Crítica

Assisti em Lisboa no final de 2006 (!) este impressionante trabalho do diretor Michel Gondry, The Science of Sleep, que permanece inédito no Brasil (onde deverá se chamar Sonhando Acordado, enquanto que em Portugal foi batizado como A Ciência dos Sonhos). Primeiro trabalho deste realizador também como roteirista, este filme resulta numa obra inferior ao seu longa anterior, o oscarizado Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças (Melhor Roteiro para Charlie Kaufman), mas infinitamente superior a 90% do que estamos habituados a ver nos cinemas geralmente. Criativo, original e repleto de méritos, Sonhando Acordado é um verdadeiro deleite para quem procura algo extremamente diferente, porém longe de ser "cabeça", chato e hermético.

O cada vez melhor Gael Garcia Bernal (Babel) é o protagonista Stephane, um jovem mexicano que volta para Paris, convencido pela mãe (francesa), após a morte do pai (também mexicano). Acreditando que irá trabalhar como designer numa fábrica de calendários, ao chegar lá descobre que seu trabalho é muito mais burocrático do que imaginava. Cansado do tédio do cotidiano, ele cada vez encontra mais dificuldade de se desvencilhar do mundo que encontra ao dormir, interpretado por ele como uma Stephane TV. As coisas começam a mudar quando conhece sua vizinha de porta, Stephanie (a inglesa Charlotte Gainsbourg, vista também em 21 Gramas). A garota é a única que consegue lhe proporcionar tanto entretenimento e diversão como quando está dormindo. Porém uma incerteza lhe corrói: cada vez mais apaixonado por ela, não sabe se ela irá lhe corresponder estes sentimentos.

Com um elenco excepcional - que conta ainda com as presenças de Alain Chabat (Xuxu e Asterix e Obelix: Missão Cleópatra) e da mítica Miou-Miou (Uma Leitora Bem Particular) – Sonhando Acordado apresenta ao seu público um enredo fantástico, porém sem nunca subestimar a inteligência da audiência. Intercalando constantemente o que se passa na "vida real" e no "mundo dos sonhos", o filme consegue proporcionar momentos de extremo prazer crítico, além de nos oferecer opções visuais muito interessantes, como as soluções imaginativas das viagens oníricas dos protagonistas, como carros de papelão e água de celofane.

Com um custo baixíssimo – meros US$ 6 milhões – e filmado quase que inteiramente em estúdio (algumas poucas cenas revelam uma Paris longe dos olhos dos turistas – este é um legítimo 'filme de culto', que tem tudo para ser venerado por aqueles mais perspicazes, enquanto que os que se recusarem a abraçar esta incrível viagem estarão deixando passar uma das melhores experiências cinematográficas recentes.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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