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Presença das mais aguardadas desta edição, Pierre Richard desembarcou no Festival de Cinema Francês do Brasil 2025 celebrando uma carreira monumental. Aos 91 anos, o ator e cineasta francês soma mais de 100 filmes, atravessando gerações com um estilo tão único quanto inconfundível. Celebrado pelo evento como uma “lenda viva da comédia na França”, Richard chega ao país como parte da delegação artística convidada especialmente para acompanhar exibições, debater cinema e se aproximar do público brasileiro.

Nascido em 1934, Pierre-Richard Maurice Léopold Defays se tornou um ícone ao explorar personagens atrapalhados, sonhadores e guiados por uma sensibilidade quase musical – figuras marcadas pelo humor físico, pela inocência e por um timing cômico perfeito. 

Seu trabalho, muitas vezes comparado ao de Harpo Marx e Charles Chaplin, ganhou reconhecimento internacional e, em 2006, ele recebeu o César Honorário, prêmio máximo do cinema francês, pela contribuição histórica à arte que ajudou a transformar.

Pierre Richard e Timi-Joy Marbot em Sonho, Logo Existo
Pierre Richard e Timi-Joy Marbot em Sonho, Logo Existo

Nesta edição do festival, Richard apresenta Sonho, Logo Existo, produção que acompanha Grégoire e Michel, dois homens de gerações diferentes unidos pela contemplação da natureza, pela amizade e por um vínculo inesperado com um urso fugido de um circo. 

Durante sua passagem pelo Brasil, o Papo de Cinema conversou com Pierre Richard – que falou sobre corpo, memória, poesia, criação e transformação artística ao longo de mais de seis décadas de carreira. A seguir, fique com a entrevista completa!

ENTREVISTA :: PIERRE RICHARD

1. Em Sonho, Logo Existo, seu personagem transita entre fantasia e percepções subjetivas. Que tipo de preparação você fez para equilibrar o humor, a melancolia e esse viés quase filosófico do filme?

Acho que nunca me analisei completamente. O que faço melhor é o que me escapa. E então, espontaneamente, gosto de humor. Espontaneamente, gosto de temperá-lo com nostalgia, às vezes até com seriedade, e diria até com um toque de burlesco. Mas tudo isso é uma espécie de… salada que eu mesma preparo, sem planejamento prévio, de uma forma completamente espontânea e franca”.

Pierre Richard
Pierre Richard

2. Grande parte da força de Sonho, Logo Existo está na sua presença física em cena. Como você enxerga o corpo como ferramenta narrativa, especialmente nesta fase da sua carreira?

Por muito tempo, minhas pernas foram minha linguagem. Eu falava com as pernas. Minhas pernas substituíam… meus sentimentos, minhas emoções, meus… medos ou minhas hesitações. Minhas pernas eram a linguagem, minha linguagem natural. Agora, com a idade, minhas pernas perderam a força. Então, passei a prestar mais atenção ao meu olhar, aos meus olhos. Afinal, os olhos são as janelas da alma, e agora, presto mais atenção ao que posso transmitir através desse olhar, precisamente, para que eu recomece com meus medos, minhas hesitações, minha alegria ou minha tristeza

Já que estamos falando de linguagem corporal, quando Le Distrait, meu primeiro filme em 1970, foi lançado, expressando tudo isso em um estilo burlesco, fui convidado para uma festa. Havia cerca de 40 pessoas, e no fundo da sala, vi Jacques Tati. E ele, para mim, era… um homem verdadeiramente genial. Ele é uma das minhas três, quatro grandes referências – Chaplin, Keaton e então, Tati. Eu nunca, nunca me atrevi a ir até ele, apertar sua mão e, por incrível que pareça, foi ele quem veio até mim.

Então, eu acho, e até tenho certeza, que ele viu meu filme. Ele apertou minha mão e disse: o senhor é um grande ator, suas pernas falam por si. Ele estava numa posição privilegiada para me dizer isso, e minhas pernas ficaram vermelhas”.

3. Você sempre foi associado à comédia, mas aqui há uma delicadeza diferente. O que o atraiu especificamente nesse papel?

Não me senti atraído por nenhum papel que me ofereceram, já que eu mesmo o escrevi. É por isso que meu filme é tão profundamente pessoal, porque escolhi esse papel justamente por razões que provavelmente também vêm da minha família – somos grandes industriais – da qual obviamente me afastei por motivos… não tenho certeza absoluta de quais foram. De qualquer forma, eles não combinavam comigo. E também porque eu estava, e não me queixo, envolvido em um estilo de filmes de comédia que me tornou extraordinariamente popular. Mas aos poucos, com a idade, com o ganho de peso, com as rugas – na testa, no rosto… mas também ao redor do coração – comecei a me interessar por coisas mais sérias e profundas.

Fiz meu primeiro filme que se poderia chamar de dramático, e foi aí que desenvolvi o gosto por ele. É um filme georgiano que começa como uma comédia no primeiro terço e termina com um drama tão dramático para mim que eu morro sozinho em um telhado. Bem, eu… eu também desenvolvi um gosto pela tragédia. Trágico, não sei se é a palavra certa, mas certamente dramático. Trágico é um pouco forte. De qualquer forma, dramático.

Pierre Richard
Pierre Richard

Desenvolvi esse gosto como ator, quero dizer. E aos poucos, também me interessei por papéis mais longos e sérios. Fiz um filme com Xavier Beauvois que não é nada dramático, mas mesmo assim, eu estava à beira da morte. Atuei em filmes, como o filme de Damien Oudoule, que é um diretor incrível, uma espécie de Pialat marginal, que eu adorei, onde eu morro. E o problema não é se eu morro ou não. O problema é o porquê. O problema é: quais são os motivos? De qualquer forma, como comediante, como ator, também gostei de interpretar algo diferente de um jovem charmoso. 

Fiz um filme há alguns anos na Itália. Eu tinha o papel principal e não disse uma palavra. Esse é o meu sonho. Meu sonho. Não dizer uma palavra durante o filme cria uma cena totalmente dramática. E como eu adorei. Adorei poder mostrar também a minha sensibilidade, coisas que nunca mostrei no cinema. E, então, eu não disse uma palavra. Chama-se L’angelo Dei Muri (The Angel in the Wall, 2021)”. 

Festival de Cinema Francês do Brasil 2025
Festival de Cinema Francês do Brasil 2025

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Fanático por cinema e futebol, é formado em Comunicação Social/Jornalismo pela Universidade Feevale. Atua como editor e crítico do Papo de Cinema. Já colaborou com rádios, TVs e revistas como colunista/comentarista de assuntos relacionados à sétima arte e integrou diversos júris em festivais de cinema. Também é membro da ACCIRS: Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul e idealizador do Podcast Papo de Cinema. CONTATO: [email protected]

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