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Cláudio Boeckel é um profissional tarimbado no âmbito audiovisual. Diretor de novelas e séries televisivas – como Gaby Estrella, veiculada no canal Gloob entre 2013 e 2015 – ele diz que sua maior disposição é contar histórias da melhor maneira possível. Na telinha, esteve à frente de projetos bastante distintos, como as novelas Kubanacan (2003) e A Força do Querer (2017). Na entrevista a seguir, Cláudio fala um pouco sobre os desafios de levar o conteúdo televisivo da série infantil aos cinemas, além de abordar as dificuldades e prazeres envolvidos no projeto. Como bem pode ser visto a seguir, Cláudio tem uma clara visão acerca do público-alvo de Gaby Estrella: O Filme, inclusive levando obviamente isso em consideração ao fazer escolhas que nem sempre dizem respeito, necessariamente, às suas vontades como criador, atendendo a contingências mercadológicas, de orçamento e de outras esferas intrínsecas ao fazer cinema. Sem mais delongas, confira mais este Papo de Cinema exclusivo.

 

Cláudio, você é um profissional com larga experiência televisiva. O que te fez assumir a dianteira de Gaby Estrella: O Filme, fora a vivência prévia como diretor geral da série?
Na verdade foi um caminho natural que a serie tomou. Como ela se encerrou, e a gente ainda tinha coisas a comunicar para o público, resolvemos fazer o filme. Aliás, é uma tendência de mercado, principalmente relacionada a programas da TV cabo, que muitas vezes acabam migrando para o cinema. A marca da série foi o trabalho que desenvolvemos ao longo do tempo. As crianças cresceram, mas sem deixar de ser crianças. Sempre primamos pelo entendimento disso, pelo sagrado desse ofício que envolve fazer uma série, uma novela ou um filme. Acredito que o grande mérito desse produto foi formar esses atores, não apenas como profissionais, mas torna-los melhores humanos, cidadãos. Isso independe do resultado de audiência ou bilheteria.

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Cena de “Kubanacan”, novela dirigida por Cláudio

Gaby Estrella: O Filme defende, de certa maneira, a inocência, um crescimento sem queimar etapas. Como você acredita que as crianças e pré-adolescentes de hoje receberão o seu filme?
Essa foi sempre a grande questão: contemplar o público da série, arrebatar a fatia que já a conhecia, sem abrir mão dos conceitos éticos e morais ligados a coisas primordiais, como amizade, para angariar mais espectadores. É uma incógnita para mim isso de como o filme vai ser recebido. Ele contempla também um público que não teve acesso à série, embora felizmente o programa, por reivindicação popular, tenha ganhado recentemente reprises. O filme é primordialmente infantil. Ele não é propriamente teen, se fosse para essa faixa etária os personagens poderiam soar até meio bobos. Mas, voltando, realmente não sei como, por exemplo, o público mais velho vai receber. Acredito que como recebia a série. Apesar dos personagens terem crescido, eles ainda trazem as questões de antes.

 

O seu filme se enquadra naquela categoria “para toda a família”. Depois dos Trapalhões, pouco se investiu nesse filão tão lucrativo outrora. A que atribui essa falta de interesse?
Tais produtos para toda a família foram realmente muito lucrativos. Esse desaparecimento é uma tendência meio geral. As emissoras de televisão aberta pararam de oferecer programações infantis, que migraram aos canais fechados. Pensando agora, talvez a legislação tenha influenciado isso, por conta da impossibilidade de inserção de merchandising direto. E tem o politicamente correto, claro. Hoje em dia Os Trapalhões nem seria exibido (risos). Mas acredito que a questão mercadológica é a que mais influencia. Sinto realmente a falta disso, também no teatro. Anos atrás a Bia Lessa ocupava esse espaço, mas isso também hoje desapareceu dos palcos. Não sei, acho uma pena. Nossa tentativa é, não sei se pretensiosamente, de resgate, de preencher uma lacuna. Talvez tenha ficado mais barato investir em jogos do que em obras. Uma pena, pois isso afeta, inclusive, a formação de plateias.

 

Senti falta de empregados na fazenda da avó da Gaby, entre outras coisas, ausências e presenças, que dizem respeito à verossimilhança, pura e simplesmente…
Na verdade, não foram bem escolhas. Isso vinha desde a série. Começou basicamente como contingente de produção, de falta “bala na agulha”. Na série tínhamos um orçamento bem restrito, e lá já me fazia falta os empregados. Você não tem noção das dificuldades que tivemos. Além de todas inerentes à produção de um filme, quando envolve criança, é mais complicado. O Ministério Público aparecia direto nas filmagens. O MP não vai às favelas para ver se as crianças estão estudando, mas quando se trata de trabalho como o nosso, eles ficam em cima. Não estou dizendo que a fiscalização não deveria existir, pelo contrário, mas que a atuação deveria ser ampla. As crianças só podem trabalhar até determinada hora, a pausa para intervalo é rígida. E dentro desse universo de viagens, locações, lida com bichos, enfim, toda sorte de problemas, vamos e convenhamos, isso também era algo complicado. Foi muito difícil erguer esse Boing, muito, muito. Vou te confessar que essa ausência não nos pareceu algo relevante, que maculasse a verossimilhança. Não sei, não nos parecia, mesmo. Em momento algum nos soou como uma questão relevante nesse sentido, que fosse tirar a credibilidade da história.

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Cena de “A Força do Querer”, novela dirigida por Cláudio

Você já conhecia bastante o universo da Gaby. Houve alguma preocupação de trazer novidades com esta versão cinematográfica das aventuras dela?
Apesar de ter preocupação de trazer coisas novas, embora não soubéssemos direito o caminho a transitar, meu maior desafio como criador sempre foi estar a serviço da obra e tentar faze-la com a maior verdade possível. Aliás, essa é sempre minha maior disposição. Nunca entro nos trabalhos levado pela vaidade, por uma vontade de estar à frente, de levantar qualquer bandeira. Quero contar a história da melhor maneira possível, comunicar aquilo que é proposto. Eu conhecia os atores, mas em contextos diferentes, e havia a entrada de novos intérpretes. Como equilibrar essa equação e vencer novos desafios?  Havia uma série de fatores logísticos, de prazos a cumprir, sem falar nas questões orçamentárias. Então, eu tinha uma responsabilidade de não deixar que isso maculasse a narrativa. A história já estava pronta, então não havia espaço para grandes inovações.

 (Entrevista concedida por telefone, direto do Rio de Janeiro, em janeiro de 2018)

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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