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Sinopse

Um boneco altamente tecnológico adentra a vida de um grupo de crianças. Mal sabem elas que o boneco está amaldiçoado e vai trazer todo tipo de horror para o dia a dia delas.

Crítica

O fato de Brinquedo Assassino não se levar a sério, algo percebido pelos contornos caricaturais da narrativa, não deveria dar aos criadores desse reboot a sensação de onipotência, como se a eles fosse permitido tudo, pois escudados pela vocação ao exagero. O filme é repleto de personagens e situações torpemente estereotipadas. A gênese do vilão macabro é diferente da oitentista. Não mais um boneco horripilante possuído pelo espírito obsessor de um serial killer, agora um altamente tecnológico dispositivo libertado de suas amarras de fábrica. O funcionário vietnamita que, por raiva do patrão, destrava Buddi e o permite ser violento, falar palavrões a atentar contra a vida humana, apenas deixa os clientes a mercê da natureza do produto. Mas, conforme atesta o andar desconjuntado dessa carruagem sem rumo, seria pedir demais uma simples observação da complexidade da constituição disso. Aliás, a megacorporação encarregada do êxito de vendas é genérica.

Brinquedo Assassino, em prol da mescla de horror e nonsense, constantemente dá espaço ao humor involuntário. De início, a entrada para a comédia é proposital, mas sua articulação é tão desprovida de qualidades e consistência que mesmo as cenas aterradoras soam, no mínimo, banais ao ponto de gerar tédio. Andy (Gabriel Bateman), o protagonista, vive às turras com o namorado de sua mãe, Karen (Aubrey Plaza), é tido como um menino casmurro e ensimesmado, avesso ao contato interpessoal, sobretudo pelo fato de ser novo na vizinhança. O acesso ao lugar-comum é simplório e tampouco serve para dar sustentação à forma como o garoto se apega ao boneco defeituoso com o qual é presenteado antecipadamente por conta de seu aniversário. Nem a solidão, sequer a relação com a mãe, tem qualquer indício de solidez, passando na telona, assim como os demais elementos, somente como uma sucessão de erros a serem prontamente esquecidos.

Forte candidato a “bomba do ano”, Brinquedo Assassino apresenta cenas constrangedoras, como a sequência de Shane (David Lewis) sendo atacado no topo de uma escada, com desdobramentos beirando o mau gosto. O cineasta Lars Klevberg não consegue trabalhar criativamente com o fato de Chucky (assim autointitulado) aprender com o tempo, realizando upgrades intermitentes, e desperdiça o potencial da fixação do boneco no menino. Basta Andy – se o fato do jovem ser homônimo da criança da saga Toy Story é para gerar graça, está aí outro equívoco inapelável – dizer que não gosta de alguém para entendermos a marcação do próximo alvo. O filme estabelece esse percurso de forma esquemática, empilhando gente sem estofo, atropelando elos emocionais em prol do andamento de um enredo abalado por um sem número de debilidades. Ao invés de provocar riso, sensação de asco ou apreensão em virtude da vilania do boneco, o filme gera doses de enfado.

Do desenho mecânico da corporação responsável por Chucky, passando pela falta de organicidade dos ambientes familiares, desembocando na completa ausência de talento para, no mínimo, colocar algum sabor nas grotescas cenas de esfaqueamentos e mutilações, Brinquedo Assassino deixa um gosto amargo, oriundo da saudade do seu equivalente nascido nos anos 80, de valor superior em todos os quesitos. Brian Tyree Henry é um talento desperdiçado nesse elenco fraco, embotado por uma trama risível e privada de potencialidades, sejam elas terríficas ou cômicas. Passagens mal filmadas, jump scares apresentados sem, ao menos, o efeito de susto, circunstâncias amplamente questionáveis, tendo como base a lógica interna criada, e o desastre está estabelecido. Nem a voz de Mark Hamill faz diferença nesse equívoco transcorrendo a 24 quadros por segundo em meio a bocejos, tentativas de apego à memória afetiva e um desejo iminente de que tudo acabe logo.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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