Ararat
Crítica
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Sinopse
Investigação do polêmico genocídio dos armênios que viviam no Império Otomano, ocorrido entre os anos de 1914 e 1918. Nesta época, o governo turco também ordenou a deportação de aproximadamente 2 milhões de armênios para a Síria e Mesopotâmia, enquanto internamente realizava verdadeira limpeza étnica. Enquanto isso, um diretor armênio, Edward Saroyan, decide incluir em seu novo filme o grande massacre promovido em 1915 contra os armênios, conhecido como Cerco de Van —com a derrota armênia, que contabilizou 1,5 milhão de mortos, e que fez toda a região do lago Van ser anexada à Turquia.
Crítica
Atom Egoyan é um dos grandes cineastas canadenses que ainda se mantém independente do cinema hollywoodiano. Indicado ao Oscar pelo perturbador O Doce Amanhã (1997), aqui decidiu investigar um drama histórico pouco trabalhado e muitas vezes esquecido, mas que guarda sérias cicatrizes e diversos matizes a serem estudados. Ele se refere ao massacre promovido pelos turcos ao povo armênio durante a Primeira Guerra Mundial, tema que passa a ocupar a atenção dos protagonistas de Ararat quando um importante cineasta (o cantor, e também ator, Charles Aznavour) resolve tratar do tema em sua nova produção, tendo como consultora uma renomada estudiosa do assunto (Arsinée Khanjian, esposa de Egoyan na vida real). Assim, misturando ficção e realidade, dentro de um obra fictícia, o realizador consegue abranger diversos ângulos de uma violência que mesmo um século depois segue provocando mal-estar e fortes discussões.
O protagonista de Ararat, vivido pelo jovem David Alpay (Candidato Aloprado, 2006), é filho da consultora, e a proximidade com sua história acaba levando-o a levantar antigas questões de sua formação. Ele também é namorado de sua meia-irmã (Marie-Josée Croze, de As Invasões Bárbaras, 2003). Essa, por sua vez, acusa a mãe dele de ser a principal responsável pelo suicídio de seu pai, já que na época estavam casados. Todos são de origem armênia, e o foco de estudo do trabalho da pesquisadora é a vida do artista plástico Arshile Gorky, um dos refugiados da guerra turco-armênia e que se suicidou, nos Estados Unidos, antes dos 40 anos. Mas as verdades não são unilaterais, e há também o discurso do ator que interpreta o grande comandante turco (Elias Koteas), ele próprio descendente deste país e com própria visão sobre o incidente e sob a forma que o mesmo está sendo retratado na produção. Para terminar, há o funcionário da alfândega (Christopher Plummer), que decide ouvir a história do garoto que volta da Turquia numa viagem em busca de suas próprias origens.
Este conjunto de intérpretes revelam parceiros inestimáveis de Atom Egoyan. Koteas esteve antes em Exótica (1994), enquanto que Plummer é protagonista do seu mais recente trabalho, Memórias Secretas (2015). Sem falar da própria Khanjian, parceira do cineasta na tela em tantos outros trabalhos e também na vida pessoal. Essa afinidade concede ao filme uma fluência precisa, que mesmo ao abordar temas espinhosos consegue ser maleável o suficiente para atingir entendimento sem um confrontamento direto com o espectador. Como resultado, foi premiado no National Board of Review com o prêmio de Liberdade de Expressão e o grande vencedor do Genie – o Oscar do Canadá – tendo sido reconhecido como Melhor Filme, Figurino, Trilha Sonora, Atriz (Khanjian) e Ator Coadjuvante (Koteas).
Ararat, pra quem não sabe, é também o nome de um importante monte localizado na antiga Armênia. Visualizá-lo era sinal de paz e esperança. E ele está no filme para apontar renovação, revelando ser necessário um momento em que devemos parar de olhar para trás apenas abismados com a crueldade dos fatos, para tentar compreendê-los e aprender com suas experiências. A vida segue adiante, e por mais distante que nosso porto seguro se encontre, é preciso seguir em frente, com força e coragem. E tolerância, também, pois nunca se terá certeza absoluta dos fatos. Egoyam é mais do que eficiente em sua mensagem, e o filme que dela resulta é uma obra bela e profunda, que não perdoa o imprescindível e nem abranda o incômodo. É um trabalho maduro de um realizador preocupado com sua história e com a abrangência de seu relato, o que a transforma numa bela lição não só de cinema, mas também de vida.
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