Cartas de Iwo Jima
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Sinopse
Junho de 1944. Tadamichi Kuribayashi (Ken Watanabe), o tenente-general do exército imperial japonês, chega na ilha de Iwo Jima. Muito respeitado por ser um hábil estrategista, Kuribayashi estudara nos Estados Unidos, onde fizera grandes amigos e conhecia o exército ocidental e sua capacidade tecnológica. Por isso o Japão colocou em suas mãos o destino de Iwo Jima, considerada a última linha defesa do país. Ao contrário dos outros comandantes Kuribayashi moderniza o modo de agir, alterando a estratégia que era usada. Ele supervisiona a construção de uma fortaleza subterrânea, feita de túneis que davam para as suas tropas a estratégia ideal contra as forças americanas, que começam a desembarcar na ilha em 19 de fevereiro de 1945. Os japoneses sabiam que as chances de sair dali vivos eram mínimas. Enquanto isto acontece Kuribayashi e outros escrevem várias cartas, que dariam vozes e rostos para aqueles que ali estavam e o relato dos meses que antecederam a batalha e o combate propriamente dito, sobre a ótica dos japoneses.
Crítica
Clint Eastwood já merecia aplausos apenas pela idéia. Ao contar a história da batalha de Iwo Jima sob o ponto de vista norte-americano, surgiu a vontade de conhecer o outro lado da história. Com isso em mente, o cineasta resolveu fazer um segundo filme, com orçamento menor, mostrando o ponto de vista japonês no sangrento combate. Não bastasse o conceito ser fantástico, a execução é formidável, e Cartas de Iwo Jima pode ser apontado como um dos melhores trabalhos da carreira de Eastwood atrás das câmeras.
Para conseguir dar voz aos soldados e comandantes japoneses, Eastwood convidou seu estimado colega Paul Haggis para escrever o script, junto da roteirista nipônica Iris Yamashita. O texto é baseado em cartas reais, escritas pelo general Tadamichi Kuribayashi, que estão no livro Picture Letters from Commander in Chief, editado por Tsuyoko Yoshido.
Kuribayashi é vivido por Ken Watanabe (de Batman Begins, 2005), um general estrategista que não é bem visto pelos seus subalternos. O exército japonês é conhecido pela rigidez de seus costumes. A morte honrosa é muito mais importante que uma fuga para salvar a pele. Kuribayashi, no entanto, prefere seus soldados vivos e lutando a mortos sem um propósito direto para a vitória. Ao chegar em Iwo Jima, logo observamos o general mudando algumas diretrizes, como eliminando o espaço dos soldados japoneses na orla da praia. Em vez disso, cavernas e túneis foram montados para pegar o exército norte-americano de surpresa. Uma tática que, de começo, parecia inusitada, garantiu uma batalha que durou mais de um mês – enquanto que qualquer analista diria que, com o poderio dos Estados Unidos, em menos de uma semana os pelotões norte-americanos teriam tomado conta da ilha.
Não acompanhamos apenas o comando de Kuribayashi no filme. Outros personagens são apresentados e têm uma trajetória bastante interessante. É o caso de Saigo (Kazunari Ninomiya), um jovem padeiro que deixou sua mulher grávida para lutar pelo país. Enquanto muitos soldados exaltam o fato de morrerem pela sua pátria, Saigo pretende ficar vivo para conhecer seu filho. Sua caminhada dentro da trama é a mais rica, pois podemos perceber a mudança do comportamento do soldado. Primeiramente, totalmente avesso ao combate, Saigo encontra em Kuribayashi um verdadeiro modelo. Portanto, não se espante se até o final do longa-metragem o jovem padeiro tentar dar sua vida para proteger seu general.
Diferente de A Conquista da Honra (2006), a narrativa de Cartas de Iwo Jima é linear. Temos alguns pequenos flashbacks aqui e acolá, mas nunca deixamos a ilha japonesa por muito tempo. Estas viagens ao passado servem para aprofundar algumas características dos personagens, mostrando como Kuribayashi não sentia ódio pelos norte-americanos, ou como Saigo fora convocado para lutar na guerra. Em uma ótima cena em flashback, observamos como o soldado Shimisu (Ryo Kase) recusou-se a matar um cão e fora expulso de seu batalhão.
É interessante notar também como a fotografia de Cartas de Iwo Jima difere de outros trabalhos de Clint Eastwood. O diretor de fotografia Tom Stern trabalhou no citado A Conquista da Honra e neste seu filme-irmão, presenteando o espectador com dois belíssimos – e diversos – retratos da ilha. Enquanto que a fotografia do primeiro longa-metragem tinha cores pálidas e uma paleta de cores puxando para o azul, Cartas de Iwo Jima é dotado de uma imagem mais esmaecida, puxando para o sépia. Além de dar um tom envelhecido para o filme, esta escolha dá um feeling épico para o longa-metragem de Eastwood.
Indicado a 4 Oscar em 2007, incluindo Melhor Filme e Direção – venceu Melhor Edição de Som – Cartas de Iwo Jima é um trabalho corajoso do cineasta. Em primeiro lugar, traz a visão do “inimigo” em um combate que tirou milhares de vidas de jovens estadunidenses e japoneses. Em segundo, acertadamente, Eastwood não é maniqueísta. Cada um daqueles soldados, como humanos que são, tem seu lado bom e mau. O cineasta mostra tanto os momentos genuinamente perturbadores – como o pelotão que pratica um harakiri com granadas – quanto os momentos sublimes, quando um soldado japonês tenta manter um contato amigável com seu inimigo. Clint Eastwood inclusive pinta um retrato horrível para uma parte do exército norte-americano, que liquidou friamente prisioneiros de guerra.
Se em A Conquista da Honra era uma foto que fazia com que a opinião pública carregasse a guerra, em Cartas de Iwo Jima não temos a informação de como os japoneses encaravam o combate. Sabemos, no entanto, por uma pequena cena em flashback, que alguns sentiam orgulho por terem parentes lutando pelo seu país. Não é difícil acreditar que este sentimento fosse majoritário no Japão, dado a honrosa predisposição dos seus habitantes em defender seu território.
Cartas de Iwo Jima faz um retrato belo do combate, mesmo nunca dispensando o seu lado mais horrível. Um trabalho primoroso de Clint Eatwood. Mais um, de tantos.
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