Miguel Pesce Thiré nasceu no dia 08 de julho de 1982 na cidade do Rio de Janeiro, numa família em que sucesso é palavra de ordem. Neto da grande Tônia Carrero (Chega de Saudade, 2007) e filho de Cecil Thiré (Bela Noite Para Voar, 2009), Miguel estreou como ator no início dos anos 2000 em novelas da Rede Globo como Porto dos Milagres (2001) e O Quinto dos Infernos (2002). Nos últimos anos tem apostado mais no teatro – como na elogiada montagem de Os Altruístas, ao lado de Mariana Ximenes – e agora começa, aos poucos, a se dedicar ao cinema, uma das suas grandes paixões confessas. O filme que marca esse retorno é A memória que me contam, de Lúcia Murat, selecionado para a mostra competitiva do 45° Festival de Brasília. E foi durante sua passagem pela capital federal que o Papo de Cinema conversou com o ator, nesse bate papo inédito e exclusivo. Confira!

 

Sua primeira experiência no cinema foi em 2006 com Didi: O Caçador de Tesouros. O que mudou de lá pra cá?

É incrível, porque o desejo de fazer mais só aumenta com o passar do tempo. E foram 5 anos entre esse primeiro filme e o segundo, o A memória que me contam, que filmamos no ano passado e só agora ficou pronto. Então dá pra imaginar quão animado estou agora, que finalmente consegui voltar a fazer cinema, que sempre foi uma paixão.

 

Como foi a experiência em A memória que me contam?

Este foi um filme em que tive o prazer de participar desde o princípio. Com ele consegui ter um período de preparação muito bom, de quase três meses. Eu conheço a Lúcia (Murat, diretora) há anos, fui vizinho dela quando criança. Quando surgiu a oportunidade de um teste, ela me chamou de imediato. Fiz e acabei passando com o Patrick Sampaio, que é um grande amigo meu, nós trabalhamos juntos num mesmo coletivo de teatro. A nossa cumplicidade, o modo como a gente já se conhecia, que nos fez passar no teste. Foi um grande desafio, pois nós dois somos homens heterossexuais, além de grandes amigos.

 

Qual a principal orientação ao compor esse personagem?

Então, a gente foi atrás de muita sutileza. Eu e o Patrick formamos, no filme, um casal homossexual, mas eu não queria levantar nenhuma bandeira, nada muito explícito, exagerado. O fato deles serem gays não é o mais importante sobre eles. São apenas um casal bem resolvido, e pronto.

 

O que mais lhe chamou atenção nesse roteiro?

Achei esse personagem, desde o começo, muito interessante, porque ele vinha propor um olhar diferente nesse assunto. O filme fala muito de conflitos de gerações. Mais do que isso, do conflito de uma geração específica com o mundo de hoje. A memória que me contam começa quando uma dessas figuras, talvez a mais representativa daquele momento, está no hospital, morrendo. E esse grupo de amigos, que em 1968 foi muito engajado na luta armada, agora, estando em torno dos seus 60 e poucos anos de idade, enquanto veem essa amiga indo embora, seguem discutindo e redescobrindo os significados dessa referência, que de tão forte ainda ecoa.

 

Como é lidar na ficção com algo tão baseado na realidade?

Essa história é muito inspirada na vida da própria Lúcia, e muito do que vemos na tela aconteceu de fato. É claro, no entanto, que há outros tantos elementos que são fictícios, e essa mistura é que dá a liga. Como por exemplo, os filhos dessa geração, que formam outro ponto forte do filme. Como eles enxergam esse legado? E o Eduardo, o meu personagem, tem esse lugar. Ele vive uma relação homossexual estabelecida e muito tranquila, algo que naquela época não seria possível, seria bem menos provável. Outro ponto é a relação dele com a arte, ele é um artista plástico, e esse é o modo como encara o mundo hoje. Politicamente falando, ele se posiciona através da arte que faz. Não há mais um inimigo declarado para se ir às ruas protestar e pegar em armas, como fizeram os pais deles.

O que você achou da exibição de A memória que me contam aqui no Festival de Brasília e quais são as expectativas em relação ao público?

Fiquei bastante impressionado com a reação das pessoas que estavam no cinema. Eu mesmo não tinha a menor ideia se tinha gostado ou não, foi a primeira vez que via o filme, tava tudo borbulhando dentro de mim, o impacto foi muito forte. Foi muita informação ao mesmo tempo. As pessoas gostaram muito, vários espectadores vieram falar comigo sobre o trabalho, e isso me deixou muito feliz. Tiveram até aquelas que vieram me perguntar se sou gay mesmo, e diante a minha negativa ficaram de queixo caído. Isso aponta para algo que fizemos certo, acho, pois mostra que acertamos em não fazer nada panfletário. Foi uma coisa discreta, sensível, de um casal apaixonado. E é sobre isso o filme, sobre relações de afeto.

 

(Entrevista feita no dia 20 de setembro de 2012, em Brasília)

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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