Crítica

Desconsiderando os constantes personagens em seus próprios filmes e a participação não creditada em Paris-Manhattan (2012), Woody Allen não protagonizava um longa-metragem desde Juntando os Pedaços (2000). John Turturro, por sua vez, assinou sua última obra de ficção, Romance e Cigarros (2005), há quase oito anos. Da parceria criativa desta inusitada dupla surgiu Amante a Domicílio, comédia despretensiosa escrita e dirigida por Turturro e estrelada pelo mesmo ao lado do neurótico habitual de Allen e sua hilária visão do mundo.

O ítalo-americano vive Fioravante, introspectivo florista de Nova York que faz pequenos trabalhos como encanador e adoraria ter uma fonte de renda extra. Murray, personagem de Allen, sugere que o amigo pode prestar serviços mais íntimos para sua dermatologista e arrecadar uma bela quantia. Como Don Juan improvisado, Fioravante conquista clientes fieis com a ajuda de Murray, que passa a oferecer os serviços do amigo para mulheres solitárias e se transforma num improvável cafetão.

Fioravante é um homem cortês e sereno, que conquista sua clientela justamente por ocultar este interior delicado em seu biótipo truculento. Murray, que ainda sofre pelo fechamento inevitável de sua livraria, encoraja o amigo nas incursões eróticas com argumentos inquestionáveis e ainda conquista mulheres deslumbrantes para facilitar o serviço. Sharon Stone e Sofía Vergara são as que mais pedem pela suspensão da descrença do espectador: suas personagens não apenas contratam Fioravante, mas o fazem pela intenção de realizar um ménage à trois.

Apesar do apelo sexual constante, Amante a Domicílio se transforma numa comédia romântica agridoce em pouco tempo. O coração do filme está na relação de Fioravante com Avigal, judia solitária interpretada por Vanessa Paradis que se torna sua companhia frequente – ainda que os encontros de ambos sejam pautados na inocência e poesia. Quando a participação de Liev Schreiber na trama se torna mais constante, como o judeu ortodoxo que patrulha o bairro de Avigal, as consequências dos atos do gigolô e de seu cafetão são resolvidas num julgamento judaico que rende os melhores diálogos do filme.

Amante a Domicílio demonstra a maturidade e confiança de John Turturro como diretor. Ainda que seja excessivamente convencional e pouco ousado pelo tema que aborda, o filme se encaminha para soluções não muito previsíveis. Com a evidente ajuda de Woody Allen para a condução do roteiro e personagens, seja como inspiração ou consultoria, a comédia de Turturro cumpre o que sua premissa promete e encanta sem fazer muito esforço para isso.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Graduado em Publicidade e Propaganda, coordena a Unidade de Cinema e Vídeo de Caxias do Sul, programa a Sala de Cinema Ulysses Geremia e integra a Comissão de Cinema e Vídeo do Financiarte.
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