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Sinopse

André é um jovem que trabalha na fotocopiadora de uma papelaria. Num dia se apaixona por Sílvia, uma vizinha, a qual passa a observar com os binóculos em seu quarto. Decidido a conhecê-la melhor, descobre que ela trabalha em uma loja de roupas e, para conseguir uma aproximação, tenta de todas as formas conseguir 38 reais para comprar um suposto presente para a mãe.

Crítica

O cinema no Rio Grande do Sul tem uma história bastante longa: as primeiras projeções têm registro do início do século passado. Poucos anos depois, na década de 1920, a região passou da vanguarda na exibição para apresentar seu realizadores pioneiros: foi nessa época que foi feito o primeiro curta-metragem gaúcho, Os Óculos do Vovô, na região de Pelotas – e trechos desse filme, que se encontram preservados até hoje, representam o registro mais antigo de uma obra cinematográfica feita no Brasil. De lá pra cá, muito foi produzido, mostrado e, principalmente, discutido. Períodos como o ciclo Teixeirinha, o advento do Festival de Gramado e o Clube do Cinema de Porto Alegre são alguns dos episódios altos dessa trajetória. Mas talvez o melhor longa-metragem de todo esse percurso tenha sido produzido somente após a virada do século. E ele se chama O Homem de Copiava, segundo trabalho na direção de Jorge Furtado.

Este, no entanto, não é o primeiro longa realizado no estado. Este título talvez sirva melhor a Vento Norte (1951), de Salomão Scliar, que há décadas está aí para mostrar a excelência local. Mas O Homem que Copiava é um diferencial na produção regional do país, um produto com cara e perfil gaúcho, mas que se comunica perfeitamente com os mais diversos tipos de interlocutores, esteja eles no interior, noutra região ou até fora do país. Sua mensagem é universal, e o modo como é contada possui impede que sua força se dissipe pela competência de seus realizadores. É um resultado singular, que deve e merece ser conferido com cuidado.

Sua trama, curiosamente – e talvez por isso mesmo – é bastante simples. O Homem que Copiava trata do dilema vivido por André, que ganha vida na expressão multifacetada de Lázaro Ramos – um dos melhores intérpretes de sua geração– um operador de fotocopiadora que, apaixonado por uma vizinha (Leandra Leal, igualmente excelente), resolve falsificar uma nota de R$ 50,00 para impressioná-la com o dinheiro. Logo o que era apenas uma falsificação vira um negócio, dois outros amigos se envolvem (Luana Piovani, roubando a cena a cada aparição, e Pedro Cardoso, mostrando mais uma vez o que sabe – bem – fazer), e os riscos se multiplicam, assim como as chances de recompensas.

O mais notável é perceber como uma mistura diversa de filmes e estilos tão distintos, que vão desde comédias juvenis pastelões à clássicos de Hitchcock, pode ter resultado numa obra tão eficiente. O Homem que Copiava é original desde sua raiz, uma invenção notável que deve todos os seus méritos a uma equipe talentosíssima, coordenada com sabedoria pela mão de Furtado, um dos grandes cineastas brasileiros. A produção da Casa de Cinema de Porto Alegre, responsável por títulos bastante interessantes, é competentíssima, e o saldo final apresentado ao espectador é muito superior ao que se está habituado a conferir hoje em dia.

Lidando com temáticas complicadas e polêmicas como honestidade, preconceito racial, abuso sexual e crimes de diversas formas, o diretor consegue, entretanto, com O Homem que Copiava, se abster – e conseqüentemente, a nós também – de julgar seus personagens, tornado-os não simpáticos aos seus atos, mas sim auxiliando-nos a compreendê-los em suas razões. Ao livrar sua obra de um julgamento moral mais severo, evita um reducionismo indesejado e inadequado em relação ao valor artístico alcançado. Este filme é um marco, porém não isento de percalços. Apresenta alguns problemas, principalmente na sua metade inicial, com uma narração exagerada e obsessiva. Mas a despeito disso, consegue ser memorável, pois mostra que o principal ingrediente de um trabalho competente é um roteiro inteligente e que não subestima a inteligência da audiência. Em O Homem que Copiava, no entanto, esse é apenas mais um dos seus méritos.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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