Crítica

Uma das cinematografias periféricas mais arrojadas da atualidade, a grega vem apresentando trabalhos de nomes como Yorgos Lanthimos (Dente Canino, 2009), Alexandros Avranas (Miss Violence, 2013) e Athina Rachel Tsangari (Attenberg, 2010). Esses diretores e suas produções ajudaram a tornar o cinema da república helênica um dos mais requisitados para integrar mostras e festivais ao redor do globo. Então, não é surpresa a seleção deste Depois do Amor, de Stergios Paschos, para o recente Festival de Locarno e a 40ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. O que surpreende, porém, é o fato de a produção ser fraca e desestruturada para o que se propõe.

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Nikos (Haris Fragoulis) é um músico falido, responsável pela casa de verão de um amigo. Recém-abandonado pela namorada, Sofia (Iro Bezou), ele decide tramar um plano que consiste em prendê-la na residência para confrontá-la e extrair os reais motivos do fora que levou. A premissa por si só já é digna de certa expectativa e, talvez, seja por essa razão que relação do espectador com o produto final se torne frustrante. Com um humor escrachado, Nikos fala diretamente à plateia e a produção adentra no metalinguístico, dando sinais de algo promissor. Ele interage com as câmeras e o operador de boom. É um vínculo que o diretor busca para tornar o espectador seu cúmplice nesse esquema que poderia beirar ao macabro, ao mesmo tempo em que reflete a ficcionalidade por trás da história. Contudo, em seguida, a produção desanda, com longuíssimos planos de debates entre os protagonistas, sem chegar a lugar algum, sem reviravoltas. Então, o promissor tom maquiavélico desaparece.

Com diálogos repetitivos e boçais que não elevam a narrativa, Paschos induz a recriação de uma relação que se deteriora, de uma incomunicabilidade nas interações humanas, mas não há carisma em seu roteiro, repleto de furos preenchidos por números musicais que não traduzem os personagens. Os momentos em que se ameaça criar um desenvolvimento palpável e verossímil, como na cena em que Nikos abre a porta para Sofia ir embora e ela decide não ir, logo se tornam raros. O improviso dos atores é desnecessário, e eles parecem constantemente despreparados. Reflexo disso é que o timing em cenas cômicas beira ao desastre, resultando em um show de histerismos e uma violência que inicia verbal e avança para o físico sem justificativas plausíveis, além do tom machista deplorável.

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A desestruturação da narrativa de Paschos é tamanha que a metalinguagem, um dos pouquíssimos pontos a se destacar positivamente na produção, é logo abandonada sem um fechamento. Existe uma tentativa, porém, durante certa cena de sexo no estúdio de som da residência. Iniciada por uma claquete, todavia se torna uma das mais longas e broxantes cenas de sexo já filmadas. Obviamente, a intenção do diretor é a de sensibilizar o espectador, mostrando como, muitas vezes, a comunicação num relacionamento se dá em círculos, semelhante a um jogo cínico, sem nunca chegar a lugares novos. Mas não há a necessidade de apresentar tal recorte de maneira tão enfadonha. Paschos podia aprender um pouco mais com seus compatriotas cineastas.

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é graduado em Cinema e Animação pela Universidade Federal de Pelotas (RS) e mestrando em Estudos de Arte pela Universidade do Porto, em Portugal.
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