Crítica

Há muito que absorver de Bling Ring: A Gangue de Hollywood, novo filme escrito e dirigido por Sofia Coppola. O enredo, baseado em artigo publicado na revista Vanity Fair, fala a respeito de um grupo de adolescentes que invadiam casas de celebridades para roubar joias, roupas, bolsas, ou seja, objetos-fetiche do nosso tempo. Tais jovens, cuja ambição tem menos a ver com dinheiro e mais com aproximar-se de seus ícones – estes, por sua vez, idolatrados apenas por parecer isto ou aquilo, por ditar esta ou aquela regra de moda e comportamento –, são o retrato até certo ponto deprimente de uma geração liderada ideologicamente por valores bem supérfluos, para não dizer totalmente servis à futilidade.

A estrutura do roteiro lembra a de A Rede Social, de David Fincher, não por acaso outro filme a “radiografar” a juventude atual. O desenrolar da trama é, da mesma forma, entrecortado por investigação, depoimentos “arrependidos” e os desdobramentos do caso, artifício que visa potencializar a hipocrisia e o cinismo por trás das atitudes imaturas e exibicionistas da galera. Nesse paralelo entre presente e passado, o único a salvar-se um pouco é Marc (Israel Broussard) que, ao contrário de Nicki (Emma Watson), Rebecca (Katie Chang), Sam (Taissa Farmiga) e Chloe (Claire Julian), realmente parece envergonhado, não apenas por ter roubado, mas também por conta do prestigio alcançado após o delito. Por sua vez, Laurie (Leslie Mann), ignorante quanto aos feitos das filhas e ávida por doutriná-las através das famigeradas “Leis de Atração”, representa o elemento paterno. Essa figura esquemática e quase cartunesca acaba insuficiente (muito por ser calcada no exagero) para estabelecer observação maior acerca da responsabilidade dos pais na formação da prole frívola.

Sofia Coppola tem no DNA a ciência da força da imagem, por isso não se coloca demasiada refém do dito, ainda que aqui e acolá surjam diálogos explicativos além do necessário. Toda vez que a patota de filhinhos-de-papai se refestela nas coleções exclusivas de artefatos caros, explicitam-se observações advindas, sobretudo, da encenação e da maneira como ela é capturada/articulada. Por que astros e estrelas têm tanto? Por que a adrenalina de roubar e fazer pose depois nas redes sociais é tão atraente? Esses jovens não seriam resultado de uma cadeia comercial que celebra a cultura da posse como imperativo social? Contudo, Sofia peca, também, na reiteração de determinados procedimentos, por exemplo, o caminho anterior aos arrombamentos (procura do endereço da vítima e do destino dela na internet + entrada sem dificuldade na casa escolhida).

Bling Ring: A Gangue de Hollywood é filme bastante oportuno, justo por lançar luz sobre as veleidades da parcela adolescente consumista e esvaziada da nossa tão enferma contemporaneidade. É repleto das sutilezas típicas do cinema de Sofia, entretanto flerta perigosamente com facilidades, sejam elas vigentes na construção de certos personagens ou na necessidade de que esses mesmos tipos verbalizem algo já evidenciado. Ainda assim, vale nossa atenção, cinematográfica e antropologicamente falando.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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