Crítica

Os ingredientes parecem ser apetitosos, ao menos diante o olhar daqueles afeitos a algo que fuja do lugar comum. Afinal, o que temos aqui é um longa espanhol protagonizado por três anões que se comunicam por telepatia e tem como missão adentrar em uma usina elétrica abandonada na Sibéria e, de lá, retirar uma obra de arte valiosa cuja autenticidade o próprio artista deseja reaver. E isso é apenas uma sinopse breve, pois deixa-se de lado muito do excêntrico e, principalmente, do absurdo que A Distância carrega em sua trama. Com tintas fortes pendentes para o inacreditável, o filme de Sergio Caballero exagera em tantos níveis de leitura e mira tantas direções simultaneamente que o único resultado que consegue provocar é a inércia estimulada pela apatia.

Um homem cuja identidade desconhecemos esconde-se sob uma segunda pele, a única a qual temos acesso. Ele é o responsável pelo misteriosa objeto que se encontra dentro da fábrica desativada e do qual nada sabemos. O lugar é vigiado por um ser de poder desconhecido, e superar seu controle é a missão dos anões, eles próprios donos de habilidades especiais: um é especialista em telecinese, o segundo é dono de uma audição privilegiada e o terceiro é capaz de obter respostas às suas mais difíceis indagações fazendo uso de um equipamento que conecta seu pênis ao nariz (!). E se isso não foi suficientemente estranho para a opinião da audiência, basta esperar o pedido de ajuda que emitem a uma striper de Las Vegas que, através dos seios, consegue ajudá-los, ainda que esteja literalmente do outro lado do planeta.

Qualquer tipo de resumo do argumento de A Distância, ao se concentrar nos seus elementos mais atrativos e inesperados, deverá despertar a atenção daqueles habituados a se aventurarem por narrativas pouco convencionais. No entanto, basta a história se por em movimento para que fique evidente o quanto a repetição de tais artifícios acaba tendo uma força mais contrária do que a favor do longa. Tudo é levado tão ao extremo – e, numa contrapartida, num ritmo assumidamente oposto, ou seja, lento e pausado – que fica difícil seguir surpreso após o terceiro ou quarto confronto de expectativas. O caso, como se percebe, é o típico do muito em demasia que acaba resultando em menos.

Há ainda o que se passa de forma paralela – como o milionário responsável pela investigação e o próprio artista em desgraça – narrativas desprovidas de interesse frente ao trio de anões, estes, sim, respondendo pelas passagens mais curiosas do filme. A Distância ganharia se fosse centrado exclusivamente neles, deixando os demais no espaço que lhes compete: a obscuridade. Como essa intenção, ainda que esboçada, não é seguida por completo, o que se consegue é uma peça que resiste pelo inusitado, mas deixa de conquistar por não ter um foco preciso e nem o que de fato dizer após combinar todas as suas peças, que separadamente até parecem atraentes, mas juntas simplesmente perdem sentido. Uma brincadeira que perde a graça muito antes do final.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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