um pelo outro, mas, acima de tudo, se encontram em estado de completa dependência da droga. Ambos são capazes de tudo - roubar, prostituição, mendigar - para manter o vício, cada dia mais óbvio para todos aqueles que convivem ao redor dos dois.

Candy é o nome da protagonista, mas o filme na verdade tem o ponto de vista dele. Ele é louco por ela, ele que realmente se esforça para desistir do hábito quando ela engravida, ele que é mandado embora numa briga mais forte. Acompanhamos muito mais as desgraças dele do que as dela. Nesta indecisão entre um e outro, o filme parece perder o foco, deixando a chance de se tornar relevante dentro da temática simplesmente passar em branco. Os dois são drogados, mas poderia ser qualquer outro problema a lhes afligir. Não é feito um estudo mais demorado dos motivos e das conseqüências. E quem perde, mais do que o espectador, que permanece distante, sem se envolver, são os realizadores, ao desperdiçarem em mais uma história de amor desajustada uma oportunidade de se discutir uma questão tão pertinente quanto a aqui abordada, porém de modo equivocado, sem o empenho que merecia.

Ledger era um bom ator, e Cornish pode vir a surpreender num futuro próximo. Geoffrey Rush, como o velho amigo gay e patrono dos exageros deles, serve mais como um alívio cômico à tragédia anunciada, sem encontrar meios de se desenvolver profundamente enquanto figura relevante dentro do roteiro. Entre tantas opções interessantes, Candy não chega a ser um desperdício total pelo esforço dos atores envolvidos. Mas, ao contrário de outros dramas similares, como Rush (1991) e Narc (2002), este prefere deixar de tomar uma posição mais política, abandonando discussões e centrando seu olhar no relacionamento afetivo entre duas pessoas em situações limites. Ainda curioso, mas definitivamente menos do que se poderia ter atingido.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.

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