Onde Assistir
Sinopse
Em Amada, duas vidas se encostam sem jamais se encontrar, conectadas por fios invisíveis e escolhas que podem mudar destinos. Nunzia é uma jovem estudante que enfrenta sozinha uma gravidez indesejada e precisa decidir entre manter ou renunciar à criança. Em outro cenário, Maddalena e Luca atravessam o vazio de uma vida ainda sem filhos, até que surge uma possibilidade delicada e cheia de expectativa. Drama.
Crítica
Uma história de e sobre mulheres, mas não apenas para elas. Afinal, o apelo sobre o que se vê em Amada é universal. Tanto é que são três os personagens principais: duas mulheres e um homem. São diferentes pontos de vista sobre um mesmo episódio: a maternidade. Ou a continuidade do ser humano. A necessidade ou não que alguns têm em gerar herdeiros, enquanto outros simplesmente não se veem prontos para tanto. Ou preparados, ou mesmo desejosos de tal realidade. Alguns cedem pelo querer de seus companheiros, enquanto há os que preferem apenas postergar tal condição. Para uns uma bênção, para outros algo que surge pelo caminho como desafio a ser superado. Se por um lado se mostra de fato interessante analisar as diferentes reações que surgem diante de um mesmo questionamento, ou melhor ainda, frente a demonstrações opostas de uma possibilidade única, há também que se levar em conta o tecido dramático no qual tais perspectivas se desdobram. Por serem contrárias, são igualmente complementares. Antecipar que em algum ponto de seus caminhos acabarão por se cruzar se mostra tanto fácil de ser imaginado, como também uma armadilha que, por vezes, se confirma passível de ser evitada. Cair ou não na facilidade proposta pela própria realizadora é menos uma obviedade e mais um desenho a ser analisado enquanto percurso, e não por sua evidente finalidade.
Elisa Amoruso é a mesma do hollywoodiano A Vida é Agora (2021) e recentemente entregou para a Netflix alguns episódios da série policial Dept. Q (2025). Deixando de lado fórmulas românticas e esquemas policiais, ela retornou ao seu país natal para comandar esse triste, porém profundo, relato sobre duas mulheres em diferentes pontos de suas vidas. Uma delas é a que se vê preocupada com o andar do calendário e, por questões sociais, familiares e até mesmo pessoais, começa a sofrer da aflição por não ter filhos. O marido se declara apaixonado, e juntos tentaram mais de uma vez seguir com uma gravidez. O seu corpo, no entanto, sistematicamente rejeita tais mudanças, provocando abortos espontâneos um atrás do outro. Agora, está num ponto no qual não tem mais como arriscar. É preciso alinhar expectativas e encontrar novas maneiras de sanar essa necessidade. Uma adoção é cogitada, o companheiro se revela entusiasta da ideia, e as coisas a seu redor começam a se movimentar nesse sentido. Mas, voltando uma ou duas casas nesse processo, uma dúvida segue martelando em sua mente: a vontade de fato existe? Ou seria algo imposto pelo entorno? Antes de olhar ao redor, mais difícil é direcionar essa atenção para si mesma e refletir sobre suas escolhas, possibilidades e condições.

Ilaria Bernardini é autora do romance e do roteiro que ficou encarregado de adaptar para tela grande a história por ela criada. Distanciamento da obra original, portanto, não existe. Mas nem sempre essa idealização se faz precisa. Pois quem conhece melhor seu objeto de pesquisa do que aquela que nela esteve submersa desde o começo? Para tanto, percebe-se o quão importante seria propor o outro lado dessa jornada. E nesse percurso se encontra Nunzia (Tecla Insolia, premiada em Veneza por Familia, 2024), uma universitária que acaba engravidando após uma transa de ocasião. Ela sempre tomou cuidado, era dona do seu nariz, não queria ficar ligada a ninguém. Mas o impensável acabou acontecendo. E, sozinha, terá que decidir como seguir adiante. Ainda que rejeite qualquer tipo de ajuda, ou mesmo compartilhar tal responsabilidade, se revela imersa em um contexto de dúvidas e indecisões. Nada diz ao rapaz que dela tenta se aproximar, esconde o que lhe passa da mãe que está distante e mesmo da senhora que lhe aluga um quarto próximo da faculdade. O peso que está sobre suas costas é o mesmo de tantas garotas como ela ao redor do mundo, carentes de apoio e inseguras em relação ao futuro que pensavam estar apenas começando a construir.
Amoruso e Bernardini possuem em mãos um intento, e dele não conseguem se desligar. Há na Itália um recurso, disponível em grande parte do país, no qual mães solteiras podem doar seus recém-nascidos de forma anônima. É sobre isso, portanto, que as realizadoras querem discorrer. Assim, fica óbvio que o filho não desejado de uma acabará nos braços do casal que tanto anseia por tal designação. Não se deve avaliar um filme pelo que se gostaria que ele fosse, mas sim pelo que de fato é. É sobre esse aspecto que Amada merece ser visto, confirmando o sentimento de que, aqui, vale mais a trajetória dessas mulheres do que o fim que acabam dando para suas angústias, visto que esse se mostra por demais previsível. Mas é quase impossível não pensar em soluções diversas. Ainda mais quando o próprio texto apresenta tais desvios. Em certo momento, Nunzia cogita um amanhã tendo a filha consigo, e por mais que soe como uma fantasia infantil, visto sua falta de recursos, a atuação tão permanente de Insolia impede que qualquer um na audiência se coloque contra esse desejo. Da mesma forma, Maddalena (Miriam Leone, de Jogada de Amor, 2022) e Luca (Stefano Accorsi) discutem qual a base da relação que os une: o que sentem um pelo outro, ou imposições externas que talvez nem saibam como delas se desvencilhar? Tais portas, se fechadas, deixariam o conjunto menor. Vislumbradas, porém, permitem indagar quão diferente poderia ser o resultado se tivessem sido percorridas. Eis, enfim, o mérito impensado: o discurso está no olho – e na análise – de quem vê, pois será esse que decidirá, ao menos para si, o que teria sido melhor para esses personagens (ou para qualquer um em igual situação).
Filme visto durante o 20º Festival de Cinema Italiano no Brasil, em novembro de 2025
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