Além do Homem

14 ANOS 92 minutos
Direção:
Título original: Além do Homem
Gênero: Drama
Ano: 2018
País de origem: Brasil

Crítica

4

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Sinopse

Alberto Luppo é um escritor brasileiro que mora em Paris há anos e desde então renega suas raízes tropicais. Quando um famoso antropólogo francês desaparece na cidade de Milho Verde, Minas Gerais, ele volta para sua terra natal e inicia uma investigação para descobrir o paradeiro do velho amigo. No entanto, durante a viagem, ele se encanta pela cultura brasileira, assim como suas terras e sua gente, algo até então impossível para ele.

Crítica

A presença da água é uma constante em Além do Homem, de Willy Biondani. Ela flui desde o início, com imagens que só serão compreendidas mais à frente, mas também está presente na cachoeira que remete a um órgão feminino, na chuva que nunca cai e é constantemente alertada por um dos personagens. Acima de tudo, surge como uma metáfora à condição do personagem principal, que vai fluindo pela narrativa em constante transformação, batendo em pedras, tropeçando no caminho, em busca de si, mesmo que o próprio não saiba que esta é sua verdadeira jornada. O filme estrelado por Sérgio Guizé é mais uma volta às raízes do Brasil, num encontro do folclore nacional à visão estereotipada de quem vem de fora. Uma produção que nem sempre acerta, mas tem uma linha constante a seguir.

O filme conta a história de Alberto Luppo (Guizé), escritor brasileiro que mora na França e recebe uma missão do sogro:voltar ao seu país natal numa missão antropológica que pode servir de base para seu primeiro livro, investigando o paradeiro do antropólogo francês Marcel Lefavre (Pierre Richard). A lenda diz que ele foi devorado por canibais. Mas será que é verdade? É no interior da cidade de Milho Verde, em Minas Gerais, que boa parte da trama se passa, e onde o protagonista encontra uma infinidade de personagens cartunescos que parecem terem saídos de contos folclóricos, seja o tagarela taxista Tião (Fabrício Boliveira) à misteriosa Bethânia (Débora Nascimento).

Não é à toa a escolha de Sérgio Guizé para interpretar Alberto Luppo. Além de já ter uma reconhecida carreira cinematográfica, o ator, hoje, é um dos queridinhos da teledramaturgia brasileira, tendo papéis importantes em novelas, minisséries e outros programas similares na televisão. Ou seja, um rosto que atrai público. Mais ainda: na trama, seu físico é o oposto ao da maioria. É o de um legítimo brasileiro com raízes europeias que dificilmente seria tratado como alguém que nasceu no sertão. É um guri de apartamento que tem vontade de explorar o mundo, mas quando isto acontece, percebe que há diversas dificuldades quando não tem ninguém para lhe socorrer ou a falta de dinheiro bate. Tanto os trajes do ator (como se fosse um escritor dos anos 1930) quanto sua performance ajudam a compor as camadas do personagem– ainda que pareça emular Selton Mello algumas vezes, tanto pela fala mansa quanto pelo tom rouco que decide empregar.

Na verdade, a própria resistência do personagem em vir ao Brasil após anos na França já é um indício e, claro, uma crítica, tanto ao próprio país quanto a cultura de que “na Europa tudo é melhor”. Não que seja algo difícil de acreditar, com tantos escândalos políticos, econômicos e sociais que assolam as terras brasilis. Porém, a produção de Willy Biondani vai além do óbvio nesse sentido. A profusão visual e narrativa com tantas referências culturais ao folclore do Norte-Nordeste brasileiro causam identificação e simpatia no público. Ainda mais com a belíssima fotografia, que explora a mais do que variada paleta de cores quentes e claras. É um convite para se sentir em casa. Mesmo que Luppo, o protagonista, fique receoso 99% do tempo.

Um dos aspectos mais prejudiciais do filme é seu clímax, que parece ficar na dúvida entre entregar uma resposta adequada à busca do escritor ou deixar um final em aberto. As duas últimas cenas parecem ter encontrado um meio termo que não é satisfatório para qualquer um dos lados, como se a produção necessitasse dar um fim redondinho para o público médio, mas sentisse a obrigação de se manter à história com questões subjetivas. Porém, mesmo esta derrapada não estraga a experiência da profusão de cores e personagens que ressaltam um Brasil multicultural, ainda que recheado de clichês. Ora, se são bem aproveitados, por que não utilizá-los? Além do Homem entrega cinema fantástico interessante e, acima de tudo, divertido, sem brincar com a inteligência do espectador. O que, em se tratando de comédias nacionais de maior alcance para o público, é um feito e tanto.

Matheus Bonez

é crítico de cinema, apresentador do Espaço Público Cinema exibido nas TVAL-RS e TVE e membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista e especialista em Cinema Expandido pela PUCRS.

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