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Em termos de popularidade, é difícil encontrar algum comediante brasileiro que faça frente a Tom Cavalcante. Intérprete de tipos marcantes da televisão brasileira, como João Canabrava, figurinha carimbada nos áureos tempos da Escolinha do Professor Raimundo, e Ribamar, o porteiro do humorístico Sai de Baixo, ele, contudo, não havia dado o ar da graça na tela grande. Foi com Os Parças (2017), longa-metragem dirigido pelo cineasta Halder Gomes, que Tom fez, finalmente, sua estreia no cinema. No filme, ele interpreta Toinho, um locutor de porta de loja que logo cai de paraquedas numa tramoia aparentemente sem escapatória. Liderando um time de comediantes igualmente nordestinos, Tom parece ter agradado o público. O desempenho excepcional de Os Parças nas bilheterias atesta isso. Neste Papo de Cinema exclusivo, o humorista fala sobre os desafios de fazer o seu primeiro filme, bem como analisa as circunstâncias do sucesso comercial que, inclusive, já está lhe trazendo frutos. Bateu curiosidade? Então confira este bate-papo inédito e exclusivo com Tom Cavalcante.

 

Por que você demorou a fazer cinema?
Na época da Rede Globo, recebi alguns convites, mas particularmente não me apeteceu fazer cinema. Eu fazia muita televisão, apresentava programas. Tive convite para fazer o Ed Mort (1997), do Alain Fresnot, e o Guilherme Fontes me chamou para fazer Chatô: O Rei do Brasil (2015), mas realmente não deu. Nunca topei. Quando fui morar em Los Angeles, decidi produzir um filme, um curta-metragem com os norte-americanos. Inteirei-me do processo. Aí, senti que com essa galera de Os Parças dava para fazer um filme popular, que agradasse o povo. Isso para mim era muito importante. No cinema brasileiro há muitos filmes inteligentes, mas somos um país continental, onde nem todos têm acesso e, o que é pior, nem todo mundo se vê representado na telona. A periferia, o interior do Cerá, enfim, o pessoal fora do eixo Rio-São Paulo. Outra coisa. Há muitos atores interpretando papeis no humor. Agora, pegamos profissionais de humor para isso. Sem a pretensão de fazer um filme do (Francis Ford) Coppola (risos).

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Tirullipa, Whindersson Nunes, Tom e Bruno de Luca em “Os Parças”

Quais os principais desafios dessa estreia no cinema?
Primeiro, botar a cara e arriscar. Poderia dar errado, mas, ainda bem, está dando certo. De qualquer maneira, era um risco. Segundo, tecnicamente falando, foi entender a dureza que é fazer um filme. Acordávamos 4h30 da manhã para estar às 6h no set maquiando, “perseguindo o sol” para garantir a luz. Realmente é um trabalho muito braçal. Isso me deixou um pouco espantado, mesmo com quase 30 anos de carreira de televisão e espetáculos. O cinema é rígido. Mas, foi muito agradável, pois tudo foi bastante conversado. No próprio set encontrávamos o tom, afinávamos as piadas, esse tipo de coisa. Tínhamos liberdade de mexer no texto. Em se tratando da linha que foi tomada, com relação ao humor, tem ali a minha visão de 26 anos de estrada. Pensávamos que se é para provocar riso, tínhamos de mexer com certos clichês.

 

O Toinho é um homem simples, que representa essa vocação do brasileiro à malandragem, a sempre dar um jeito. Como foi construir esse personagem?
Na minha concepção desses tipos que faço há bastante tempo, o Toinho já estava na gaveta, um locutor de porta de loja. Com o transcorrer do processo, das leituras, dos ensaios, fomos encontrando o personagem, ajustando as coisas. O Toinho é atravessado por varias questões próprias de tipos. Portanto, temos o Toinho medroso, o chorão, o galenteador, e por aí vai. Foram muito importantes as várias conversas no set, com o Halder, para estruturar ele.

 

O Nordeste é um celeiro de cômicos. Mas, no que tange ao cinema, nem sempre a região está bem representada. Os Parças equilibra essa balança. Isso era algo importante para você?
Sim, era muito importante. Tínhamos de sinalizar com essa bandeira, de equilibrar a disputa. Pela primeira vez a gente aparece com um filme nordestino, de moldura nacional, claro, mas com um conteúdo de Nordeste. Por ser de lá, acho extremamente relevante isso. Nesse sentido, então, acredito que a gente fez um golaço, aqueceu o mercado e chamou a atenção das empresas e dos distribuidores. Do jeito que está indo, comercialmente falando, o filme pode ser tornar um case, porque o povo abraçou. 

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Como foi liderar esse time de garotos?
Eu, realmente, sou o mais antigo. Foi uma troca, porque eles também trazem coisas do comportamento deles. Mesmo assim, o melhor é que estávamos na mesma sintonia, todos conectados ao que o roteiro pedia. Existe uma máxima que diz: “o improviso é o caminho mais curto para o erro”. Improvisávamos, mas sempre atentos à unidade. Acredito que atingimos um percentual de 88% de boas risadas (risos). É uma nova experiência, reunir esse grupo com essa química na tela. Há alguns dias, fui de surpresa numa sessão em Fortaleza. O povo aplaudiu os trailers, ovacionou o filme no final. Até comentei isso com o Halder, que não eram apenas risadas, mas um êxtase de risadas. E isso é fruto da grande molecagem que o filme imprime. As pessoas gritavam na sessão (risos).

 

A que você atribui o sucesso de bilheteria de Os Parças?
O mundo evolui, as pessoas vão embarcando na modernidade, mas a essência do país, a identidade do Brasil, continua intacta. Vivemos um instante de polarização, de muita discussão política, ideológica, de coisas referentes a gênero. Somos bombardeados com notícias constantes de violência. Isso, de repente, cansa. As pessoas querem um subterfugio para rir. Felizmente, estamos encontrando. Quem promover um bom filme, ou mesmo uma serie de TV de gozação, de sacanagem, no bom sentido, vai ter esse retorno. Então, acredito que sociologicamente é isso, o espectador está precisando rir. Não temos compromisso com a “grande inteligência”, com um pensamento profundo. Fizemos um feijão com arroz gostoso. Numa analogia com o futebol, Os Parças um é jogo jogado com amor e alegria. 

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E podemos esperar mais Tom Cavalcante no cinema? Há projetos em vista?
Engraçado, pois nos últimos dias me mandaram dois roteiros. Uma para fazer uma história de Lampião, ambientado nessa época do cangaço, e o outro é um filme sobre o Luiz Severiano Ribeiro, no qual eu interpretaria o protagonista. Estou analisando. Aos olhos dos distribuidores, a performance da gente em Os Parças causa interesse. Tem, portanto, várias situações. Antes, eu já tinha três projetos em mãos. Um era Os Parças. Sobre os outros dois vou me reunir com o Halder para ver no que vai dar.

(Entrevista concedida por telefone em dezembro de 2017)

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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