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Sinopse
A Menina Sem Mãos: Em tempos difíceis, um moleiro vende a filha ao demônio. Protegida por sua pureza, ela consegue escapar, mas perde as mãos. Fugindo da família, ela encontra a deusa da água, um jardineiro gentil e um príncipe em seu castelo. Uma longa jornada em direção à luz. Animação/Drama/Fantasia.
Crítica
Baseada num conto dos irmãos Grimm, A Menina Sem Mãos é uma belíssima animação minimalista francesa, que se apresenta como uma narrativa fantasiosa, natural ao gênero. Na história, um moleiro do interior da França vive na miséria com a esposa e a filha. Então, um demônio aparece, oferecendo a ele transformar o riacho próximo à sua casa num córrego de ouro, com o qual poderia ter maiores luxos e riquezas. Em troca, o moleiro acaba ofertando a única macieira presente no local, onde sua filha costuma passar os dias. Sem saber, ele troca a pureza da filha por toda essa riqueza. Porém, quando a menina se recusa a ser sacrificada num ritual, o demônio decide cortar suas mãos como aviso, além de prometer retornar.
Com uma trama claramente adulta e dividida em três atos clássicos, este filme de Sébastien Laudenbach traz uma temática forte relativa à violência e aos abusos cometidos contra as mulheres, conseguindo ser um reflexo de uma sociedade que até hoje sacrifica o feminino por um bem considerado maior, em meio a um patriarcado e uma fortuna cega, sem levar em consideração individualidades e opiniões. Um dos resultados mais interessantes que Laudenbach alcança aqui é a construção da garota, que está longe de ser submissa. Autossuficiente e esforçada, ela se adapta aos infortúnios, a um ambiente familiar tempestuoso, e sai desbravando as florestas como forma de sobreviver e de se afastar de quem já não quer o seu bem estar.
A direção de arte encanta com suas cores fauvistas, com traços e borrões que lembram pinturas de pergaminhos chineses e, em alguns momentos, caminha por uma estética abstrata. O filme é desenvolvido com delicadeza e tom artístico alusivos a determinadas técnicas manuais que contrastam com sua pesada narrativa. As oscilações dos desenhos que somem e reaparecem deflagram uma iluminação e composição que pouco se assiste nas animações mais tradicionais. Junto de uma edição que preza pela agilidade, é também econômico em diálogos ou explicações. Sua objetividade resulta numa clareza exemplar.
Contando com a voz de Anaïs Demoustier, atriz francesa que é sensação internacional no momento, como a jovem protagonista, Laudenbach faz uma das mais impactantes, mas também delicadas e atuais adaptações de contos dos Grimm, que ganha uma abordagem ultra feminista em seu terceiro e último ato. Ao percorrer os clichês das fábulas, acabamos surpreendidos por um final que se distancia da estética Disney e se aproxima de produtos maduros e muito bem resolvidos, principalmente por questões de empoderamento. Não seria surpresa encontrar esta produção em listas de premiações como o Annie Awards, o Oscar das animações, e também na próxima temporada de prêmios norte-americanos. Afinal, A Menina Sem Mãos é uma preciosidade entre as animações atuais.
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