Crítica

Edmundo Cardoso foi um importante personagem de Santa Maria, sobretudo no que diz respeito à vida cultural dessa cidade do interior do Rio Grande do Sul. Apaixonado por cinema, diretor de teatro, escritor, radialista, entre outras atividades, deixou um legado de obstinação e paixão pela arte. Edmundo é uma celebração a ele, aos feitos desse funcionário público tornado emblema pelas próprias atitudes desbravadoras. O diretor Luiz Alberto Cassol presta-lhe um tributo, registrando o depoimento de amigos, familiares, admiradores, todos influenciados por sua tenacidade. Bem relacionado, inclusive com grandes nomes da cultura brasileira, tais como Procópio Ferreira e Iberê Camargo, Edmundo ajudou a colocar Santa Maria no mapa cultural não apenas do estado, mas do país.

Edmundo é simples, às vezes simplório. O documentário subaproveita o grupo seleto que viveu e/ou trabalhou com Edmundo. Não há subserviência à cronologia dos fatos, mas uma tentativa de ordenar tudo em blocos temáticos, literalmente em atos. Contudo, a fragilidade dessa estrutura diminui bastante a força das exposições. Uma ligeira confusão perpassa os depoimentos, muitas vezes reiterativos, sem que nada brote de importante da repetição. Natural que a saudade e a admiração estejam presentes em grande profusão nas falas, que sejam predominantes nas rememorações da figura e de seus feitos. Cassol, porém, não evita a armadilha de bater insistentemente nas mesmas teclas, evidenciando nos testemunhos não o que eles têm de singular, mas, ao contrário, suas similaridades.

Incomoda, também, o tom excessivamente laudatório. Ao invés de utilizar os elogios pontualmente, como maneira de sublinhar realmente a importância de Edmundo para a comunidade, Cassol os empilha, fazendo com que eles enfraqueçam por esgotamento. Outro efeito colateral disso, além da monotonia, é a negação de qualquer aresta que supostamente possa arranhar a santificação em praça pública do biografado. As complexidades que poderiam vir à tona, sem prejuízo à homenagem, são soterradas, nunca evocadas, a não ser pela insignificante cena em que um amigo se refere a Edmundo como um diretor de teatro exigente, que até gritava com os atores para obter o resultado desejado. É pouco, muito pouco para amenizar uma mitificação desnecessária.

Passagens essenciais, como a participação de Edmundo no filme Os Abas Largas (1963), considerado um dos primeiros westerns brasileiros, são pouco exploradas. Assim, o que seria uma boa base à mostra de seu amor pelo cinema, surge na tela como mera curiosidade. Luiz Alberto Cassol perde a oportunidade de apresentar uma dimensão mais ampla do personagem pelo qual, obviamente, tem grande respeito. O roteiro confuso, o contraproducente retorno ao já dito, a imagem relegada puramente a acessório, sem qualquer função particular, exceção feita às fotografias e fragmentos de gravações antigas, fazem de Edmundo um filme burocrático e cansativo, a despeito de seus poucos 72 minutos. Vale somente por documentar a vida de alguém que merecia realmente um tributo cinematográfico.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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