Crítica

No início dos anos 1970, numa noite fria em Detroit, dois produtores musicais descobriram Sixto Rodriguez em um pequeno bar, no porto da cidade. Reconhecidos por trabalharem com nomes do porte de Stevie Wonder e Marvin Gaye, eles se comoveram com o talento do músico e o compararam imediatamente a Bob Dylan. Depois de dois álbuns com composições singulares produzidos pela dupla e um fracasso retumbante, Rodriguez desapareceu. Procurando Sugar Man (2012) apresenta a extraordinária busca a um dos mais injustiçados artistas de todos os tempos.

Alguns pensavam que Rodriguez havia se tornado um andarilho drogado. Outros, um operário falido que garimpava pequenos trabalhos para sobreviver. Existiam até mesmo suposições de que o cantor havia se suicidado no palco após um show mal sucedido, atirando em sua cabeça ou, numa versão mais drástica, ateando fogo em si próprio. Suas músicas retratavam a dura realidade da classe operária, seus sonhos e saudosismos, e indicavam a personalidade do cantor, oculta atrás dos impenetráveis e recorrentes óculos escuros que ele usava.

No documentário do sueco Malik Bendjelloul, a incrível trajetória de Rodriguez é esmiuçada brilhantemente em narrativa que, caso fosse abordada numa ficção, facilmente seria acusada como inverossímil. Numa estrutura inteligente, Bendjelloul constrói seu filme apoiado em muitos mistérios que mitificaram a figura de Rodriguez. A cada música apresentada – muitas vezes apoiada por sequências belíssimas e melancólicas – pode-se conhecer mais sobre o cantor, que possui um repertório fascinante.

Os realizadores viajaram de Cape Town, na África do Sul, para Detroit e Los Angeles, reunindo partes do quebra-cabeça da vida de Rodriguez. O grande mérito do filme, além de despertar o interesse para a vida e obra do excelente músico, é demonstrar como um artista pode alterar, influenciar e impactar a vida de seus espectadores. Feliz na escolha de seu tema e objeto de estudo, Bendjelloul teve seu esforço reconhecido com inúmeros prêmios, entre eles os da audiência e júri no Festival de Sundance e o Oscar de melhor documentário. Para alguém que no processo de gravação ficou sem película em 8mm e teve que utilizar um aplicativo de iPhone para simular a estética, eis um grande feito.

No clímax de Procurando Sugar Man, é um registro de arquivo que revela um fechamento redentor para a curiosa história de Sixto Rodriguez. Ao subir dos créditos, pode-se constatar que sua vida não foi das mais felizes ou fáceis, porém o músico finalmente ganha o reconhecimento merecido por conta deste documentário e, ainda mais, pelas pessoas que não o deixaram desaparecer.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Graduado em Publicidade e Propaganda, coordena a Unidade de Cinema e Vídeo de Caxias do Sul, programa a Sala de Cinema Ulysses Geremia e integra a Comissão de Cinema e Vídeo do Financiarte.
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