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Crítica

Realizado pela documentarista Kirsten Johnson, Cameraperson reúne materiais não utilizados nos trabalhos dos quais a diretora fez parte como cinegrafista e, ainda, alguns registros pessoais de sua família. Inicialmente indicando ser uma colagem solta de materiais com nuances etnográficas, a produção, porém, avança com a realizadora costurando cada um dos pedaços distintos, configurando, assim, um novo e maior significado.

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O documentário inicia com uma estrada, logo, se subentende que embarcamos em um “road doc”, ambientado em diversos países, que acompanha a trajetória da realizadora. Essas viagens acontecem em épocas diferentes. O suporte utilizado, juntamente com a abordagem de cada fragmento, torna o filme de Johnson uma novidade constante, instigando o espectador sempre que há uma inserção diferente. Além disso, assistimos a um exemplo perfeito do poder que a edição possui de construir subtextos, valendo-se para isso da justaposição de planos e imagens. Criar verdades, situações e debates. Ressignificar. Além disso, perpassam o filme diversos conceitos relativos ao papel de um documentarista, tais como as questões éticas, o distanciamento ou a extrema aproximação do objeto de análise.

Se valendo de um registro misto, que abrange questões muitíssimo pessoais e colaborações com outros realizadores, a diretora traz uma reflexão interessante sobre o papel do cinegrafista dentro do documentário, mais precisamente a respeito da influência do seu olhar. Na seleção de cenas para Cameraperson notamos temas e debates constantes envolvendo morte, guerras, massacres e o descaso social. Do lado mais positivista, temos a força da memória afetiva, a importante presença da família, bem como ideias de nascimento e renascimento. Viajamos por estados norte-americanos e, principalmente, pela Bósnia, onde Johnson retoma a guerra que assolou o país, causando danos às mulheres assediadas e violentadas sexualmente por soldados. Também destaca a limpeza étnica realizada em aldeias, condutas que massacraram diversos grupos, além de destruir locais religiosos emblemáticos.

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Nessa colcha de retalhos de histórias diversas, por vezes tristes e de pessoas marginalizadas, Johnson cria uma riquíssima poesia repleta de dignidade, em meio ao estudo do comportamento humano, das nossas capacidades de autodestruição, adaptação e, principalmente, de sujeição ao egocentrismo. Em uma das cenas que abrem o documentário, um lutador de boxe se prepara para entrar no ringue. Johnson logo corta a cena, criando uma espécie de moldura temporal, retornando àquele momento apenas próximo do final, ou seja, após destacar histórias de refugiados, vítimas de atentados e excluídos. Ela retoma o resultado da luta. O boxeador perde e de sua revolta decorrem ações irracionais e animalescas. Um show de egocentrismo. Johnson reflete a respeito da pequenez do esportista. Num mundo em que pessoas perdem a vida por causa de tão pouco, se abalar de tal forma ao perder uma luta de boxe parece uma tremenda futilidade.

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é graduado em Cinema e Animação pela Universidade Federal de Pelotas (RS) e mestrando em Estudos de Arte pela Universidade do Porto, em Portugal.
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