23 mai

Debora Lamm na tela e nos palcos

A carioca Debora Lamm nasceu no dia 29 de janeiro de 1978, e pouco mais de 20 anos depois estreava na telinha da Rede Globo, na novela Um Anjo Caiu do Céu, protagonizada por Caio Blat. E apesar de muitos outros trabalhos neste veículo – já contabiliza 5 novelas e 10 seriados – ela afirma ter se realizado mesmo nos palcos e nos cinemas. É por causa do primeiro que está atualmente circulando pelo país, com a peça As Conchambranças de Quaderna, de Ariano Suassuna, o mesmo autor de O Auto da Compadecida. A próxima parada está agendada para Porto Alegre, nos dias 26 e 27 de maio, no Theatro São Pedro. Mas muitos já devem tê-la visto também na tela grande em um dos cinco filmes que participou, entre eles os campeões de bilheteria Muita Calma Nessa Hora (mais de um milhão de espectadores) e Cilada.com (mais de dois milhões de espectadores). Foi sobre estas experiências que conversamos, nesse bate papo inédito e exclusivo.

 

Vamos começar falando sobre As Conchambranças de Quaderna. Qual é a história dos teus personagens na peça?

Pois então, é uma peça “dois em um”, exatamente. São duas histórias vividas pelo personagem Quaderna, que é uma criação do Ariano Suassuna. O Quaderna apareceu pela primeira vez no texto de A Pedra do Reino, mas lá ele era bem mais secundário. Em 1987, quando foi lançado As Conchambranças de Quaderna, o mesmo personagem retorna, mas já como protagonista. E esse texto foi recomendado pelo próprio Suassuna à diretora Inez Viana, por dois motivos: nunca havia sido montado fora de Recife, e nunca por uma equipe profissional. Esta é a estreia da Inez como diretora teatral, e como ela é muito amiga do Suassuna, foi até ele pedir uma dica. Foi quando ele sugeriu essa peça. E trata-se de dois textos, duas aventuras do Quaderna. A primeira se chama “Casamento com Cigana no Meio”, e é sobre duas irmãs, sendo que uma está prometida em casamento a um boiadeiro. Mas quando este chega pro casório, muda de ideia e decide casar com a outra. Mas isso tudo é uma artimanha elaborada pelo Quaderna, que é apaixonado pela noiva e quer que ela fique livre do compromisso pra ficar com ele. Eu faço essa irmã, a abandonada que deseja o Quaderna. E na segunda, chamada “A Caseira e a Catarina ou O Processo do Diabo”, eu sou Catarina, uma prostituta que é tentada pelo próprio Diabo no sertão. Foi um baita desafio, a missão de ter que construir dois personagens foi muito estimulante. Uma oportunidade única.

Leonardo Brício e Debora Lamm em As Conchambranças de Quaderna

Quando estreou As Conchambranças de Quaderna?

A nossa montagem estreou em um festival que aconteceu em 2009 em Angra dos Reis, mas chegamos ao Rio de Janeiro somente em janeiro de 2010. Desde então já ganhamos muitos prêmios, sempre com um retorno ótimo do público. Até em Porto Alegre já estivemos, para um circuito SESC pelo interior do estado, porém sem o elenco completo, naquela ocasião viajaram conosco alguns dos substitutos. Essa é a grande diferença de agora, com o elenco original todo reunido. E sem falar que estaremos pela primeira vez no Theatro São Pedro, que é uma delícia e um desejo de todo ator brasileiro.

 

De todo o elenco da peça, você é que mais fez cinema. Como é se dividir entre estas duas expressões? Sente muita diferença uma da outra?

Nossa, total! Cinema é mais calmo, intimista, tranquilo. Teatro é porrada, é ali e agora, é o momento. Amo os dois, adoro tudo o que já fiz em cada um deles. Mas é completamente diferente. Os filmes que fiz possuem todos uma pegada mais cômica, mesmo os primeiros, como Seja o que Deus quiser (2002) e 1972 (2006), que tinham esse lance do urbano, do político, do social. Já uma peça como As Conchambranças de Quaderna até comenta sobre o que acontece hoje, mas sempre com um toque mais farsesco, debochado. A maquiagem é carregada, os diálogos são muito engraçados, as interpretações são mais exageradas. Mas em ambos, seja cinema ou teatro, o que importa é a tarefa de criar um personagem convincente, crível, que passe credibilidade para o público. O importante é acreditar.

Muita Calma Nessa Hora

Esse lance da comédia… você se considera uma comediante?

Sabe, isso começou com a temporada na televisão do programa Cilada, com o meu amigão e companheiro Bruno Mazzeo. A partir daí é que o público começou a me identificar mais fortemente como comediante. Mas sou, acima de tudo, uma atriz. O que importa é o papel. Em 1972 eu era uma militante, cara-pintada, revoltada, rebelde. Tinha humor, mas era consequência. Já no Muita Calma Nessa Hora (2010) era pura diversão, algo bem mais despretensioso. O que não quer dizer que seja menos importante, irrelevante. A comédia também pode ser muito sofisticada. Acho que é algo no nosso cenário atual, que tem pouca mulher fazendo comédia. Mas é muito bom, adoro trabalhar me divertindo. É um prazer.

 

Na sua cinebiografia constam, até o momento, 5 filmes. Tem algum mais especial, ou que tenha sido mais complicado fazer?

Tem dois filmes que amo de paixão. Primeiro tem o Seja o que Deus quiser, e justamente por isso: por ser o primeiro. Eu era muito nova na época, tinha somente 21 anos, e foi quando tive que deixar minha casa, ir para São Paulo. Foi a primeira vez que tive que desenvolver todo um personagem, por completo, e defendê-lo. E também tinha o fato de já, no começo, estar trabalhando com o Murilo Salles, com a Marília Pêra, que são uns monstros, são maravilhosos, uma baita experiência. E mais tarde veio o Muita Calma Nessa Hora, que é um filme que me deu muitas alegrias. Foi muito divertido fazê-lo, antes de mais nada por estar ao lado do Bruno, depois por termos todos ido para Búzios, durante mais de um mês… foi como férias! E algo tão despretensioso, tão na brincadeira, e quando vimos tomou outra proporção, o público adorou, ia direto ao cinema… Ninguém esperava aquele sucesso todo!

 

O Bruno Mazzeo é o teu grande parceiro?

Ele é um dos meus grandes parceiros. É que o programa Cilada me ofereceu uma popularidade inesperada. Foi muito legal ter dado tão certo. E depois ainda tivemos juntos o filme Cilada.com (2011), que foi outro sucesso absurdo. O filme veio para coroar a série. A repercussão foi muito grande, todo mundo ficou encantado!

Você tem dois grandes sucessos de público no currículo – Muita Calma Nessa Hora e Cilada.com. Vários projetos ambiciosos recentes, no entanto, naufragaram nas bilheterias. O que está faltando, na sua opinião, para o público brasileiro se encontrar no cinema?

Ah, falta tanta coisa… mas acima de tudo Educação. O brasileiro precisa ser educado. Há tanta desgraça, tanta coisa errada no nosso país, que o cidadão, quando sai de casa, quer se divertir. É por isso que essas comédias tem dado tão certo. Mas elas servem também para acostumar o público, para ensinar que se pode ouvir português na sala de cinema, que podemos ver e prestigiar as nossas histórias. Assistir a filmes mais sérios, como Heleno ou Xingu, é um outro passo, mas faz parte do mesmo processo. Não que comédia não tenha conteúdo, mas ele é mais diluído. Por isso que um é importante ao outro. É uma questão de instrução.

 

As Conchambranças de Quaderna está em cartaz em Porto Alegre, no Theatro São Pedro, nos dias 26 e 27 de maio de 2012.

Entrevista feita por telefone no dia 21 de maio de 2012

 

Robledo Milani

é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *