Crítica

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Os corpos se misturam. O desejo é incontrolável. O prazer é a recompensa. Mas nem sempre o sexo é a resposta. Em O Animal Sonhado, filme coletivo realizado por seis cineastas cearenses, existe uma grande diferença entre o que se deseja e o que se alcança. Pode ser a ambição por um corpo perfeito, pode ser a espera por aquela transa fantástica, pode ser a cobiça doentia por uma jovem debutante, pode ser a pura e simples luxúria de um flerte em uma festa. Invariavelmente, o resultado final para estes sedentos personagens terá um gosto um tanto amargo, como se a realidade nunca chegasse aos pés da imaginação. São questionamentos bastante maduros para um time de jovens cineastas comandando este longa, uma bela e energética estreia.

O roteiro e a direção são assinados por Breno Baptista, Luciana Vieira, Rodrigo Fernandes, Samuel Brasileiro, Ticiana Augusto Lima e Victor Costa Lopes. Ainda que cada um deles seja responsável por um segmento diferente do longa, todos os realizadores participavam (em alguma capacidade) do trabalho dos demais, transformando o longa em um verdadeiro longa-metragem coletivo, não apenas uma junção de pequenas histórias. O filme possui forte teor sexual, mas nunca estas cenas aparecem como algo gratuito, sem propósito. Todas as sequências com nudez ou sexo estão ali como parte preponderante de cada segmento. Sem elas, O Animal Sonhado seria um trabalho incompleto, inconsistente.

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O espectador pode até tentar procurar alguma ligação entre as histórias do longa, mas elas na verdade foram construídas de forma estanque – ainda que os realizadores pareçam tentar borrar os cortes de uma para a outra, como se fossem a continuação da história anterior. Dentre os segmentos, acompanhamos dois meninos que se entregam a um desejo que parecia proibido; no segundo, dois amigos (um tímido, outro mais atirado) têm experiências bastante diferentes em uma festa em que entram praticamente de bicões; em outro, uma mulher preocupada com a sua forma se vê aos amassos com um marombado de sua academia; um pai sucumbe a um doentio desejo ao ver a imagem da filha no vídeo de sua festa de debutante; Ou um grupo de amigos em uma casa com piscina que se deixam levar pela vontade; E uma orgia que se dá sob o olhar fixo de uma figura estranha, quase sobrenatural.

Por acompanharmos histórias concebidas por um coletivo misto, com homens e mulheres no grupo, existe uma consciência interessante a respeito dos gêneros neste longa. Nenhum deles serve como objeto. Todos estão em busca de alguma vontade e a forma como os segmentos são construídos conversam muito bem com esta procura. Como destaque, o segmento da moça da academia é muito bem realizado por conseguir colocar de forma clara a dicotomia entre a expectativa e o resultado. A festa com os dois amigos e a forma como a história se desenvolve de formas diferentes para cada um é igualmente interessante. Também é digno de nota o segmento final, que beira um clima de ficção científica, ao apresentar uma figura misteriosa observando os movimentos de uma mulher um tanto perdida.

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As histórias têm poucos diálogos, mostrando que os diretores tinham muita confiança em poder contar suas tramas de forma visual, evitando falas expositivas ou supérfluas. Com bons atores, belas cenas de sexo e ótimo andamento, O Animal Sonhado se mostra um trabalho maiúsculo de um grupo jovem que tem tudo para alçar voos mais altos em um futuro muito próximo. E é mais um exemplo de como as ferramentas de financiamento coletivo estão ajudando a tirar projetos interessantes do papel. Parte do longa foi viabilizado através de crowdfunding, dando mais uma opção para cineastas conseguirem contar suas histórias. Quem cooperou para fazer com que O Animal Sonhado virasse realidade pode se sentir orgulhoso, pois o resultado final é mais do que satisfatório.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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