Crítica


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Sinopse

Um panorama das inúmeras dificuldades enfrentadas pela juventude negra da cidade de Bogotá. A capital colombiana ainda é um local conservador e dominado por uma elite branca com práticas opressoras.

Crítica

O cinema sul-americano cada vez mais tem conquistado destacado espaço no cenário internacional. A presença de obras de países como Chile, Venezuela e Paraguai está, aos poucos, deixando de ser uma exceção nos principais festivais ao redor do mundo para se confirmar em participações antecipadas e, em muitos casos, comemoradas. Um recente exemplo que está chegando com dois anos de atraso ao circuito nacional é o colombiano La Playa, um trabalho que se comunica fortemente com a produção brasileira e que não deverá encontrar dificuldades no processo de identificação com o espectador local, para o bem e para o mal que esta possibilidade possa significar.

O protagonista de La Playa é Tomás (Luis Carlos Guevara, uma revelação), um jovem perdido em uma das maiores cidades da Colômbia. Morador da periferia, o adolescente abandona a casa materna após uma discussão com o padrasto, que não aceita que Jairo (Andrés Murillo), viciado em drogas, os visite. O garoto decide ficar ao lado do irmão, revoltado contra a passividade da mãe, que prefere acatar as ordens do novo marido. Uma vez nas ruas, no entanto, Tomás logo se vê sozinho após o sumiço daquele que deveria ajudar – o sumiço se deve ao fato desse estar devendo aos traficantes. Sem saber ao certo o que fazer, encontra apoio no irmão mais velho, Chaco (Jamés Solís), um malandro com experiência em cuidar de si próprio e com um sonho: voltar ao norte, para as praias do mar caribenho, região que a família teve que abandonar anos atrás devido aos conflitos das guerrilhas armadas em disputa pela região.

Se o cenário da costa soa quase como um refúgio idílico e utópico, o que pega firme em La Playa é mesmo a cidade de pedra e violência. Tomás sabe que os irmãos estão tomando cada um suas decisões, e por mais que se esforce não conseguirá salvá-los, ou ao menos demovê-los de suas convicções. Ao mesmo tempo, começa lentamente a desenvolver um senso próprio de autoproteção, abrindo mão dos poucos caprichos e imaginando como se virar em meio àquela selva urbana. É curiosa a escolha pela atividade de cabelereiro, porém algo mais voltando ao design do que a um mero ato prático. Em um subúrbio tomado por rapazes afrodescendentes, o que os diferencia não é o tamanho do topete ou o comprimento na nuca, e sim os desenhos que podem ser vislumbrados através de um dedicado trabalho de máquinas de raspar e giletes. A arte é carregada na cabeça e exposta a todos, ainda que por poucos dias, deixando à mostra aspirações que não alcançam suas difíceis realidades.

Escolhido para representar a Colômbia na disputa por uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, La Playa acabou não sendo selecionado. Isso em nada diminui o impacto deste longa que encontra forte ressonância em títulos como Querô (2007) ou mesmo o badalado Cidade de Deus (2002), ainda que aqui o discurso seja muito mais íntimo e internalizado. As soluções simples e diretas reforçam o valor desta mensagem de luta e sobrevivência, e o bom trabalho do diretor Juan Andrés Arango Garcia, aqui estreando como cineasta, indica um potencial que deverá render bons e melhores frutos no futuro. O caminho, tanto para o realizador quando para seu personagem principal, acabou de ser traçado e está só no começo.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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