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Sinopse
Chuzalongo: No século XIX, um padre acolhe uma criança em circunstâncias misteriosas e enfrenta um cruel dilema moral. Dividido entre os deveres da fé e os limites da compaixão, ele precisa tomar uma decisão que pode mudar tudo. Drama.
Crítica
Algumas histórias parecem feitas para atravessar o tempo, mesmo que passem anos escondidas nas dobras das montanhas. Do Equador, surge uma dessas lendas, agora levada ao cinema por Diego Ortuño: Chuzalongo, título que dá nome ao ser amaldiçoado nascido da violência colonial. Filho de indígena violentada por um europeu, ele cresce condenado a beber o sangue de mulheres. A premissa chama atenção de imediato, mas Ortuño, em vez de mergulhar fundo no universo sombrio que propõe, prefere contornar seus abismos com cautela.
No centro da trama está a tensão entre colonizadores e nativos, ainda marcada por desigualdades e tentativas de revolta. Enquanto os pobres organizam resistência tímida, os poderosos seguem sufocando a população com trabalho exaustivo e escassez. É nesse contexto que entra o padre Nicanor, interpretado com firmeza por Bruno Odar, um franciscano que coloca a vida acima dos dogmas. Ao encontrar o pequeno parasita, vê nele mais do que criatura sobrenatural: enxerga menino que talvez ainda carregue alguma possibilidade de redenção.
Essa relação entre o religioso e o ser lendário move a história com delicadeza. Nicanor, mesmo sem entender bem a origem da criança, insiste em acolhê-la. Tenta preservar algum resquício de fé num ambiente em decomposição. Mas o garoto, vivido por Gael Ortuño, não sustenta o peso simbólico que lhe é atribuído. Falta presença, perigo e, principalmente, encantamento. O personagem se esvazia ao longo da trama e, no fim, é a lenda – não sua representação – que nos mantém intrigados.
Apesar do cuidado visual, com paisagens andinas que emprestam imponência ao cenário, a direção não consegue compensar a falta de intensidade dramática. Mesmo os momentos que deveriam causar inquietação acabam diluídos por escolhas brandas, que evitam confrontar de fato o espectador. Por outro lado, o trabalho de som opta por trilhas apelativas, quando poderia potencializar aspectos mais instintivos da fábula de forma mais silenciosa.
A produção busca ir além da superfície. Mistura crítica social, religião, política e elementos do folclore andino. No entanto, apesar do projeto ser promissor no papel, a execução escorrega: o medo não se instala, os conflitos se diluem, e o componente fantástico nunca chega a nos envolver. O que começa como uma proposta potente, termina como um exercício tímido de imaginação. Chuzalongo tinha dentes, faltou só decidir morder.
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