Crítica

Amaldiçoados é um projeto que nasceu “amaldiçoado”. Muitas cenas do longa tiveram que ser refeitas meses após o desagrado percebido em alguma exibições-teste, o roteiro foi reescrito em diversas ocasiões – inclusive durante as filmagens – e atores foram substituídos no meio da produção, o que levou o seu lançamento a ser adiado mais de uma vez. Atores como Mandy Moore, Illeana Douglas, Scott Foley, Omar Epps, Robert Foster, Corey Feldman e Skeet Ulrich chegaram a estar confirmados no elenco, mas acabaram saindo devido aos contínuos atrasos. O caso de Ulrich – na época ainda um nome reconhecido por participações em filmes de prestígio como Melhor é Impossível (1997), com Jack Nicholson, e Cavalgada com o Diabo (1999), de Ang Lee – é o mais curioso: mesmo já tendo feito todas as suas cenas, o enredo foi alterado de tal forma que seu personagem desapareceu e ele foi eliminado dos créditos. É difícil imaginar, no entanto, que ele tenha saído insatisfeito com este resultado. Afinal, o que se vê em cena é de deixar qualquer um constrangido.

Apesar de ter estreado no topo das bilheterias norte-americanas no seu primeiro final de semana em cartaz, Amaldiçoados arrecadou nos Estados Unidos pouco mais que a metade do seu orçamento total, que foi de US$ 38 milhões. Uma performance vergonhosa, ainda mais se levarmos em conta a expectativa que este filme carregava consigo por representar uma aguardada reunião de dois dos mais importantes nomes do gênero no momento em que foi feito, o diretor Wes Craven, responsável pelo cultuado A Hora do Pesadelo (1984), e o roteirista Kevin Williamson, que sozinho teve um grande sucesso no afamado Eu Sei o que Vocês Fizeram no Verão Passado (1997). Juntos, os dois renovaram o conceito de terror adolescente com a série Pânico (1996), mas pelo que pode ser visto aqui a impressão é que esqueceram praticamente tudo que eles próprios tanto condenavam.

Amaldiçoados parte de uma temática clássica do universo do terror, em uma tentativa pífia de modernizá-la para as plateias jovens do século XX. A lenda do Lobisomem é o centro da ação, mas há uma carência visível de qualquer novo elemento que proponha algum olhar inovador e minimamente curioso. Dois irmãos (Christina Ricci e Jesse Eisenberg, ambos sem muito o que fazer) sofrem um acidente no trânsito e são mordidos por algo que acreditam ser um animal – um lobo, para sermos mais exatos. Rapidamente descobrem que na verdade foram atacados por um lobisomem, e passa a ser uma questão de tempo eliminarem quem fez isso com eles para que possam se livrar na maldição. A partir desse ponto, ao invés de se investir em reviravoltas e na construção climática de um argumento surpreendente, tudo que é proposto em cena se contenta em ser óbvio e previsível. Assim, adivinhar a verdadeira identidade do vilão é só uma questão de eliminatória. Com um argumento já utilizado à exaustão em tantas produções similares, chega a provocar embaraço perceber que um produto tão medíocre tenha a assinatura destes nomes aqui envolvidos.

Com participações risíveis do elenco coadjuvante – Shannon Elizabeth e Joshua Jackson estão particularmente caricatos – e até dos protagonistas, o que se vê na tela são atores sem a menor orientação, que em alguns momentos não sabem nem para qual lado devem dizer suas falas. E, sem direção ou um roteiro interessante, se pode ter uma idéia do naufrágio que se anuncia. Outro ponto de suposto interesse que se confirma problemático são os efeitos especiais que, ao invés de provocarem arrepios, geram mais bocejos pela trivialidade – quando os irmãos começam a se transformar, as “novas habilidades” que demonstram são pegar uma mosca no ar ou pular pelas arquibancadas do colégio! No final, o que se tem é um clímax patético, que inclui cenas que espantam pela ruindade e servem apenas para colaborar com a sensação de fracasso que permeia Amaldiçoados do início ao fim. A promessa era entregar uma história de terror, mas só o que consegue é ser um verdadeiro horror. E no pior sentido do termo.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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