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Sinopse
Para Vigo Me Voy mergulha na obra de Carlos Diegues, cineasta que retratou a história e o espírito do Brasil desde 1961. O longa navega entre os filmes dele e sua trajetória pessoal. Trechos das obras são intercalados com entrevistas do diretor ao longo de 60 anos. Documentário.
Crítica
Poucos meses após sua partida, Cacá Diegues surge em Para Vigo Me Voy! quase como quem deixa um recado final. Na construção do cinema brasileiro, muito do alicerce foi erguido por ele – seja pela força de suas obras, seja pela insistência em provocar mudanças de rumo, mesmo quando acusado, em certos momentos, de se acomodar ao contrário. O documentário se vale de vasto material de arquivo para dar corpo a esse mosaico, alternando a voz de outras figuras conhecidas com imagens que revelam a inquieta trajetória de um criador. Ainda que nem sempre alcance clareza na maneira de traduzir tamanha riqueza, cumpre a missão de celebrar a multiplicidade de um artista decisivo.
A opção de entregar a narrativa, em grande medida, ao próprio Cacá é o que confere ao filme um tom íntimo. É ele quem conduz a memória, já fragilizado pela saúde, revisitando décadas de disputas em festivais, bastidores de filmagens, matérias televisivas e encontros pessoais. Nesse emaranhado de lembranças, as novas gerações encontram ferramentas preciosas de pesquisa, enquanto os mais velhos reconhecem passagens marcantes da vida do realizador de Xica da Silva (1976) e Bye Bye Brasil (1979), parceiro e contemporâneo de Glauber Rocha, Leon Hirszman e Joaquim Pedro de Andrade.
A homenagem comovente, porém, também desperta algum desconforto, é preciso dizer. É doloroso vê-lo diante da câmera, em tantos trechos, com dificuldades de expressão. A melancolia dessas passagens contrasta com a vitalidade de sua filmografia, lembrando o espectador de que nem sempre a força da obra encontra correspondência no estado físico do artista. Apesar disso, a imponência do legado e a densidade histórica do material garantem momentos de genuína reverência.
Alguns também poderão lamentar a ausência de abordagem mais incisiva sobre episódios controversos, como o embate com as patrulhas ideológicas, quando Diegues rompeu com expectativas da esquerda ortodoxa ao não seguir algumas cartilhas estéticas e políticas. Mas tais lacunas pouco diminuem a grandeza do retratado. Estamos diante de alguém que ousou pensar o cinema brasileiro de forma plural, que transbordou fronteiras e acreditou que a cultura poderia ser universal sem perder o sotaque. Para Vigo Me Voy! talvez não seja o retrato definitivo de Cacá, mas funciona como despedida generosa: um tributo ao mestre que se recusou a fazer o simples e, por isso mesmo, ajudou a reinventar a arte no país.
Filme visto durante o Cine Ceará 2025.
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