Onde Assistir
Sinopse
Em Eddington, durante o mês de maio de 2020, no meio da pandemia da covid-19, um impasse entre o xerife e o prefeito de uma pequena cidade desencadeia o caos, colocando vizinho contra vizinho numa pequena cidade do Novo México, nos EUA. Comédia/Drama.
Crítica
No final da década passada, Ari Aster foi rapidamente alçado ao panteão dos novos gênios do cinema contemporâneo. É verdade que ele surgiu para o grande público com Hereditário (2018) – projeto que iniciou essa nova leva de filmes de horror que procuram a originalidade a qualquer custo – e consolidou-se com Midsommar: O Mal Não Espera a Noite (2019), celebrado como se tivesse reinventado os rituais pagãos no cinema. Ambos são bons títulos, embora a cautela ainda fosse necessária diante da velocidade com que Aster foi colocado em um pedestal. Com Beau Tem Medo (2023), essa aura de genialidade começou a vacilar: o excesso de simbolismos e a megalomania narrativa evidenciaram diretor à procura de eixo. Em Eddington, ele tenta recuperar o equilíbrio entre delírio e realidade, mas ainda parece tatear dentro do próprio labirinto criativo.

Aqui, a trama retorna a 2020, durante a pandemia, em pequena cidade do interior dos Estados Unidos que dá nome ao filme. É um microcosmo do país – e, de certa forma, do mundo – onde todas as tensões contemporâneas parecem coexistir. As pautas da esquerda, o conservadorismo da direita, as fake news, o reacionarismo e as disputas por direitos convivem lado a lado. Os polos desse embate são representados por Joe Cross (Joaquin Phoenix), xerife com uma família imersa em teorias conspiratórias que deixariam reptilianos com vergonha, e Ted Garcia (Pedro Pascal), prefeito carismático que adora holofotes. O conflito entre ambos explode quando Cross se recusa a usar máscara em meio ao avanço da pandemia – e a partir daí, tudo se transforma-se em uma alegoria sobre como o caos da informação desfigura o senso de comunidade.
Desde o início, Aster demonstra clareza ao estabelecer o que quer discutir: como os dilemas globais podem reverberar nos lugares mais improváveis. A internet, tratada aqui como força quase mitológica, é o verdadeiro antagonista – um dispositivo que transforma cidadãos comuns em influenciadores de um mundo pequeno demais para tantas certezas. O diretor aproveita esse cenário para refletir sobre como indivíduos aderem a causas e ideologias movidos não apenas por convicção, mas por carências emocionais e afetivas. Do marido que tenta reconquistar a esposa ao adolescente em busca do primeiro beijo; do político sedento por aprovação ao trabalhador que busca propósito, todos parecem presos a uma espiral de desinformação e solidão. No fim, ninguém mais sabe no que – ou em quem – acreditar.
O problema é que, dentro dessa premissa instigante, Aster perde o controle da escala. O longa começa de forma promissora, com poucos personagens, diálogos precisos e senso de confinamento que reflete bem o isolamento pandêmico. Mas, aos poucos, Eddington se dilui em ambição desmedida, tentando abraçar todas as pautas do mundo dentro de um mesmo roteiro. O que era íntimo e sufocante torna-se disperso e inchado, como se o diretor quisesse dar conta de tudo – e, nesse esforço, terminasse dizendo pouco. O olhar afiado do primeiro ato cede lugar a uma sucessão de ideias soltas, fragmentadas, que comprometem a coesão narrativa.

No terço final, Aster parece recorrer a referências explícitas para sustentar o enredo: um pouco de Paul Thomas Anderson, um tanto dos irmãos Joel e Ethan Coen, algo do faroeste pós-moderno e até do absurdo cômico. Nesse desfiladeiro, Eddington se apoia fortemente em Joaquin Phoenix, ator que domina o caos com maestria e transita entre o drama e a ironia com naturalidade. É como se Aster dissesse: “vamos lá, Joaquin, termine esse filme para mim, por favor”. O resultado é irregular e, no fim das contas, a aposta confirma que Ari Aster ainda é um diretor talentoso, embora prisioneiro do próprio desejo de grandeza.
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