A quinta-feira começou com uma programação intensa no 46° Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. Oficina de Roteiro e Festivalzinho pela manhã, debates com as equipes dos filmes exibidos na noite anterior e um seminário sobre “A Inserção das Cinematografias Regionais” movimentaram os presentes durante o dia. Nos debates, o momento mais curioso foi quando a equipe em peso do filme Os Pobres Diabos compareceu – apesar do longa não ter sido exibido na íntegra, com sua projeção interrompida devido à problemas técnicos. Mesmo assim, como o diretor Rosemberg Cariry definiu, essa foi uma importante demonstração de apoio de sua equipe, composta por “apaixonados pelo que fazem”. E ao invés de serem discutidos elementos da obra, o encontro resultou em uma coletiva de imprensa, todos muito interessados em trocar ideias.

Debates dos filmes apresentados na noite anterior / Foto Junior Aragao

Às 14h30 teve início a primeira sessão da Mostra Brasília, com a exibição de produções realizadas aqui no Distrito Federal. Cinco títulos foram apresentados: A Roza, de Marieta Cazarré e Juliana Cazarré; Ballet, de Octávio Mendes e Eduardo Gomes; Mina da Liberdade, de Chico Furtado; Desdobráveis, de Marcelo Diaz; e T-Bone Açougue Cultural, de Alisson Machado. A mostra completa abrange 18 curtas e 4 longas, sendo que um dos longas também será exibido na mostra competitiva nacional. O volume é impressionante, e representa bem o fervor cultural da região e o interesse dos profissionais locais em produzirem cada vez mais, e com maior qualidade.

Equipe do curta O Canto da Lona / Foto Junior Aragao

À noite, mais 3 curtas – documentário, animação e ficção – e 2 longas – documentário e ficção. O Canto da Lona, de Thiago Brandimarte Mendonça, vem de São Paulo para fazer um belo e poético registro de antigos artistas circenses. A temática lembra um pouco a do longa Os Pobres Diabos, porém com uma pegada documental. Com uma delicada fotografia em preto e branco, peca no entanto pela extensa duração – 25 minutos é demais para um retrato que poderia ter sido feito na metade deste tempo. Mas com personagens curiosos e histórias nostálgicas interessantes, arrancou fortes aplausos do público presente.

Equipe da animação RYB / Foto Junior Aragao

O desenho animado RYB, de Deco Filho e Felipe Benévolo, é o representante local na disputa nacional. Com apenas quatro minutos, impressiona pela técnica em 3D com a qual foi realizado – ainda que não tenha sido exibido neste formato. O título é uma brincadeira com as cores primárias – Red (vermelho), Yellow (amarelo) e Blue (azul) – e revela o que acontece com uma experiência mal sucedida em um laboratório genético, quando uma perereca verde se multiplica em irmãos gêmeos coloridos e muito arteiros. A jogada é rápida, e válida pelo bom argumento.

Diretores do curta Lição de Esqui / Foto Junior Aragao

O segundo curta de ficção foi Lição de Esqui, de Leonardo Mouramateus e Samuel Brasileiro. Vindos do Ceará, os realizadores, ao apresentarem o filme, afirmaram: “somos dois jovens que fizeram um filme sobre dois jovens”. Pois bem, essa inexperiência é revelada na tela. Apesar das boas interpretações, a história de dois amigos que resolvem causar um acidente no trabalho para que um deles seja demitido e possa, enfim, receber o seguro-desemprego e partir para uma sonhada viagem, peca pela longa duração – problema recorrente na atual produção de curtas-metragens nacionais – e pelos excessos narrativos. Ainda assim, tem bons momentos.

Equipe do documentário O Mestre e o Divino / Foto Junior Aragao

Os dois longas apresentados neste terceiro dia de atividades tiveram em comum o fato de cativarem a plateia mais pelos personagens que apresentam do que pelos enredos defendidos. O Mestre e o Divino, de Tiago Campos, é um documentário pernambucano sobre dois inusitados cineastas que se encontraram na região de Sangradouro, Mato Grosso: Adalbert Heide, um excêntrico missionário alemão que ali está desde os anos 1950, e Divino Tserewahú, jovem realizador xavante. O filme não tem muito o que apresentar – nem mesmo refletir – sobre essa turbulenta parceria, mas os tipos são convincentes e interessantes a ponto de envolverem o espectador durante os quase 90 minutos de projeção. Depois da Chuva, longa de ficção dos baianos Marília Hughes e Claudio Marques, por sua vez, mostra não só personagens muito bem construídos, como uma trama relevante sobre estudantes adolescentes em 1984, período do fim da ditadura no nosso país e início de um processo de conquista das liberdades individuais. O resultado final pode ter esbarrado em alguns clichês, mas o todo empolga. Ambos os títulos são carregados de referências cinematográficas, um prazer extra aos cinéfilos presentes.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
avatar

Últimos artigos deRobledo Milani (Ver Tudo)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *