Crítica

Quem for assistir a Crazy Horse pensando se tratar de um documentário sobre a banda de apoio de Neil Young terá uma grande surpresa. O filme francês assinado pelo septuagenário cineasta americano Frederick Wiseman mostra os bastidores e diversos números artísticos da popular casa parisiense Crazy Horse, conhecida por ser o mais requintado local para apresentações de dança. O detalhe é que as (belíssimas) dançarinas estão sempre nuas. Outro detalhe: os números não são direcionados apenas para homens. Mulheres e casais também são atraídos pelas atrações do local, dado o cuidado das apresentações. Cuidado esse que não é mantido por Wiseman, que, vez em quando, se perde ao querer focar mais o lado “carnudo” das dançarinas do que a coreografia em questão. Essa é apenas uma de algumas derrapadas deste documentário extenso chamado Crazy Horse.

Somos transportados logo de cara para o palco e acompanhamos alguns interessantes e belos números de dança, sempre com uma iluminação muito bem resolvida e lindas mulheres, todas sempre em plena forma. Dependendo do número, o lado sensual é diminuído pelas poses e letras, algumas engraçadas, outras apenas de gosto duvidoso. Em um de seus melhores momentos, partes do corpo das bailarinas do Crazy Horse se multiplicam em um jogo de espelhos, embalados por uma versão lenta e quase irreconhecível de um sucesso de Britney Spears, “Toxic”. Depois de várias apresentações, finalmente os bastidores do local se abrem para o espectador, quando vemos o trabalho que é empreendido para que aquelas belas moças façam seu trabalho. Tudo é muito bem pensado e discutido pela equipe responsável.

O problema, no documentário, é a dosagem do que é mostrado. Em vez de deixar o trabalho mais redondo, trazendo alguns números de dança costurados com as discussões de bastidores, Wiseman coloca grandes trechos de apresentações seguidas de intermináveis discussões sobre a feitura do espetáculo. Isso deixa o longa-metragem extremamente desequilibrado e, por vezes, enfadonho de se acompanhar.

Outro ponto de gosto duvidoso é a predileção de Wiseman em seus enquadramentos aproximados. Sem puritanismos. Este recurso de enquadrar seios e bundas em primeiro plano não seria uma falha caso ele estivesse fazendo um documentário sobre uma casa de striptease qualquer. O que não é o caso aqui. Em diversos momentos, inclusive em uma das músicas da Crazy Horse, é citado que a casa tem um lado erótico (óbvio), mas que o objetivo é não ser apelativo. “Somos as garotas do Crazy, dançamos de um jeito sensual, você pode pensar que somos taradas, mas não se engane”, diz uma das canções. No entanto, o cineasta parece não entender esse diferencial. Por outro lado, o fato de Wiseman deixar a câmera muito perto das garotas dá a chance do espectador perceber detalhes que o público em geral, que vai ao Crazy Horse, não teria como observar. É o ônus e bônus da questão.

A beleza das coreografias (e das moças) que são apresentadas no Crazy Horse, infelizmente, não salva o documentário dos pecadilhos que comete desde seu início. Não fosse a longa duração e o fato do cineasta responsável parecer não entender o que está capturando com sua câmera, Crazy Horse poderia ser um documentário altamente recomendável. Do jeito que veio à luz, vale pela curiosidade e para entender o mundo daquela dança intimamente ligada à sensualidade e à arte.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
avatar

Últimos artigos deRodrigo de Oliveira (Ver Tudo)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *