O Esquema Fenício

Crítica


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Sinopse

Em O Esquema Fenício, o magnata Zsa-zsa Korda sofre mais um acidente aéreo, mas logo se recupera. Ao voltar para casa, ele decide nomear sua filha, uma freira, como única herdeira de sua fortuna. Os dois então embarcam na consolidação de um novo empreendimento, que se torna alvo de espionagem industrial, intrigas, ataques terroristas e assassinos. Comédia/Crime/Espionagem.

Crítica

Wes Anderson chega ao seu décimo segundo longa-metragem (o décimo live action, se deixadas de lado as duas animações) cada vez mais imerso no seu modo muito particular de ver o mundo. O Esquema Fenício é aquele tipo de filme que todo fã do cineasta anseia por ver e rever inúmeras vezes, na mesma proporção em que será desprezado e debatido por aqueles incapazes de reconhecer nele qualquer resquício de genialidade. Basta o primeiro frame tomar a tela para que o espectador iniciado reconheça estar diante de mais uma obra assinada pelo diretor. A simetria almejada de forma quase obsessiva, os figurinos detalhados, os tons pasteis, os cenários que revelam sutilezas em cada detalhe, a trilha sonora pontuando cada movimento e também eventuais segundas intenções dos personagens e, acima de tudo, um elenco afinado, independente do tempo em tela que cada um tenha a seu dispor. Tudo isso funcionando em sintonia com uma história original, repleta de reviravoltas e surpresas. Para alguns, apenas meandros de um esteta com nada melhor para fazer. Aos demais, felizmente, eis o início de uma experiência singular e acolhedora.

Há de se destacar o domínio de cena de Benicio Del Toro. Após marcar presença em A Crônica Francesa (2021), o ator vencedor do Oscar por Traffic: Ninguém Sai Limpo (2000) volta a trabalhar sob o comando de Anderson, mas dessa vez como protagonista. Por meio de olhares enviesados e palavras mais sabotadas do que de fato ditas, surge como o enigmático Zsa-Zsa Korda, um empresário milionário com muitos inimigos e a incrível habilidade de sair ileso a cada ataques destes oponentes contra sua vida. Porém, é chegado o momento de pensar no futuro, e mesmo indo contra as probabilidades, sua insistência em se manter vivo pode um dia fraquejar. É preciso, portanto, preparar quem deverá seguir seus passos. E, apesar dos nove filhos homens que possui – a maioria adotada – sua escolha recai sobre Liesl, a primogênita. Interpretada por Mia Threapleton – filha de Kate Winslet, em seu primeiro papel de maior destaque – ela é a voz da razão em meio ao caos sempre eminente. Decidida a se tornar freira, se vê obrigada a rever seus planos e partir ao lado do pai em uma jornada que visa por em funcionamento o tal esquema fenício, seja lá o que isso significa.

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Assim como em Viagem a Darjeeling (2007), Anderson se ocupa de colocar sua trama na estrada, em um formato bastante episódico, quase como num road movie insuspeito. Do encontro com os dois irmãos (Tom Hanks e Bryan Cranston, brilhantes) à negociação com um príncipe herdeiro (Riz Ahmed, chegando agora à trupe em um encaixe preciso), cada um destes momentos soa preparativos para o grande embate com o irmão de Korda, Nubar (Benedict Cumberbatch, quase irreconhecível). Enquanto assuntos terrenos vão se desenvolvendo em meio a um acerto matemático cada vez mais frágil e de difícil concepção, há de se observar os méritos de uma existência improvável em debate num contexto mais celestial – ou mesmo antagônico. Num juízo final comandado por ninguém menos do que Bill Murray, o que o profeta teria a dizer frente àquele disposto a contradizer qualquer expectativa?

Permitir-se ser permeado pelo cinema de Wes Anderson é como estar em um encontro de velhos amigos da faculdade anos – ou mesmo décadas – após terem deixado de estudar juntos. Para os que estão há tanto tempo sem se ver, a oportunidade de estarem mais uma vez lado a lado é preciosa, e apenas a menção de velhas histórias é mais do que suficiente para boas e saudosas recordações. Para os que estão ao redor, meros curiosos ou acompanhantes de ocasião, tal experiência, no entanto, pode ser excruciante. O Esquema Fenício representa um mergulho ainda mais radical do realizador dentro desse seu universo próprio e indissociável de sua persona. Feito para o deleite dos predispostos, ao mesmo tempo em que deverá servir como motivo de angústia para os que neste âmbito não forem capazes de nele adentrar.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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