Crítica

É com certa esperteza que Além do Arco-Íris chega aos cinemas às vésperas do dia dos namorados. Dirigido por Agnés Jaoui, que também atua no longa, o filme é feito sob medida para encantar pombinhos apaixonados. Curiosamente, não é, por si só, apaixonante.

A ideia parecia ser criar uma espécie de rapsódia moderna de contos de fada. Logo na primeira sequência conhecemos Laura (Agathe Bonitzer, meio engessada), a ‘princesa’. Ela tem um sonho recorrente no qual encontra um príncipe encantado, apontado por um anjo. Assim, se apaixona imediatamente por Sandro (Arthur Dupont, lindíssimo) quando o vê num baile (o "Baile do Príncipe") logo abaixo da estátua de um anjo. Paralelamente, sua mãe (Agnés Jaoui), meio hiponga, começa a ter aulas de direção com o pai de Sandro (Jean-Pierre Bacri, melhor atuação do filme), que mora com sua namorada e enteadas hiperativas. Outra subtrama transcorre na família de Laura: seu pai (Didier Sandre) é um industrial, casado com uma madrasta obcecada pela própria aparência (Beatrice Rosen).

Se pareceu confuso, não se preocupe: o roteiro também é. Não que isso importe muito para a fruição completa da obra. Num dado momento, o espectador percebe que o importante não é entender as relações entre os personagens ou suas motivações individuais, mas descobrir qual é "a historinha da vez". O passatempo é até divertido, já que tem Cinderela, Chapeuzinho Vermelho (com direito a um Lobo Mau esquisitão), Branca de Neve e alguns outros.

Nesse sentido, a direção de Jaoui funciona bem, dando um tom de fábula em cada cena e, inclusive, exagerando nesse tom ao fazer com que alguns planos virem "pinturas" – algo que parece saído de um daqueles efeitos prontos do Photoshop. A trilha sonora acompanha bem essa proposta, mesclando trechos de balés de Tchaikovsky (especialmente A Bela Adormecida) com a partitura original. Também há espaço para alguns motetos renascentistas, muito bem cantados, inclusive em cena.

Todo esse clima funciona e, para quem está apaixonado com o mesmo ímpeto adolescente dos protagonistas, a chance de sair do cinema encantado é grande. No entanto, para quem não está embriagado de amor, o filme talvez soe um pouco confuso: o excesso de subtramas resulta na não resolução de algumas, que, a bem pensar, sequer tem razão para estarem ali, já que não agregam significado algum ao roteiro (a criança que quer ser católica e tem coceiras, por exemplo). Também é difícil se situar e entender quem é quem nos primeiros 40 minutos do longa, o que fará os mais impacientes desistirem antes da hora, sem sequer entender quem são protagonistas e se há algum antagonista. Por fim, a brincadeira de fazer metáforas com os "contos de fada" perde a graça depois das primeiras vezes e se torna uma distração da trama, confundindo mais ainda. Uma confusão criada pelo roteiro e levemente aprofundada pela direção, que compra a ideia mas não a vende por completo para o espectador.

Como sugere a cartela final do longa, viverá feliz para sempre quem se deixar enganar pelos artifícios de Além do Arco-Íris (em francês, o filme se chama Au bout du conte, algo como O conto ao pé da letra, o que já sugere o desnudamento da moral da história). No entanto, os apaixonados tem muito mais chances de se render ao doce engano criado pelo filme.

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é jornalista, mestre em Estética, Redes e Tecnocultura e otaku de cinema. Deu um jeito de levar o audiovisual para a Comunicação Interna, sua ocupação principal, e se diverte enquanto apresenta a linguagem das telonas para o mundo corporativo. Adora tudo quanto é tipo de filme, mas nem todo tipo de diretor.
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