Crítica

Assim como Woody Allen, Larry David não tem uma gama extensa de tipos na hora de interpretar seus personagens. Eles são basicamente os mesmos – seja na série Curb your Enthusiasm, no filme Tudo Pode dar Certo (2009) ou neste novo, Apagar Histórico. E quer saber? Não importa. Larry David é engraçadíssimo exatamente por ser Larry David e para quem gosta do senso de humor do comediante, este novo trabalho realizado especialmente para a tevê será extremamente divertido.

O roteiro do longa é assinado pelo próprio David, ao lado de Alec Berg, David Mandel e Jeff Schaffer, com direção de Greg Motolla, conhecido pelos ótimos Superbad: É Hoje (2007) e Férias Frustradas de Verão (2009). A trama começa em 2003. Nathan Flomm (David) é um publicitário cheio de opinião (e de cabelo) que, às vésperas do lançamento de um novo carro da companhia onde trabalha e é sócio, briga com seu patrão, Will Haney (Jon Hamm), e vende suas ações de volta a ele. O problema de Flomm está no nome deste carro, Howard, que ele simplesmente não acredita que poderá fazer sucesso. Mal sabia ele que o veículo viraria um fenômeno nacional, com Haney enriquecendo e sendo considerado um empresário do mais alto gabarito, enquanto Nathan seria visto pela imprensa como um idiota que esnobou uma fortuna. Sem conseguir engolir isso, Nathan some, perde as madeixas e muda de identidade, respondendo pelo nome de Rolly. O encontramos dez anos depois residindo em uma ilha sossegada, com muitos amigos e sem grandes preocupações. Isso até seu antigo sócio, Will, se mudar para a mesma ilha junto de sua mulher, Rhonda (Kate Hudson). Com seu ódio desperto, Rolly irá bolar um plano para se vingar – e que envolverá o explosivo Joe Stumpo (Michael Keaton).

Não é segredo que a televisão norte-americana tem dado trabalho para Hollywood, com produções cada vez mais requintadas e interessantes, não devendo nada para os filmes que vemos na tela grande. Em Apagar Histórico, temos um bom exemplo de um longa-metragem para a tevê que conta com tantos talentos envolvidos que, em um primeiro momento, seria difícil dizer se foi pensado para a telinha ou para o cinema. Em primeiro lugar, temos um diretor que fez comédias cinematográficas reconhecidas – as supracitadas Superbad e Férias Frustradas de Verão – um elenco cheio de rostos familiares – Michael Keaton, Danny McBride, Phillip Baker Hall, Kate Hudson, Eva Mendes, Amy Ryan, Liev Schreiber – e uma caprichada direção de arte, que consegue fazer rir com os sempre presentes Howards passeando na tela. É bem verdade que alguns membros do elenco fizeram seu nome primeiramente na televisão: Larry David (co-criador de Seinfeld e protagonista de Curb your Enthusiasm), Jon Hamm (Mad Men) e Bill Hader (Saturday Night Live). Mas cada vez mais estamos os vendo atuando em produções para cinema.

Larry David está bastante afiado em Apagar Histórico, com ótimas piadas e gags hilariantes. Seus problemas com as tomadas nada ergonômicas e a fixação com um quadro de carrinho de compras são alguns exemplos que farão os espectadores relembrarem temáticas de seus seriados. Também não deixa de ser engraçada a subtrama envolvendo Rhonda, com quem Rolly começa a flertar, pensando estar sendo correspondido. Os mal entendidos que observamos na trama fazem com que a história avance e, ainda que algumas vezes tenhamos que acreditar em inverossimilhanças, isso acaba não atrapalhando o resultado final. Desculpamos alguns deslizes pela diversão.

David é um óbvio destaque do elenco, improvisando bastante em cima de seu próprio roteiro, que ainda tem espaço para boas participações de nomes como Michael Keaton (que aqui repete alguns trejeitos de Os Fantasmas se Divertem, 1988, e Eu, Minha Mulher e Minhas Cópias, 1996, estando bastante engraçado) e Liev Schreiber (que faz um checheno sem muita paciência). Destaque negativo fica para Eva Mendes, que utiliza um sotaque forçado que incomoda mais do que faz graça.

 Apagar Histórico é uma comédia que consegue fazer rir por meio das maluquices de seu protagonista, o sabotador de sua própria história. Ainda que torçamos por Rolly, entendemos que toda sua tragédia pessoal é resultado de suas próprias escolhas, o que acaba ficando engraçado pela performance de Larry David. Rimos de suas desgraças porque ele nos dá espaço para tanto. Perdedor nato, Nathan/Rolly é o que de melhor esta boa produção da HBO tem a nos oferecer. E não é pouca coisa.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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