Kirk Douglas é uma lenda viva do cinema. Prestes a completar um centenário de vida, seu legado para a história de Hollywood se traduz muito além de bons papeis e por ser pai de outro astro, Michael Douglas. Apesar de seu nome ecoar por anos e anos, sua trajetória foi subestimada por muito tempo. Apesar de contar com 92 títulos em sua filmografia, foi premiado apenas 25 vezes em quase 70 anos de carreira, tendo sido indicado em outras 23 ocasiões. Com inegáveis clássicos no currículo, foi lembrado no Oscar três vezes, mas nunca levou o ouro para casa. Recebeu um prêmio honorário da Academia em 1996, ano em que também figurou entre os cem maiores atores de todos os tempos numa pesquisa realizada pela revista Entertainment Weekly. Os anos de experiência e maturidade compensaram esta falta de atenção da indústria, tornando o filho de  imigrantes judeus-russos (nasceu como Issur Danielovitch Demsky) referência ao longo do tempo. Com tanta história em mãos, ficou até difícil para a equipe do Papo de Cinema escolher apenas cinco dos seus melhores trabalhos (e mais aquele que deve ser lembrado). Porém, fica aqui a nossa homenagem para este grande ator que completou mais um aniversário no dia 9 de dezembro. Confira!

 

 

51-kirk-douglas-papo-de-cinema-3O Invencível (Champion, 1949)
Kirk Douglas ainda era um ator buscando seu espaço entre os grandes nomes de Hollywood quando aceitou fazer o papel do protagonista deste longa de Mark Robson. Na pele de Midge, o astro chamou atenção por sua performance arrebatadora como o rapaz pobre que, após nocautear de forma amadora um lutador no ringue já no primeiro round, chama a atenção de empresário que querem torná-lo um astro do esporte. Seu grande desafio é enfrentar Johnny Dunne (John Daheim), consagrado campeão. Até isto acontecer, o roteiro permeia um caminho noir em que o personagem de Douglas precisa ldiar com a máfia dos ringues, casamento à beira do fracasso, amantes e afins. O foco da história não é apenas sua ascensão, mas também sua queda, que reflete ainda mais na interpretação do astro. Douglas desfila por diversas emoções de forma mais do que convincente, buscando uma atuação mais naturalista, o que foge um pouco do estereotipo da época, dando mais visibilidade a uma produção que poderia passar batida. Ainda bem, não foi o o que ocorreu. Com sua presença de tela, Douglas foi catapultado para astro de primeira, ainda mais com sua inédita indicação ao Oscar de Melhor Ator graças a esta produção. – por Matheus Bonez

 

51-kirk-douglas-papo-de-cinema-4A Montanha dos Sete Abutres (Ace in the Hole, 1951)
Acostumado a representar figuras heróicas e austeras, Kirk Douglas apresentou uma de suas atuações mais marcantes justamente na pele de um personagem que simboliza a antítese deste perfil.  Nesta obra-prima dirigida por Billy Wilder, Douglas interpreta Chuck Tatum, um inescrupuloso e decadente repórter que trabalha em um pequeno jornal de Albuquerque, Novo México. Quando descobre um mineiro preso em um antigo local indígena, Chuck vê a grande chance de reerguer sua carreira ao cobrir a história, utilizando os métodos mais escusos para transformar o pequeno caso em uma tragédia de interesse nacional. Com a habilidade habitual em transitar pelos mais diversos gêneros, Wilder realiza uma contundente crítica à falta de ética e ao sensacionalismo que impregna boa parte da imprensa, através de uma obra que, com o passar dos anos, tornou-se referência absoluta sobre o assunto. Encabeçando este conto moral, Kirk Douglas entrega uma performance intensa e magnética como Chuck, um homem cínico e manipulador, que aos poucos é corroído por sua consciência. Esta transformação gradual é transmitida por Douglas de maneira brilhante e com a mesma naturalidade com que profere as ferinas frases de efeito escritas por Wilder. Mais uma criação icônica para o vasto currículo do ator. – por Leonardo Ribeiro

 

Assim Estava Escrito (The Bad and the Beautiful, 1952)
Kirk Douglas interpreta Jonathan Shields, um tirânico produtor de cinema, nesta obra-prima dirigida por Vincent Minelli. Três profissionais com quem ele trabalhou discutem a possibilidade de ajuda-lo, já que atitudes contestáveis o levaram do topo à ruína, percurso que deflagra o funcionamento sórdido de um sistema que erige ao firmamento e rapidamente descarta. O diretor, o roteirista e a atriz têm em comum o atual sucesso, possibilitado, em grande parte, pela ajuda do personagem de Douglas, mas também um histórico de mágoas provocadas por esse homem que, no auge das divergências com um colaborador, por exemplo, toma para si a tarefa de dirigir ele próprio determinada produção, fracassada mais adiante justamente por falta de uma visão artística. Kirk Douglas carrega no semblante a ambição desmedida, a determinação inabalável e a disposição de Shields para transpor limites, inclusive éticos, desde que haja êxito, sobretudo de bilheterias. Em meio às piadas internas e referências mais ou menos explícitas a personalidades da Hollywood real, Minelli cria um filme cuja complexidade reside na abordagem multifacetada de um universo repleto de meandros e singularidades. A interpretação de Douglas, uma das maiores de sua carreira, senão a maior, é essencial a esse êxito. – por Marcelo Müller

 

51-kirk-douglas-papo-de-cinema-6Sede de Viver (Lust for Life, 1956)
Kirk Douglas talvez seja um dos atores mais subestimados de Hollywood. Enquanto que o filho Michael ganhou seu primeiro Oscar com apenas 32 anos, o pai somou em quase 100 anos de vida apenas três indicações e uma estatueta honorária, que lhe foi entregue ao completar meio século de carreira. E das poucas vezes em que foi lembrado, nenhuma parecia mais óbvia – e cujo resultado foi mais injusto – do que nessa cinebiografia do brilhante pintor Vincent van Gogh. No papel principal, Douglas dá um show de energia e versatilidade ao compor um personagem de alma torturada e genialidade à flor da pele. A obsessão pela pintura, os indícios de uma possível doença mental, as relações conturbadas que estabeleceu durante sua vida e o ocaso de suas tentativas de se impor enquanto artista – van Gogh só foi ser reconhecido muito tempo após de sua morte – fazem parte deste painel detalhado que o astro assume com intensidade, entregando um trabalho à altura do homenageado. Por este desempenho, foi premiado no Globo de Ouro e pelos críticos de Nova Iorque. Já o Oscar, preferiu aclamar o russo Yul Brynner como protagonista do musical O Rei e Eu (1956). Contradições que ninguém explica. Apenas lamenta. – por

 

51-kirk-douglas-papo-de-cinema-7Spartacus (1960)
Spartacus pode não ter indicado Kirk Douglas a prêmios por sua firme atuação no papel do personagem-título, mas não há dúvidas do quão marcante o filme veio a se estabelecer. Contando a história do escravo que tomou a frente de uma grande rebelião contra os poderosos líderes da República Romana, o filme dirigido pelo gênio Stanley Kubrick impressiona em todos os sentidos, e não à toa é reconhecido como um dos maiores épicos da história do cinema americano. Com sua persona cheia de energia e grande presença em cena, detalhes que ajudaram a fazer dele um ator tão admirável, Douglas faz de Spartacus um homem forte e determinado, sendo difícil tirar o olho da tela diante de seu trabalho, algo que ocorre com frequência em sua filmografia. Mas além de brilhar na frente das câmeras, Douglas ainda teve um papel fundamental por trás delas. Como produtor do filme, o ator pôs a própria carreira em risco ao creditar Dalton Trumbo, que na época estava na lista negra por ser comunista, como responsável pelo roteiro do filme. Com isso, Douglas ajudou a acabar com a lista, cuja existência rendeu um dos períodos mais duros da indústria. – por Thomás Boeira

 

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51-kirk-douglas-papo-de-cinema-8Glória Feita de Sangue (Paths of Glory, 1957)
Ainda que a parceria mais lembrada e festejada entre Stanley Kubrick e Kirk Douglas seja Spartacus (1960), é essencial lembrar o primeiro trabalho em que o diretor e o ator dividiram o mesmo set. Em Glória Feita de Sangue, Douglas vive o coronel francês Dax que, durante a Primeira Grande Guerra, comandou um pelotão em missão impossível contra alemães. Alguns de seus soldados são trucidados. Outros, se negam a entrar na batalha. Ao saber disso, os obtusos comandantes do exército abrem um julgamento completamente injusto para punir alguns destes homens, tentando dar exemplo para os demais. Dax tenta a todo custo ajudar, mas se vê amarrado pela vontade de seus superiores. Kubrick faz um tratado contra a guerra neste longa-metragem, mostrando o quão pouco glorioso pode ser o resultado final de um conflito bélico como este. Encontrando um ator à altura para o cargo, o cineasta deixa nas mãos de Douglas a tarefa de servir quase como um membro da plateia. Ele se vê tão impotente quanto os espectadores que, por sua vez, dividem com o coronel o tenebroso gosto da injustiça. Uma produção imperdível, com roteiro bem amarrado e atuações inesquecíveis, indicado ao Bafta de Melhor Filme Americano. – por Rodrigo de Oliveira

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